Economia

Professora analisa gestão em municípios paraibanos em tempos de crise


13/12/2018

Na imagem, a professora Wanderleia dos Santos

A professora Wanderleya dos Santos Farias, do departamento de economia da UFPB, analisa nesta quinta-feira (13), gestões de municípios paraibanos em meio a crise no Brasil.

Confira:

GESTÃO FISCAL NOS MUNICÍPIOS PARAIBANOS EM CONTEXTO DE CRISE

Wanderleya dos Santos Farias*

Desde 2014, a economia brasileira vem apresentando ritmo declinante nas taxas de variação anual do PIB e retração da arrecadação tributária nos três níveis de governo. Os impactos sobre a gestão das finanças públicas locais, de modo geral, têm sido adversos. A crise que assolou o país nos anos recentes, agravou as frágeis gestões fiscais das prefeituras. Como a maioria dos municípios brasileiros depende das transferências de recursos tributários da União e dos estados, a menor arrecadação federal representou perdas para essas esferas subnacionais.

A Microrregião de João Pessoa, uma importante espaço econômico da Paraíba, é formada pelos municípios de Cabedelo, João Pessoa, Santa Rita, Bayeux, Lucena e Conde. Segundo estimativas do IBGE CIDADES, essa área estadual concentrava, em 2017, em torno de 43,2% dos bens e serviços finais gerados no estado paraibano e detinha uma parte expressiva dos postos de trabalho formais existentes na economia estadual.

Ao se analisar o comportamento dos indicadores das contas públicas dos seis municípios que compreendem a aludida Microrregião, verifica-se que a participação das receitas tributárias próprias das prefeituras, como proporção da receita orçamentária total,  tem sido relativamente pequena no contexto recente de crise.

Conforme os indicadores do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro -SICONFI, a prefeitura de Lucena teve uma arrecadação de tributos municipais,  em 2016, no valor de  R$ 1,96 milhão, cifra que representou apenas 5,75% da receita orçamentária corrente do município. A prefeitura de Santa Rita arrecadou, no mesmo ano, R$ 13,6 milhões, esse valor representou 6,01% de sua receita corrente. Para cada R$ 1,00 de recursos transferidos do governo federal e estadual, a prefeitura de Santa Rita só conseguiu gerar de recursos tributários próprios  o equivalente a R$ 0,10(dez centavos) enquanto  a prefeitura de Lucena, R$ 0,09 (nove centavos).

Segundo o Índice de Gestão Fiscal do Sistema Firjan (IFGF), a prefeitura de João Pessoa deteve os melhores índices de gestão fiscal da Microrregião entre os anos de 2010 e 2016, mas sentiu os efeitos da crise, pois apresentava uma boa gestão em 2010, com um índice de 0,6954, e só alcançou o índice de 0,5787 em 2016, situando-se no intervalo considerado de gestão em dificuldade. Por outro lado, as prefeituras de Lucena, Santa Rita e Bayeux, que já exibiam, em 2010, índices reduzidos, apresentaram uma piora na gestão fiscal, com IFGFs abaixo de 0,4 e típicos de gestões críticas.

A fragilidade das finanças públicas dos municípios brasileiros é um aspecto que predomina há décadas no modelo federativo do país e que se agrava em momentos de desaceleração econômica. Alguns estudos demonstram que são grandes as limitações que a máquina fazendária dos governos locais enfrentam, por exemplo, para ampliar a arrecadação de Imposto sobre Serviços e do Imposto Predial Territorial Urbano. A receita desses tributos depende do desenvolvimento socioeconômico local, do grau de urbanização da cidade, entre outros determinantes.

Com receitas próprias frágeis, não há recursos suficientes na maior parte dessas prefeituras para a realização de investimentos em gestão urbana e provisão de importantes serviços públicos. Áreas essenciais para a construção de cidades mais sustentáveis como: coleta e tratamento de esgoto;  habitação; gestão ambiental; drenagem de águas pluviais,; ordenação do trânsito urbano;  cultura; entre outros,  apresentam percentuais ínfimos e revelam a precariedade da provisão desses serviços para os munícipes.

As cidades de Santa Rita, Bayeux, Lucena e Conde apresentaram, em 2016, elevada dependência de transferências intergovernamentais e, de modo geral, mais de 60% de suas receitas orçamentárias tinham vinculação estabelecida por dispositivo constitucional para as áreas de: gestão do sistema educacional e gerenciamento das atividades escolares; assistência médica e hospitalar. 

Ao se observarem as taxas médias de gastos municipais por função programática nos seis municípios da Microrregião de João Pessoa em 2016,  a partir dos dados primários encontrados nos Relatórios de Execução Fiscal desses municípios, se constata que 36,1% foram destinados para  a  área de educação, 20,5% para a  saúde e 10,6% para a secretaria de administração, ou seja, 67,2% das despesas orçamentárias dessas prefeituras, em média, se concentraram apenas nessas três áreas. Por sua vez, as políticas públicas nas áreas de gestão ambiental, saneamento e transporte só detiveram, em média, 1,5%; 1,9%; e 0,1% dos gastos orçamentários totais.

Para os seis municípios da Microrregião de João pessoa, o  nível de investimento per capita, que mensura o valor dos investimentos realizados pela prefeitura em relação à população local, gravitaram em torno de valores muito baixos em 2016. No mencionado ano, o município de Santa Rita só conseguiu investir o equivalente a R$ 36,47 por habitante enquanto as prefeituras de Lucena e João Pessoa gastaram em média, R$ 59,29 e R$ 84,65, respectivamente.

Pode-se aludir que o padrão de gastos observado para as prefeituras, concentrados nas áreas que têm o aporte de transferências intergovernamentais, tende a se agravar num panorama de crise econômica e de perda de arrecadação de tributos municipais. Se as relações entre os entes federativos, previstas na Constituição de 1988, produziram tais distorções, saliente-se que as práticas clientelistas nas prefeituras, observadas pelas instituições estaduais e federais de fiscalização, agravam ainda mais a pouca efetividade das políticas públicas.

Importantes agendas internacionais como os ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, proposto pelas Nações Unidas, e o ICES – Iniciativa Cidades Emergentes e Sustentáveis, do Banco Interamericano de Desenvolvimento, partem da premissa que as mudanças em torno das condições sociais, econômicas, fiscais e ambientais dos países devem ter como lócus as cidades. Nesse sentido, percebe-se que há ainda uma longa trajetória para que alguns municípios da Microrregião de João Pessoa alcancem níveis de desenvolvimento mais satisfatórios e inclusivos.

 

*Professora Adjunta do Curso de Economia/UFPB, Doutora em Sociologia pelo PPGS/UFPB. Coordenadora do Projeto de Extensão – Diagnósticos Socioeconômicos e Ambientais de Municípios Paraibanos. Coordenadora da Divisão de Economia Paraibana do Instituto de Desenvolvimento da Paraíba da UFPB.’



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