Em fevereiro de 2025, a Transparência Internacional divulgou que o Brasil atingiu sua pior posição histórica no Índice de Percepção da Corrupção (IPC). A nota atribuída ao Brasil foi de 34 de 100. Quanto menor a nota, mais o país é percebido como corrupto. A posição no rank foi a 107º lugar de180 países. Nosso país está abaixo da média global, que se situa em 43, e da média das Américas, que foi de 42 pontos.
O que a teoria econômica pode contribuir para entender esse estado de coisa? Recorro novamente aos conceitos de instituições inclusivas e extrativistas de Acemoglu e Robinson para explicar. Novamente, instituições são regras que regulam as interações humanas no sentido político, social e econômico.
Instituições extrativistas são arranjos políticos e econômicos desenhados para concentrar poder e renda nas mãos de poucos, em detrimento da maioria da sociedade. Nesses sistemas, o Estado deixa de atuar como garantidor do interesse público e passa a funcionar como instrumento de apropriação privada. A corrupção, nesse contexto, não é um desvio ocasional, mas um componente estrutural do funcionamento institucional.
Ao restringirem a competição econômica e política, as instituições extrativistas reduzem mecanismos de controle e accountability. A ausência de freios institucionais cria incentivos para o uso do cargo público como meio de enriquecimento pessoal. Licitações direcionadas, captura regulatória e clientelismo tornam-se práticas recorrentes.
A corrupção, por sua vez, reforça o caráter extrativista das instituições. Recursos desviados enfraquecem a capacidade do Estado de prover bens públicos como educação, saúde e infraestrutura. Isso aprofunda desigualdades sociais e limita a mobilidade econômica. Além disso, elites beneficiadas pela extração de renda tendem a bloquear reformas institucionais. Mudanças que ampliem transparência, concorrência ou participação política ameaçam seus privilégios.
Assim, cria-se um círculo vicioso no qual corrupção e instituições extrativistas se retroalimentam. Do ponto de vista econômico, a corrupção reduz investimentos produtivos e favorece atividades rentistas. Empresas passam a competir por favores políticos, não por eficiência ou inovação. O crescimento econômico torna-se baixo e volátil.
Politicamente, a corrupção mina a confiança da população nas instituições. A percepção de injustiça enfraquece a legitimidade do Estado e estimula o descrédito democrático. Em casos extremos, abre espaço para instabilidade e autoritarismo. Romper esse ciclo exige mais do que punições individuais. É necessário reformar instituições para torná-las inclusivas, transparentes e sujeitas ao controle social. Somente com incentivos alinhados ao interesse público a corrupção deixa de ser regra e passa a ser exceção.
Em síntese, corrupção não é apenas um problema moral, mas um sintoma de instituições extrativistas mal desenhadas. Combater uma sem transformar a outra é, portanto, insuficiente.
No Brasil recente abundam tentativas de reforçar o caráter extrativistas das regras de convívio. PEC da Blindagem, bloqueio a PEC do Devedor Contumaz, PEC da Dosimetria são exemplos notórios. Mas um caso específico deixa isto mais claro e têm consequências catastróficas.
No ano de 2021 a lei complementar nº 179 que estabeleceu a independência do Banco Central do Brasil (Bacen) foi promulgada pelo então presidente brasileiro. Este foi um marco histórico na política monetária brasileira, pois formalizou uma independência que, na prática, muitas vezes foi buscada, mas não tinha amparo legal.
Além da função de defender o valor da moeda nacional, o Bacen tem a função de ditar as regras de funcionamento do sistema financeiro, ou seja, tem a função de punir bancos, corretoras e outras instituições que não cumpram as normas de segurança e transparência, garantido a estabilidade do sistema financeiro brasileiro.
Com base nesta função, o Bacen liquidou extrajudicialmente o Banco Master. Uma organização financeira que afirmou que tinha, em apenas num caso, créditos de R$12 bilhões e vendeu ativos financeiros para os detentores de recursos financeiros com lastro neste dinheiro. O problema é que esses R$12 bilhões eram fictícios. De forma correta, o Bacen agiu para defender a credibilidade do sistema financeiro brasileiro.
Mas o mundo político, de todos os matizes, acorreu para ajudar o dono do Master a se livrar dos problemas criminais em decorrências de suas ações. Até a mais alta corte do judiciário brasileiro entrou na campanha para solapar a credibilidade e independência do Bacen.
A teia de interesses nos qual o dono do Master teceu envolve muitos dos próceres da república e os arranjos políticos e econômicos desenhados para concentrar poder e renda nas mãos de poucos, em detrimento da maioria da sociedade, está trabalhando intensamente. As ações visam mostra ao dono do Master que providências para socorrê-lo estão sendo feitas com o fito de desencorajá-lo de fazer uma delação premiada. Até o jornalismo dito investigativo providenciou matérias, sem comprovação, para desacreditar as ações de um ministro do Supremo foi realizada.
Como dizia Machado de Assis, “no Brasil existem dois Brasis, o real e o oficial”. O real vai pagar um preço caro para manter os privilégios do Brasil oficial, pois se o Bacen deixar de ser o acusador e passar a ser o acusado, o sistema financeiro entra em queda tipo parafuso. Pobre do povo brasileiro. A corrupção no Brasil não é um fenômeno casual, tem raízes muito profundas.

