As nuvens da política brasileira movem-se em torvelinho. Observá-las é surpreender-se constantemente.
Desde a redemocratização o inusitado foi a regra. Tancredo Neves, o primeiro presidente, eleito – ainda pelo colégio eleitoral da ditadura – por uma coligação de partidos reunidos na Aliança Democrática, morreu antes de tomar posse. Em seu lugar assumiu o vice-presidente, José Sarney, que até pouco tempo era o presidente da ARENA, partido que dava suporte à ditadura militar.
O primeiro presidente eleito pelo voto direto, depois do regime militar, foi Fernando Collor, um político obscuro, até então sem expressão nacional, que se apresentou como “outsider”, “caçador de marajás”, como eram chamados os funcionários públicos que recebiam altos salários. Derrotou nada menos que 21 candidatos no primeiro turno, entre eles grandes nomes da política nacional, como Leonel Brizola, Mário Covas e Ulisses Guimarães. No segundo turno derrotou Lula.
Renunciou ao cargo durante o processo de impeachment iniciado após escândalo de
corrupção.
Assumiu o vice-presidente Itamar Franco. Político mineiro, provinciano, de comportamento bipolar. Mercurial, como se dizia à época. Tomava decisões surpreendentes, como a nomeação de uma engenheira desconhecida e sem qualquer
experiência, por quem ele havia se encantado, Margarida Coimbra do Nascimento, como ministra dos Transportes.
Durante surto hiperinflacionário indicou para o Ministério da Fazenda, como quarto ocupante da pasta, um sociólogo, intelectual de sólida formação acadêmica, de esquerda e sem intimidade com questões econômicas, o então ministro das Relações Exteriores, Fernando Henrique Cardoso.
E deu certo. Com ele veio à luz o Plano Real e a vitória sobre a hiperinflação. Peripécia que favoreceu, a quem havia sido derrotado para a prefeitura de São Paulo, com dois mandatos presidenciais.
Lula candidatou-se quatro vezes pelo Partido dos Trabalhadores – PT, até finalmente ser eleito em 2002, derrotando José Serra. Reelegeu-se, derrotando Geraldo Alkmin,
ambos candidatos pelo PSDB.
Conseguiu eleger, como primeira presidente da história brasileira, Dilma Rousseff, ex-ministra de Minas e Energia e posteriormente da Casa Civil.
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Dilma jamais havia concorrido a um cargo eletivo, não era petista histórica – fora fundadora do PDT, partido de Leonel Brizola, no Rio Grande do Sul – não tinha vocação política, era rude no trato e frequentemente incompreensível nos seus pronunciamentos.
Quatro anos depois, contrariando a expectativa geral, quando todos esperavam que Lula voltaria candidato a mais um mandato, Dilma colocou seu próprio nome para a disputa.
Reeleita, sofreu impeachment e foi substituída pelo vice-presidente, Michel Temer.
Nas eleições seguintes, com Lula preso, Jair Bolsonaro, candidato por um pequeno e quase desconhecido partido, o PSL, apresentando-se como antipetista e antissistema, um “outsider”– embora fosse há vários mandatos, deputado medíocre do chamado baixo clero – derrotou 12 candidatos no primeiro turno e o candidato do PT, Fernando Haddad, no segundo turno.
Em 2022 Lula foi eleito para o seu terceiro mandato, depois de derrotar, no segundo
turno, por pequena margem, Jair Bolsonaro, que tentava a reeleição. Este foi o primeiro presidente a não conseguir reeleger-se.
Esta retrospectiva tem como objetivo demonstrar que o imprevisível é a regra, quando se trata de ocupar a presidência da República.
Neste ano que antecede o pleito de 2026, com certeza, muitas surpresas haverão de
acontecer. Pelo histórico da nossa democracia, o mais provável é que as nuvens que hoje contemplamos estejam completamente diferentes nos céus de novembro de 2026.