A humanidade vive tentando compreender o verdadeiro sentido da paz, que no meu entender é sinônimo de harmonia, convivência tranqüila e respeitosa entre os seres humanos. Gilberto Gil e João Donato serviram-se das contradições expostas por Tolstoi no seu livro “Paz e guerra” para filosofar sobre a paz que se conquista pela experiência da guerra, do conflito, dos confrontos. A canção foi composta em 1986.
“A paz invadiu o meu coração/De repente, me encheu de paz/Como se o vento de um tufão/Arrancasse meus pés do chão/Onde eu já não me enterro mais”. Interessante como os paradoxos, as contradições, as situações opostas, são utilizadas para construir a expressão do sentimento de paz. Fala de coisas que são contrárias ao sentido de concórdia e conformidade como: invadir, tufão, arrancar, enterrar. São todos vocábulos que nos remetem a pensar em agitação, desordem, alvoroço, tumulto. No entanto, os compositores fazem deles o caminho para encontrar a paz.
“A paz fez um mar da revolução/Invadir meu destino; a paz, Como aquela grande explosão/Uma bomba sobre o Japão/Fez nascer o Japão da paz”. O “eu poético” diz que seu destino foi invadido por um mar da revolução. Isso quer dizer que teve primeiro de conviver com a guerra para poder encontrar a paz. E lembra que o Japão conheceu a paz depois do holocausto da bomba atômica de Hiroshima.
“Eu pensei em mim/Eu pensei em ti/Eu chorei por nós/Que contradição/Só a guerra faz/Nosso amor em paz”. Fica pensando que, entre ele e sua amada ocorre o mesmo, a paz vem sempre após brigas, incompreensões, desentendimentos, na contraditória constatação de que “a guerra faz a paz”.
“Eu vim/Vim parar na beira do cais/Onde a estrada chegou ao fim/Onde o fim da tarde é lilás/Onde o mar arrebenta em mim/O lamento de tantos ais”. Ele afirma que veio parar na beira do cais, querendo dizer que lá a estrada tem fim, e no ocaso do sol recebe as pancadas das ondas do mar, na simbologia das dores que viveu e dos sofrimentos que experimentou para chegar àquele momento de paz.
• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.