A emancipação feminina começou a ser conquistada a partir da década revolucionária dos anos sessenta. Foi exatamente em abril de 1960, quando os Estados Unidos autorizavam a distribuição e venda da pílula como anticoncepcional oral, que as mulheres passaram a se sentir no controle de sua vida sexual, podendo decidir com quem, quando e em que circunstâncias deveriam engravidar. O nascimento de filhos tornava-se então resultado do desejo e planejamento dos casais. No Brasil seu uso só se tornaria popular a partir de 1970.
Entretanto, contrariando o sentimento de mudanças comportamentais e conceituais que caracterizaram o ano de 1968, o Papa Paulo VI em 25 de julho lançava a Encíclica “Humanae Vitae” (Da vida humana), que passaria a ser conhecida como a encíclica da pílula, porque tratava justamente da concepção e contracepção da vida humana, se posicionando contra o que chamava de “irresponsável uso de meios artificiais que tornem infecundo o ato conjugal”.
O documento papal provocou várias reações críticas, inclusive dentro da própria igreja católica. O movimento feminista reivindicava libertar-se da vinculação necessária do exercício da sexualidade com a possibilidade de uma nova gravidez. Haviam ainda os que defendiam o controle da natalidade por exigências da economia mundial, argumentando que o crescimento demográfico acontecia mais rápido do que a disponibilidade de recursos para a manutenção de sua existência, provocando angústias nas famílias dos povos em desenvolvimento, em razão da pobreza, da falta de condições de trabalho, de alimentação e de educação que garantissem uma vida com dignidade.
A Igreja em contrapartida justificava a proibição da pílula anticoncepcional na preocupação de preservar e proteger a vida em sua sacralidade e beleza, estabelecida nos ensinamentos cristãos, valorizando, sobretudo, a instituição do matrimônio. Entendia, e entende ainda, como uma questão moral. O papa definia que o amor conjugal não terá sentido se não for fecundo e responsável.
A imprensa paraibana trouxe depoimentos de religiosos, políticos e populares sobre a controversa encíclica.
O cônego Fernando Abath afirmou que o documento “causou uma certa surpresa ao mundo, pois esperávamos alguma coisa de nova, além daquilo que já tinha sido dito pelo Papa Pio XII. Nós todos, filhos amorosos do papa, acatamos a sua decisão e iremos estudar mais profundamente a sua encíclica, que apenas não se preocupa com o problema da natalidade, mas nos mostra o problema da família, o valor do matrimônio, e também aborda o problema dos métodos de limitação de filhos”.
O senhor Euzébio Moura de Vasconcelos, funcionário público estadual, pai de cinco filhos, disse: “Se olharmos a encíclica papal pelo lado religioso, acredito que o Papa Paulo VI está certo, mas pelo lado financeiro, se faz necessária a limitação dos filhos , tanto pelo método de pílulas anticoncepcionais, como pelo controle normal da natalidade. Não vale a pena ter muitos filhos sem poder alimenta-los, nem educa-los. Não pode haver desenvolvimento com a fome e o analfabetismo campeando. Se o governo encarasse, em primeiro lugar, o meio de subsistência do homem, o caminho mais indicado seria o crescimento da população. Enquanto não, sou favorável à limitação dos filhos”.
Na assembléia legislativa foram várias as manifestações dos parlamentares. O deputado Miranda Freire posicionou-se da seguinte forma: “Não entendo desenvolvimento sem o homem. Acho que o problema de alimentação dos filhos é uma questão de consciência, e, portanto, um problema pessoal. Cada um deve saber quando deve ter filhos. Sou totalmente contrário a pressão de terceiros para que não exista a concepção”.
O deputado Mário Silveira também emitiu sua opinião a respeito: “O problema no que diz respeito ao Brasil tem que ser encarado, antes de tudo, dentro de um ângulo político-econômico. O Brasil tem como meta prioritária, entre outras, a ocupação do maior espaço vazio geográfico do mundo – a Amazônia. Não vemos porque aceitar uma política de controle da natalidade. Precisamos sim é de uma população capaz de ocupar e desenvolver um grande país que está a exigir mercado interno para poder se transformar numa potência futuramente”.
Por fim importante conhecer o pensamento do arcebispo Dom José Maria Pires emitido na época. “Minha opinião pessoal é a de que nunca, em tempo algum, o controle da natalidade desenvolveu qualquer país, não se encontrando, nenhuma justificativa para a sua aplicação, especialmente num país como o nosso, de grande extensão territorial”.
• Esse texto faz parte da série COMO A PARAIBA VIVEU O ANO DE 1968.
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