Paraíba

Marcus Alves: “É preciso tirar a Funjope do abandono, integra-la aos desejos dos artistas e renascer uma ‘política de culturas’ para João Pessoa”


30/12/2020

Marcus Alves foi escolhido o novo diretor executivo da Funjope

Por Ângelo Medeiros com Gil Sabino



O Portal WSCOM entrevistou o acadêmico, escritor, jornalista e ativista cultural, Marcus Alves, escolhido pelo prefeito eleito de João Pessoa, Cícero Lucena, para assumir a Direção Executiva da Fundação Cultural de João Pessoa (Funjope), a partir de 1º de janeiro.

Em diálogo aberto e franco, Marcus Alves relata a situação atual em que se encontra a Funjope, com problemas estruturais, abandono e ausência de políticas públicas de cultura para a cidade. Ele garante que fará uma gestão de reconstrução, de valorização de “culturas”, com foco não apenas em eventos, mas em diversos segmentos do meio, a exemplo da literatura, do teatro, das artes plásticas e visuais, da dança, entre outros, ouvindo os artistas, os produtores e os agentes culturais.

CURRÍCULO:

Marcus Alves é doutor em Sociologia e Mestre em Comunicação Social pela Universidade de Brasília (UnB). Autor dos livros “Cultura Rock e Arte de Massa”, (Editora Diadorim); “Cultura Mercosul: uma política do discurso”, (Ed. Plano/FAP); “Arte de massa une crítica e divertimento”, Editora UCB); “O Eterno e o Provisório- Poemas”, (Editora da UFPB) e “Arqueologia – Poemas” (Moura Ramos); “O Sapato Amarelo – ou K Encontra Paludes” (Cartonera Aberta/Editora do CCTA). Tem artigos e ensaios publicados em revistas acadêmicas em Chile, Cuba, Colômbia, Polônia. Sócio-fundador da Associação Internacional de Estudos da Música Popular (IASPM-Rama Latina). Foi apresentador do programa Fórum Ideias (TV UFPB/TV Futura) e editor-chefe da TV Globo Minas/TV Triangulo. Consultor político. Foi coordenador de Comunicação do Ministério da Integração Nacional, Secretário de Comunicação dos Municípios de Conde e João Pessoa. Foi professor do curso de Comunicação Social da Universidade Católica de Brasília e do curso de Direito do Instituto de Educação Superior da Paraíba (IESP).  Foi chefe da Assessoria de Comunicação da UFPB.

ENTREVISTA:

WSCOM – Nessa fase de transição, como está a situação da Funjope e da Cultura de João Pessoa?

MARCUS ALVES – O que nos deixa preocupados em relação à Funjope é a grande falta de uma política de cultura para a cidade. Temos hoje a ausência de um olhar da Funjope para várias áreas, a exemplo da Literatura. Em oito anos, não tivemos o lançamento de um único edital voltado para a publicação de obras dos escritores e escritoras de João Pessoa. Veja que temos uma rica tradição literária que foi abandonada neste período de Luciano Cartaxo. Mas, também está precária a área de artes visuais (não aconteceram edições do Salão de Artes Plásticas). No Teatro e na área de Dança a omissão se repete.

WSCOM – Já tem uma avaliação de transição?

MA – Então temos uma demanda muito grande. A Funjope reduziu-se a fazer os eventos do calendário anual da cidade, como São João, Carnaval,  Paixão de Cristo. Isto é muito pouco.

WSCOM – Quais são os projetos para a sua atuação no órgão?

MA –  No planejamento que construímos em parceira com vários segmentos das culturas em João Pessoa pensamos em trabalhar de maneira integrada e sistêmica. Integrando e valorizando instituições e equipamentos culturais que já temos como Casarão 34, Casa da Pólvora, Pavilhão do Chá, Centro Cultural Mangabeira entre outros. Vamos revalorizar projetos e ações ligadas as praças e territórios culturais como Centro Histórico. Veja que até o patrimônio físico da Funjope está abandonado. A própria sede da Funjope está com esgotos, escadas quebradas, paredes mofadas. A própria sede, um prédio histórico e lindo, foi abandonada.

Temos que cuidar de muita coisa simultaneamente então, em um imenso desafio. Tem ainda a situação das obras públicas, esculturas e pinturas que estão sem reparo, sem manutenção.

Então, vamos reconstruir e refazer caminhos para as culturas em João Pessoa, assim mesmo no plural. E, para isso será preciso paciência, equilíbrio e muito diálogo com os artistas, com produtores e com outras instituições culturais da Capital e do Estado.

É preciso tirar a Funjope do abandono e isolamento em que ela se encontra e integra-la aos desejos dos artistas, as novas vocações e projetos de nossos produtores. O desafio maior é fazer renascer a Funjope e com ela uma política de culturas.

WSCOM – A sua experiência no meio cultural se renova agora com o desafio em assumir a presidência da Funjope, na gestão do prefeito eleito, Cícero Lucena…

MA – É um grande desafio me dado pelo prefeito Cícero Lucena, que acolheu desde o início nossas ideias sobre cultura e vem me estimulando a projetar estes novos dias para a Funjope.

WSCOM – Diante de um ano atípico com a pandemia do coronavírus, que ainda ameaça continuar, quais os seus planos?

MA – Olha, são muitas as suas perguntas e em parte elas revelam a inquietação do campo cultural que atualmente tem uma grande demanda reprimida. Isso em parte ocorre por conta da pandemia do Covid-19, mas também por muitos vazios deixados ao longo dos oito anos da atual gestão da Funjope e do governo Cartaxo. Então, nós temos que trabalhar sempre em dois aspectos. O primeiro é cuidar da Cultura, dos artistas e produtores, enquanto, perdurar a pandemia – sempre seguindo os protocolos sanitários definidos pelos governos e pela Saúde. Nesse aspecto, vamos observar, por exemplo a Lei Aldir Blanc, suas regras, suas continuidades. Vamos ver se a atual gestão conseguiu efetuar todos os pagamentos necessários, por exemplo. E saber o que é possível fazer nos meses mais imediatos. Por outro lado, a Cultura não pode parar. Precisamos já cuidar abrir novos editais, planejar os eventos do calendário anual para na medida do possível ir voltando ao normal. Então a política de cultura precisa ir ganhando forma, ter continuidade.

WSCOM – Quais as políticas públicas que pretende aplicar na atuação da Funjope em João Pessoa?

MA – A política de cultura do prefeito Cícero foi construída a partir de três eixos: os conceitos, os territórios e as instituições. No primeiro caso, ficamos o aspecto de uma cultura plural, diversificada. Hoje não devemos mais falar apenas de uma cultura de João Pessoa, mas de uma multiplicidade de Culturas que articulam diversos grupos e sujeitos, com suas identidades e desejos. Então, não devemos falar em cultura, mas em culturas – no plural mesmo. Quando avançarmos na política de Culturas queremos escutar, mapear e entender estas identidades.

WSCOM – Quais as principais programações para as diversas áreas de teatro, cinema, literatura, música, entre outras?

MA – Essas programações de algum modo são regidas a partir de um calendário que segue um certo roteiro da sociedade, com suas festas e tradições cristalizadas – como o Carnaval, Paixão de Cristo ou São João. Mas, a Funjope não pode se limitar a isso e vamos a partir de um fértil diálogo com os diversos grupos e Fóruns de Cultura já constituídos cultivar a criação de uma agenda de ações e eventos. João Pessoa é uma capital de perfil cultural, global e não pode se fechar sobre si mesma. Precisa estar aberta a projetos de integração com outros Estados e com alguns países, da própria América Latina e da Europa e África. Não é possível, por exemplo, que uma cidade de grande tradição literária como João Pessoa não ter ainda uma Feira de Literatura. Aliás nos últimos oito anos não tivemos sequer um edital de livro e literatura. Esse vazio também vai ocorrer em outras áreas como as Artes Visuais e o Teatro. Então a gente tem que reprogramar a energia da Funjope para cuidar dessas vocações e estimular novas como a Dança, a Dança de Rua, os desejos da juventude e seus modos novos de manifestar suas culturas. A Funjope tem que escutar os sons e ruídos que vem da rua, dos grupos e dos Fórum de Cultura.

WSCOM – Como pensa tratar os principais eventos existentes no município, a exemplo do Folia de Rua, da Paixão de Cristo, do São João…

MA – Estes eventos já cristalizados e deverão receber o carinho e a atenção necessários para o seu desenvolvimento, seja com estímulos financeiros próprios da Prefeitura, seja, indo buscar recursos a partir da Funjope para parcerias com o governo federal e empresas. Estes são eventos hoje com muito potencial de entretenimento e também de perfil turístico massivo.

WSCOM – A Funjope  trará de volta os festivais de verão, irá criar novos eventos para o calendário cultural da cidade?

MA – Como disse anteriormente: para termos o retorno de alguma experiência e a criação de novas experiências, precisamos construir isso.

 



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