Em 26 de julho passado tivemos o marco de 95 anos da morte de João Pessoa, poucos dias antes, o pesquisador Jocelino Tomaz, de Caiçara-PB, adquiriu uma relíquia histórica referente a esse fato, o disco de 78RPM da Odeon, contendo o “Hymno a João Pessoa”, interpretado por um dos maiores nomes da era do rádio, Francisco Alves, o “Rei da Voz”. A gravação é de 22/08/1930, menos de um mês após o assassinato, e o lançamento
ocorreu em setembro do mesmo ano. A composição é de Eduardo Souto (música) e Osvaldo Santiago (letra), ei-la:
HYMNO A JOÃO PESSOA
Lá do Norte, um herói altaneiro
Que da pátria o amor conquistou
Foi um vivo farol que ligeiro
Acendeu e depois se apagou
João Pessoa, João Pessoa
Bravo filho do sertão
Toda a pátria espera um dia
A sua ressurreição
João Pessoa, João Pessoa
O seu corpo varonil
Vive ainda, vive ainda
No coração do Brasil
Como um cedro que tomba na mata
Sob o raio que em cheio o feriu
Assim ele ante a fúria insensata
De um feroz inimigo caiu
João Pessoa, João Pessoa …

Paraíba, ó rincão pequenino
Como grande esse homem se fez!
Hoje em ti cabe todo o destino
Todo o orgulho da nossa altivez
João Pessoa, João Pessoa …
Destacamos como amostra da mitificação da figura de João Pessoa o trecho “Toda a pátria espera um dia a sua ressurreição”, o que nos remete aos mitos sebatianistas, tão populares na história do nordeste brasileiro, como também ao Rei Arthur das lendas inglesas de Camelot, e ao próprio Jesus Cristo.
O hino já estava se popularizando antes mesmo do lançamento do disco, segundo o Padre Zé Coutinho, em entrevista publicada no jornal A União em 03/09/1966, ele, o padre Zé, conclamou o povo para ir para a frente da Assembleia Legislativa da Paraíba em 03/09/1930, pedir a mudança do nome da capital, e eles já entoavam o Hino a João Pessoa, a mudança foi aprovada no dia seguinte.
A canção foi propagada pelos quatro cantos do país, dando importante contribuição para a mitificação de João Pessoa e para revolta do povo contra o presidente Washington Luiz, que tentou, sem sucesso, impedir a execução do hino. O poeta e compositor Oswaldo Santiago afirmou em carta a Domingos Azevedo que: “O Hino a João Pessoa constitui para nós brasileiros, na arrancada revolucionária de 30, uma espécie de Maselhesa (canção símbolo da Revolução Francesa).Foi a bandeira sonora da Revolução de 30”. O jornal A União, de 27/11/1930, sugere que Vargas oficialize, por decreto, a canção como o Hino da Revolução.
Outra gravação também de grande repercussão foi a “Oração a João Pessoa”, discurso do deputado mineiro Pinheiro Chagas, lançado no disco de 78rpm nº 10.714 da Odeon. O presidente Washinton Luiz tentou impedir a circulação desse material.
Quando os revolucionários gaúchos chegaram ao Rio de Janeiro, duas características eram notáveis, eles tinham um grande lenço vermelho no pescoço e entoavam o Hino a João Pessoa. Na Paraíba, segundo “O Jornal”(RJ), de 30/10/1930, cerca de 10 mil pessoas entoaram o hino após a missa em intenção do terceiro mês do falecimento de João Pessoa, comemorando também a deposição do presidente Washington Luiz
Em levantamento realizado pelo jornal Diário da Noite (RJ), de 28/10/1930, não se conseguia mais encontrar mais discos nas lojas e a gravadora Odeon reiniciou a produção. O jornal “A Noite” cita; “Converteu-se a música na canção do momento, do sul ao norte do país”. Segundo livro “A Canção no Tempo”, de Jairo Severiano e Zuza Homem de Melo, foi o maior sucesso de vendas de 1930.
Em 27 de dezembro de 1930 o hino teve uma belíssima gravação pela Banda do Regimento Naval, lançada em janeiro de 1931 no lado “b” do disco 10.762 da Odeon, que tinha em seu lado “a” o Hino Nacional Brasileiro.
ACUSAÇÃO DE PLÁGIO
Em meio a todo o sucesso do Hino a João Pessoa, caiu como uma bomba a acusação do maestro Alemão radicado no Brasil, Walter Schanz de que mais de oito compassos da canção seria da sua marcha carnavalesca “Toca pro Páo”,lançada em março do mesmo ano. O maestro Eduardo Souto, compositor do hino, achou absurda a acusação, alegando que o tema musical que o alemão denunciava não era de autoria dele e sim de domínio publico e que a sua canção carnavalesca “Toca pro Páo” era calcada em ritmo criado anos antes pelo próprio maestro denunciado.
Em meio a polêmica, o compositor Pedro Silva, em carta publicada no jornal Correio da Manhã (RJ), alegando que o Hino a João Pessoa era parecidíssimo com a música sacra “Tantum Ergo”, de 1925. Enfim, temos a curiosa situação em que um hino patriótico pode ter usado partes de uma marcha carnavalesca que por sua vez pode ter sido inspirada em uma música religiosa.

