A negociação entre o Mercosul e a União Europeia entra, a partir desta quinta-feira (17), em um dos momentos mais determinantes desde que os dois blocos anunciaram um entendimento político em dezembro do ano passado, encerrando um processo marcado por cerca de 25 anos de avanços e recuos.
Entre esta quinta e a sexta-feira, os governos dos países-membros da União Europeia se reúnem no Conselho Europeu para avaliar se aprovam ou não o texto do acordo. Um eventual sinal verde abriria caminho para a assinatura formal do documento no sábado (20), em Foz do Iguaçu, durante a cúpula de chefes de Estado do Mercosul.
As decisões desses encontros podem selar a ratificação definitiva do tratado ou interromper novamente o processo, que hoje extrapola o campo comercial e enfrenta resistências políticas dentro do bloco europeu.
Nos últimos dias, um movimento favorável ajudou a destravar o debate. O Parlamento Europeu aprovou a inclusão de salvaguardas agrícolas no texto, consideradas estratégicas para ampliar o apoio político ao acordo. A medida, no entanto, não elimina as divergências: liderado pela França, um grupo de países segue contrário aos termos negociados e tenta impedir um desfecho positivo.
Apesar da expectativa em torno de uma possível presença da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, na cúpula do Mercosul para a assinatura, o acordo teve sua primeira formalização ainda em 2019. Na ocasião, o gesto foi essencialmente político e simbólico, sem impacto imediato sobre tarifas ou regras de comércio. Desde então, o texto passou por revisões técnicas e ajustes até alcançar a fase atual.
Aprovadas na última terça-feira por 431 votos a favor e 161 contrários, as salvaguardas agrícolas autorizam a União Europeia a suspender temporariamente as tarifas reduzidas concedidas a produtos do Mercosul sempre que houver risco de prejuízo ao mercado interno. As novas regras tornam esse mecanismo mais ágil: antes, era necessário comprovar um aumento anual de 10% nas importações; agora, basta um crescimento médio de 5% ao longo de três anos para produtos considerados sensíveis, como carne bovina e aves.
O prazo de investigação também foi encurtado, passando de seis para três meses, ou até dois meses no caso de produtos agrícolas. Além disso, deixou de ser exigida a comprovação detalhada de dano econômico, adotando-se o princípio da “presunção de prejuízo”, o que amplia a margem de atuação das autoridades europeias.
Para o Brasil, principal economia do Mercosul, o acordo representa uma oportunidade de reforçar sua posição no comércio internacional. O tratado amplia o acesso a um mercado estimado em 451 milhões de consumidores e pode ajudar o país a se reposicionar em um cenário global marcado por disputas comerciais e tensões geopolíticas.
Os efeitos, porém, não se limitam ao agronegócio. A redução de tarifas para produtos manufaturados europeus tende a aumentar a concorrência no mercado interno, ao mesmo tempo em que pode baratear insumos, máquinas e equipamentos utilizados pela indústria brasileira.
O acordo também evidencia estratégias distintas de inserção do Brasil no comércio global. Enquanto a relação com a China é fortemente baseada na exportação de commodities, a parceria com a União Europeia envolve exigências ambientais e mecanismos de cooperação regulatória.
Caso o tratado não avance, a avaliação é de que o país tende a intensificar ainda mais seus laços com a Ásia, especialmente com a China, que hoje compra mais que o dobro do volume exportado pelo Brasil ao mercado europeu e não impõe condicionantes ambientais à produção.
