Enquanto milhões de estudantes refletiram, no último domingo (9), sobre as “Perspectivas acerca do envelhecimento na sociedade brasileira”, tema da redação do Enem 2025, no Alto Sertão da Paraíba a discussão já acontece na prática. Em Triunfo e Poço de José de Moura, idosos estão redescobrindo habilidades, gerando renda e conquistando autonomia por meio do projeto Viver e Empreender, iniciativa da ONG Pisada do Sertão, financiada pela Electrolux.
A proposta atende 100 idosos dos dois municípios, oferecendo cursos de corte e costura, artesanato, culinária, quintais produtivos e educação financeira. A iniciativa reforça a ideia de um envelhecimento ativo e produtivo — tema central das discussões que ganharam força após o Enem.
Segundo dados do IBGE, o Brasil tem hoje mais de 34 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, o equivalente a 16,2% da população. As projeções indicam que, até 2050, esse percentual deve ultrapassar 30%, tornando o país uma nação majoritariamente idosa. Na Paraíba, o movimento é ainda mais acelerado: o estado possui uma das maiores proporções de idosos do Nordeste, com mais de 17% da população nessa faixa etária. Os dados reforçam a urgência de políticas e iniciativas que deem protagonismo à pessoa idosa.
Transformação que vai além da sala de aula

Imagem: Divulgação
No polo de Triunfo, a coordenadora do projeto, Elizângela Duarte, acompanha diariamente os avanços das participantes. Ela destaca que o trabalho tem sido profundamente transformador, especialmente ao observar mudanças de autoestima e comportamento. Um dos casos que mais marcaram sua trajetória foi o de uma idosa com limitação de locomoção e Parkinson, que chegou desacreditada de suas próprias capacidades e hoje confecciona artesanatos com confiança e entusiasmo. Para Elizângela, histórias como essa mostram que “o envelhecimento pode ser uma fase de descobertas, não de desistências”.
A instrutora de corte e costura Maria do Carmo também percebe o impacto emocional das oficinas. Apesar de muitas alunas já terem alguma experiência com costura, outras começaram do zero — e todas demonstram orgulho ao finalizar cada peça. Ela conta que o carinho das alunas, as histórias trocadas e o brilho nos olhos ao concluir uma produção são o que mais a encantam. Para a instrutora, o projeto tem reforçado o sentimento de utilidade e valorização pessoal.
No artesanato, a instrutora Nilma Duarte destaca que cada oficina é um momento de troca e afeto. Para ela, o processo vai muito além da técnica: estimula criatividade, fortalece vínculos e funciona como uma verdadeira terapia ocupacional. Nilma acredita que o projeto tem mostrado aos idosos que sempre é tempo de aprender e recomeçar — um dos pilares da metodologia da Pisada do Sertão.
Parcerias que fortalecem o cuidado e a inclusão
Em Triunfo, a parceria institucional também tem sido decisiva. A secretária de Assistência e Desenvolvimento Social, Janaina Andrade, explica que o município tem contribuído com infraestrutura, logística e articulação social para que o projeto aconteça de forma contínua. Ela destaca o impacto emocional e social percebido: idosos mais confiantes, sociáveis e com maior senso de utilidade e protagonismo.
Além da atuação em Triunfo, o projeto também conta com a parceria da Secretaria de Assistência Social de Poço de José de Moura, onde as oficinas são realizadas no CRAS, atendendo idosos do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV). A colaboração do município tem sido fundamental para garantir espaço, apoio social e articulação comunitária, fortalecendo a participação e o bem-estar dos idosos na região.
Empreender na maturidade: renda, autonomia e pertencimento
Os resultados do projeto já começam a aparecer na prática. Idosos têm comercializado os produtos que aprenderam a produzir nas oficinas, gerando renda extra e ganhando independência financeira. Além disso, o clima de convivência e colaboração tem fortalecido laços comunitários, criando redes de apoio e estimulando o cuidado coletivo.
A secretária de Assistência e Desenvolvimento Social de Triunfo, Janaina Andrade, destaca um crescimento nítido na autonomia e na autoconfiança dos participantes — pessoas que, muitas vezes, haviam perdido o senso de utilidade e agora se reconhecem como protagonistas. Para ela, ter idosos empreendendo representa não apenas um avanço econômico, mas também um marco cultural. “Triunfo mostra que envelhecer não é sinônimo de incapacidade, mas de potência e criatividade”, reforça.
Diálogo com o Enem e com o futuro
O Viver e Empreender se alinha diretamente ao debate levantado pelo Enem 2025 sobre o papel da pessoa idosa na sociedade. Se o país vive um rápido processo de envelhecimento, iniciativas como esta mostram caminhos possíveis para garantir dignidade, autonomia e inclusão.
A presença de uma participante de 95 anos, ativa nas oficinas, simboliza o espírito do projeto: envelhecer não significa parar, mas continuar escrevendo novas histórias.
O trabalho da Pisada do Sertão revela que, quando oportunidades são criadas, os idosos respondem com entusiasmo, talento e desejo de participar. No Sertão, longe dos grandes centros urbanos, eles estão mostrando que empreender não tem idade — e que construir um futuro mais humano e inclusivo é uma tarefa coletiva.
