OPINIÃO: “Do prêmio Nobel de economia ao 13º do Bolsa família”, por Erik Figueiredo

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Por Erik Figueiredo

 

 

As análises jornalísticas direcionadas ao prêmio Nobel de economia de 2019, concedido ao trio Abhijit Banerjee (MIT, USA), Esther Duflo (MIT, USA) e Michael Kremer (Harvard, USA), limitaram-se a questões menores e desfocadas da real contribuição dos estudos desenvolvidos pelos pesquisadores. Jornais de grande circulação nacional, como O’Globo e a Folha de São Paulo, preferiram destacar  a juventude e o gênero da professora Duflo. Quando muito, os comentários permearam o resumo da contribuição dos autores divulgado pelo próprio comitê do Nobel: “por sua abordagem experimental da redução da pobreza”. Evidente que não esperávamos muito mais do que isso, dada a presença de temas tão populares na mesa do progressismo de botequim, mas precisamos entender melhor a real relevância dos estudos desenvolvidos na área.

 

Em primeiro lugar, os professores se notabilizaram pelo uso de instrumentais capazes de gerar experimentos sociais. Em outras palavras, uma política de combate à pobreza só terá sua eficácia comprovada se forem identificados elementos causais entre a intervenção  e o resultado de interesse. Como já destacado em um artigo anterior (Link aqui: https://www.wscom.com.br/professor-erik-figueiredo-analisa-poder-transformador-da-educacao/), essas estratégias visam criar um ambiente experimental similar ao que é feito em estudos de biomedicina, onde, parte dos pacientes recebem o remédio, a outra parte recebem o placebo (remédio falso). Dessa forma, definem-se os grupos de tratamento, ou seja, aqueles que seriam beneficiados com uma determinada política e; outro de controle, isto é, aqueles que não seriam expostas a qualquer tipo de intervenção. Com isso, torna-se possível identificar o real efeito da intervenção a partir da comparação dos resultados de dois grupos homogêneos, isto é, os que foram expostos ao tratamento e os que não foram expostos. Nesse ponto, não posso deixar de registrar que, embora necessário, o uso desses instrumentos levantam questões relativas ao comportamento ético dos pesquisadores, como pode ser constatado nesse artigo do Washington Times (link aqui: https://www.washingtontimes.com/news/2019/oct/21/the-nobel-committee-has-lost-touch-with-actual-sci/). 

 

Deixando o método de lado, uma pergunta ainda persiste: quais as conclusões contidas nos estudos dos laureados? Em um vídeo popular do TED Talks (link aqui: https://www.ted.com/talks/esther_duflo_social_experiments_to_fight_poverty?language=pt-br), a professora Esther Duflo faz o seguinte questionamento: se você tivesse uma determinada quantia em dinheiro e resolvesse ajudar a população mais pobre, o que voce faria? Para responder a esta questão, ela traz o exemplo do combate a malária na África. Milhões de dólares são gastos, por exemplo, na compra de mosqueteiros. A idéia é simples: se as crianças dormirem protegidas pelo mosqueteiro, o mosquito da malária terá menos chances de picá-las e o número de mortes em decorrência dessa doença diminuirá. Mas a execução não é tão simples. Observou-se que a doação de mosqueteiros para famílias africanas não surtia efeito, pois, os moradores usavam o mosqueteiro como tudo, menos como mosqueteiro. Para se ter uma idéia, muitos o utilizavam como rede de pesca. Em resumo, a política falhou.  Dinheiro foi desperdiçado.  

 

Então como fazer a pessoas usarem o mosqueteiro da forma correta? A pesquisadora fez uma seleção aleatória de tribos. Em algumas tribos o mosqueteiro foi doado. Em outras, havia um voucher de desconto no valor do mosqueteiro, ou seja, você poderia ter que pagar 20%, 30% ou 50% do mosqueteiro para poder levá-lo para casa. Tempos depois, os pesquisadores retornaram para avaliar o resultado e as suas conclusões não surpreenderam: os que mais pagaram pelo mosqueteiro, foram os que melhores o utilizaram. Sendo assim, a conclusão forte de suas pesquisas, que vão além desse caso que acabo de relatar, é: a política social será mais eficiente quanto maior for a contra partida exigida do beneficiário. Essa contrapartida não necessariamente será monetária, basta observar o exemplo das vacinas contido no video.

 

Em resumo, o Nobel concedido no último dia 14/10 deixa uma lição importante, embora negligenciada nas análises jornalísticas. O importante não é o sexo ou a idade dos laureados e sim a mensagem deixada por suas pesquisas. Por coincidência, um dia após o anuncio do Prêmio Nobel, o presidente Jair Bolsonaro assinou uma Medida Provisória prevendo um 13º salário a beneficiários do Bolsa Família. Certamente os laureados não curtiriam essa  MP. Quem dera que os formuladores de política pública escutassem aqueles que pesquisam sobre o assunto.

 

*O artigo semanal é resultado de uma parceria entre o Portal WSCOM e o Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Erik Figueiredo é professor na instituição.

Escrito por: Edney Oliveira

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