O recém-lançado livro do Felipe Nunes, Brasil no Espelho, trata, entre outros temas, da confiança entre os brasileiros. Com base em ampla pesquisa, que confirma outra divulgada há cinco anos pelo World Values Survey, conclui que somos um País de desconfiados. Não confiamos uns nos outros. Apenas 6% dos brasileiros concordam que podem confiar na maioria das pessoas. Na Noruega, 72% confiam.
“Mas por que a falta de confiança é tão importante? A confiança interpessoal está associada à maior capacidade institucional, maior crescimento econômico e menor desigualdade. Pessoas que sentem mais confiança nas demais tendem a confiar mais nas instituições de seu país, como na política, na justiça e nas forças de segurança. Pessoas com mais confiança também se mostram mais dispostas a investir, firmar contratos e se arriscar em novos negócios, que são comportamentos associados ao crescimento financeiro e econômico. A confiança também faz com que as pessoas se disponham a conhecer e interagir com pessoas de outros grupos, o que ajuda a estabelecer laços de coesão na sociedade.
Décadas de estudos mostram que o nível de confiança interpessoal e o associativismo de uma sociedade estão correlacionados com maiores níveis de capacidade institucional, a qualidade da democracia e o crescimento econômico.”
Cabe às elites dirigentes do País reverterem essa verdadeira tragédia nacional, por meio principalmente do exemplo. Comportamentos éticos impecáveis, coerência com princípios de honestidade, decoro, conduta ilibada e a construção de uma muralha entre o interesse público e o privado.
No mundo corporativo, as empresas de capital aberto estão sujeitas a códigos de ética, cujo principal objetivo é assegurar que seus dirigentes separam os interesses da companhia dos seus interesses privados. Também estão sujeitas a leis anticorrupção, regulamentos, auditorias externas e canais de denúncia independentes, entre outras medidas de controle.
Contrastando com esses princípios, as mais altas instituições do País dão-se liberdades inadmissíveis em esferas menos destacadas da sociedade e são exemplos negativos de comportamento.
No Congresso Nacional, deputados e senadores estão envolvidos com a utilização de dinheiros públicos, por meio das emendas orçamentárias, de forma pouco transparente e com fortes sinais de má destinação e de corrupção. No momento há vários parlamentares sendo investigados.
Beneficiam-se com verbas bilionárias para os seus partidos e para financiar eleições. Tentam passar leis que os blindem da responsabilização por maus feitos.
No Judiciário, o que já não ia bem piorou muito.
O caso do banco Master é emblemático, preocupante e recomenda que a sociedade expresse, com veemência, que não admite os comportamentos que estão sendo revelados.
É necessário dar um basta, traçar uma linha da qual não se possa passar.
A ação individual de ministros do STF, em nome de interesses obscuros ou claramente familiares, arrasta com eles a própria Instituição.
A ousadia de um ministro do TCU, intervindo em assunto da competência exclusiva do Banco Central, também arrasta com ele o próprio Tribunal e torna possível a interpretação de que se trata de ação coordenada com o ministro do Supremo.
Em ambos os casos, as ações surpreendem pelo ineditismo, pela discutível competência para tratar do caso, pela surpreendente pressa das iniciativas e pelo tratamento dado ao Banco Central, nivelando o agente fiscalizador ao fiscalizado.
A liquidação do Master surpreende exatamente ninguém. Depois de tentar uma venda obscura ao Banco Regional de Brasília, seu controlador, Daniel Vorcaro, foi preso, acusado de fraude bilionária. Seu banco é objeto de investigação em vários estados, por fraudar fundos de pensão de funcionários públicos.
Note-se que as relações do banco são sempre com entidades públicas. Os privados há muito haviam se afastado do banco e do seu controlador, que mantém relações muito próximas com políticos, tribunais, advogados parentes de ministros e outras autoridades.
Caso típico do patrimonialismo brasileiro.
Os desdobramentos do caso apontam para riscos imensos. A reversão da liquidação do banco por meios “legais”, o enfraquecimento da autoridade do Banco Central, o risco sistêmico daí decorrente, a desmoralização do STF e do TCU e o aumento da desconfiança dos brasileiros nas suas instituições, com todas as consequências nefastas daí decorrentes.

