Paulo Amilton: O corredor estreito e o Brasil

Imagem: Reprodução / TV Globo

Os economistas Daron Acemoglu e James A. Robinson, agraciados com o prêmio Nobel de economia no ano de 2024, no livro The Narrow Corridor, formularam a hipótese do “corredor estreito”.

A ideia central é que a liberdade política e econômica só floresce dentro de um “corredor estreito” onde o Estado é forte o suficiente para impor leis, garantir direitos e prover bens públicos e a sociedade é organizada, vigilante e capaz de conter abusos do Estado.

Para que a liberdade floresça é necessário que tanto o Estado quanto a sociedade civil sejam fortes e cresçam juntos, contrabalançando-se mutuamente. Este equilíbrio ocorre dentro de um corredor muito estreito.

Os autores também formularam no livro “Por que as nações falham?” a ideia da existência de instituições inclusivas e instituições extrativas. Sendo instituições as regras de moldam as relações humanas no sentido humano, econômico e social.

As primeiras são aquelas que permitem e incentivam a participação da grande massa de pessoas em atividades econômicas que façam o melhor uso dos seus talentos e competências. Se caracterizam por direitos de propriedade assegurados, sistema jurídico imparcial e serviços públicos que proporcionem igualdade de condições.  As segundas são desenhadas para extrair rendas e riquezas de um subgrupo da sociedade para beneficiar uma elite minoritária.

As instituições inclusivas são, na verdade, o que se encontra dentro do corredor estreito. Para que existam instituições que incluam toda a sociedade, o Estado não pode ser tão fraco que não consiga aplicar as leis, nem tão forte para que a lei sirva apenas a elite.  Instituições políticas inclusivas levam a instituições econômicas mais inclusivas e a prosperidade econômica com justiça social.

A ligação entre a tese do corredor estreito e a atuação dos partidos políticos é estrutural, pois os partidos são o principal mecanismo que transforma poder social difuso em controle institucional contínuo do Estado.  Da mesma maneira, existe uma estreita ligação entre a atuação do Judiciário e a tese do corredor estreito, porque o Judiciário é um dos principais mecanismos institucionais que mantêm o Estado dentro desse corredor, evitando tanto a anarquia social quanto o despotismo estatal.

O Brasil pós constituição de 1988 construiu instituições inclusivas no texto constitucional, mas não consolidou o corredor estreito que as faria funcionar de forma contínua. Muito pelo contrário, a atuação dos partidos políticos e do judiciário defendem o Brasil de um dia está dentro de corredor estreito e gerar uma sociedade justa e prospera.

Vide agora o caso do Banco Master. O Banco Central do Brasil (BACEN) liquidou extrajudicialmente o Banco Master. Como é de conhecimento, o Bacen, após detectar indícios que o Master havia vendido R$ 12,2 bilhões em carteiras de crédito inexistentes, tomou a iniciativa de liquidar o banco. A princípio, tentou-se dar uma solução de mercado ao problema, mas quando a situação de liquidez se tornou crítica demais, em que existiu uma clara situação de insolvência, a solução foi a liquidação extrajudicial. A decisão do Bacen se baseou em critérios puramente técnicos.

A decisão visava proteger os recursos de uma miríade de investidores, desde fundos de pensões dos funcionários públicos dos Estados do Rio de janeiro, Distrito Federal e Amapá, até quem aplicou, de forma privada, seus parcos recursos com o intuito de obter uma remuneração melhor.

Porém, numa decisão surpreendente, o Tribunal de Contas da União (TCU) deu 72 horas para que o Bacen justifique a liquidação do Master, numa clara tentativa de fazer o Bacen ser responsabilizado pela situação do Master, e não as decisões temerárias de seu proprietário. Uma inversão de valores absurda. O errado vira o certo e o certo vira o errado. O problema é que um defende a sociedade e o outro os interesses de uma elite política extrativista.

O ministro do TCU que solicitou as explicações foi uma indicação de um político de grande influência, que exerceu um cargo de muita relevância até o início de 2025. Este é do mesmo partido de um outro que tentou aumentar o valor do fundo garantidor de 250 mil para um milhão e tentou fazer com que o Banco Regional de Brasília (BRB) assumisse o Master.  Uma união dos interesses do mundo político com o mundo jurídico.

A tempos as ações do Bacen vêm sendo questionadas.  Primeiramente a independência em relação a política monetária. Agora a independência de fiscalizar a solvência do sistema financeiro brasileiro. Ou seja, se questiona a independência de um órgão de Estado que tem a função de preservar o valor da moeda nacional.

Ao que tudo indica, o escândalo só está no início, pois pelo envolvimento através de serviços advocatícios de familiares de ministro do Supremo e de viagens de outro em jatinhos em companhia de advogados de defesa do dono do Master, parece que não terá um fim tão cedo.

Aqui, por mais que a constituição de 88 tenha tido a intenção de criar instituições inclusivas e colocar este país num corredor estreito, as ações daqueles que tem a função de fazer isto acontecer garantem que isto não vai aconteça nunca.

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