Em direito de resposta enviado nesta quarta-feira (4), o engenheiro Wilton Maia Velez respondeu declarações publicadas por Durval Leal Filho a respeito da “mercantilização da água” e da suposta existência de “marajás do saneamento”. No texto, Velez afirma que o autor faz uma denúncia “simbólica e sem evidências concretas”, deixando de apresentar dados, contexto técnico e histórico que sustentem suas críticas. Em seu compromisso com a liberdade de expressão e com a verdade, o Portal WSCOM abre espaço para a publicação do direito de resposta enviado pelo engenheiro, leia abaixo o texto redigido por Wilton:
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O texto de Durval Leal Filho tem seu mérito e é louvável por denunciar um problema grave e real: a mercantilização da água como recurso natural e bem comum. O autor chama atenção para o caráter essencial da água e relativiza a ideia de que o saneamento
deve ser tratado como simples mercadoria. No entanto, embora acerte na causa — a defesa da água como bem público, e não como produto comercial — o artigo decepciona pela ausência de propostas concretas, dados robustos ou contextualização histórica e
técnica que fortaleçam seu argumento. Predomina um tom simbólico e retórico (“vender algo que é bem comum e precioso”), mas faltam evidências objetivas sobre os supostos “marajás”: quem são, quais interesses representam e como ocorreria a apropriação
predatória ou exploratória da água no contexto atual.
Essa falta de substância enfraquece a denúncia e abre espaço para ambiguidades interpretativas — o que, a meu ver, é perigoso quando se discute a gestão de um serviço essencial. Além disso, o artigo parece partir do pressuposto de que a privatização — ou mercantilização — é inevitavelmente sinônimo de degradação social e injustiça. Porém, não dialoga com as experiências complexas, tanto positivas quanto negativas, do saneamento no Brasil e no mundo. Tampouco confronta de forma direta os desafios de infraestrutura, regulação, universalização e financiamento que historicamente afetam o setor público. Assim, critica
de maneira justa a mercantilização da água, mas peca pelo reducionismo e pela falta de profundidade analítica.
Essa superficialidade pode comprometer a própria luta pelo saneamento universal, ao reproduzir um discurso moralizante que não constrói um plano estruturado de defesa do serviço público — tarefa que exige clareza técnica, mobilização social e diagnóstico realista. Diante do artigo apresentado por Durval Leal Filho, exponho ponderações fundamentais sobre suas contradições e lacunas argumentativas:
- Denúncia simbólica sem evidências concretas. O texto fala de “água vendida como mercadoria” e “marajás do saneamento”, mas não identifica quem seriam esses beneficiários, nem apresenta dados sobre lucros, contratos, tarifas ou desigualdades.
- Ausência de histórico ou contexto técnico. Não há referências a leis, estatísticas, dados de acesso, qualidade da
água ou histórico de concessões e privatizações. Falta análise sobre o papel do Estado, da regulação e das experiências anteriores do setor no Brasil. - Visão simplista da privatização. A privatização é tratada como inevitavelmente negativa, sem considerar os
desafios estruturais do saneamento público ou a necessidade de melhorias em infraestrutura, gestão e investimento. - Falta de propostas de políticas públicas. Há crítica ao modelo de mercado, mas nenhuma sugestão concreta de fortalecimento do serviço público, de regulação ou de mecanismos democráticos de controle social.
- Risco de discurso moralista e polarizado. O tom moralizante da crítica pode afastar parte da população e tornar o debate mais ideológico do que técnico — justamente o oposto do que se espera quando o tema envolve acesso a direitos básicos.
- Contradições entre simplicidade do texto e complexidade do problema. O autor reduz questões como abastecimento, saneamento e universalização ao tema do financiamento, sem mencionar a necessidade de regulação, distribuição, infraestrutura e, sobretudo, as desigualdades regionais. Assim, o artigo trata tudo como se existisse apenas um único “mal do lucro” a ser combatido.
- Despolitização da luta social. Ao enquadrar o debate como “privado versus público”, sem mapear alianças, atores sociais ou a atuação do Estado, o texto corre o risco de transformar a mobilização em mero antagonismo simbólico, incapaz de gerar mudanças estruturais reais. Diante disso, o artigo acaba trazendo à tona — de maneira, no mínimo, equivocada — o ataque sistemático à remuneração dos servidores, muitas vezes apresentados como “marajás” para justificar cortes, precarização e privatização. E
é justamente aí que a crítica se mostra insuficiente.
A retórica de que servidores públicos recebem demais, trabalham pouco e vivem de privilégios tem sido repetida por décadas e serve como base ideológica para privatizações, terceirizações e congelamento salarial, especialmente em áreas essenciais como água, saneamento e energia. Ao usar o termo “marajás”, ainda que de forma imprecisa, o autor acaba expondo um problema real: o uso político da desinformação para destruir a imagem do trabalhador público.
O ataque moral ao servidor é um projeto político, não apenas um deslize retórico. Portanto, Durval Leal Filho, é preciso reconhecer que salário justo não é privilégio: é condição para garantir a continuidade e a qualidade do serviço. Se se defende a meritocracia, deve-se admitir que engenheiros, operadores de bombas, químicos, laboratoristas, técnicos e equipes de manutenção precisam ser valorizados para evitar a fuga de profissionais qualificados para o setor privado. Salários adequados, além de atrair e manter talentos, reduzem riscos de corrupção.
A grande maioria dos servidores recebe remuneração modesta, muito distante do que você sugere. Generalizar o termo “marajá” reforça um estigma injusto e prejudica trabalhadores essenciais. Por fim, ao discutir privatização, raramente se menciona os lucros das empresas privadas, a remuneração de seus executivos, as tarifas abusivas ou a importância da participação social no controle do serviço. A sociedade é reduzida ao papel de consumidora — e nada mais. Seu texto, Durval Leal Filho, é rigoroso ao criticar um
lado (o trabalhador), mas não demonstra a mesma disposição para apontar falhas do capital privado que disputa o controle da água.
Lamentavelmente, erra no caminho escolhido para abordar um tema tão complexo. Ainda assim, concordamos em um ponto
essencial: Lembrando que o movimento global de reestatização de serviços de água e saneamento, impulsionado pela má qualidade do serviço, aumento de tarifas e falta de investimento em gestão privada. A tendência é liderada por países como Alemanha, França, Estados Unidos e Reino Unido.
A água, como recurso natural e bem comum, de caráter absolutamente essencial, não pode ser tratada como simples mercadoria. É um direito humano que garante saúde pública, qualidade de vida e dignidade. Água para a vida, não para a mercantilização.
Campina Grande-PB, 04 de dezembro de 2025.
Wilton Maia Velez
