Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

O Voo de Lucas


28/04/2015

Foto: autor desconhecido.

 Para Lucas, com amor

Sempre soube que criamos os filhos para o mundo. Mas uma coisa é saber, e a outra é ver isso acontecer…”What brain matters compared to the heart?” , já dizia Mrs. Dalloway. E hoje, eis me cá, com a síndrome do ninho vazio!

Meu filho mais velho Lucas, saiu de casa este final de semana. Foi juntar as escovas de dentes com sua noiva, Natália. Há muito tempo que se conhecem, namoram, trocam e se amam. E há algum tempo que se organizam para isso. E eu, feliz de assistir à sua longa jornada dia afora…

Também acredito que os filhos devem sair de casa aos 21 anos. Ganharem os mundos. Ter independência e responsabilidades. Mas nesse momento da vida, confesso que, queria os meus dois filhos debaixo das minhas asas. E já começo a ter alguns insights que não será tão fácil como imaginava…

Parece que foi ontem. Fiquei grávida de Lucas em circunstâncias adversas, pois era o início dos anos 80; vivíamos exageradamente. E não tinha uma relação formal, que naquela época, talvez, um filho ainda exigisse. Mas, a maternidade falou mais alto e a vivi com todas as dores e delícias. Apaixonada pelo meu bebê! E senti essa plenitude ao sair da maternidade, com ele embrulhadinho feito pacote de amor.Depois foi só entrega. E os amores conquistados de ter nascido mulher (como tão bem estudaram as filósofas Elizabeth Badinter e Adrienne Rich).

Nunca me deixei iludir com a sacralidade do ser mãe. Mas vivenciando a maternidade por duas vezes, soube bem distinguir o joio do trigo; o amor incondicional e de todas as complexidades desse amor. E me deixei transbordar pelo amor por meus filhos, Lucas e Daniel, esse hoje com 23 anos. E aprendo todos os dias, a ser mãe de homem.

E assim se passaram 31 anos Lucas. Você bem sabe o tanto que já viveu. As dificuldades quase intransponíveis. Mas você é um homem tão corajoso! E tão bravo! Acho que foram as raízes de Itaporanga, com as águas da cachoeira de Água Fria, pois lá tomei muito banho com você na barriga. A fluidez das águas uterinas com as águas das terras da sua avó Regina, que lhe deram toda a sua bravura e resistência.

Passa o filme na cabeça: suas birras por andar solto da mãe, já aos 2 aninhos; das inúmeras quedas, cortes e pontos, para me deixar doida; do cão Fila do vizinho que lhe pegou pelas costas, e eu quase me desfaleci ao pensar no que poderia ter acontecido; nossas férias sozinhos em Baía Formosa. 10 dias a gente passeando, pegando jacaré e comendo os pirões de D. Vandete! E de todas as nossas cumplicidades ou falta delas, experienciadas com tanto amor e também com as dificuldades que toda relação amorosa se impõe.

E sua sisudez? Tímido por excelência, com um humor mais que mordaz, herdado do seu pai, Fred Pitanga, e que não falava comigo ao telefone quando parti para o mestrado na Inglaterra. Eu chorava do lado de lá, e você emudecia do lado de cá, aos 3 anos ainda….foi duro, eu sei! Mas foi preciso, eu também sei! Não é homem das conversas fortuitas. Mas se comunica por um afeto que é só seu. É queridíssimo dos amigos. E amado pela sua querida Natália.

Depois de adulto, essa motocicleta das trilha dificultosas aqui parada no terraço, que eu todos os dias peço que desista desse hobby tão insuportável para as mães! Fico a imaginar na agonia da mãe de Maya Gabeira, vendo-a surfar aquelas ondas gigantes. Não tenho calma para isso!

Mas você também teve seus dias de surf, de ventos, de radicalismos, e de prender o dedo na bicicleta, cair na piscina, levar pedrada no olho, tantos pontos no joelho…e eu, ah! Como as mães sofrem as dores dos filhos.

Você bem tem sua doçura, mas cercado de uns lampejos de siri na Lata!! Mas nem gostas tanto assim de carnaval… Também enfrentou suas agruras difíceis. Por vezes, a vida tratou-lhe mal, eu sei, meu filho querido, e a mim também, por vezes. Mas Juca e Fred bem que dessas curvas entendiam! Mas conseguimos tomar as rédeas.Assumir responsabilidades e seguir. E ainda teve suas licenças poéticas para construir uma fonte com peixinhos no nosso jardim. Com uma água que jorra de lágrimas de saudades eternas do seu “padrasto”, que não aceitava esse posto. Era pai também. E sorte a sua hein menino? Dois pais!

Hoje, quando lhe vejo adulto, homem, tocador da sua vida, trabalhador, pregando seus quadros nas paredes do seu canto, amoroso com a sua mulher, e dando conta de tantas coisas que pensei serem insuportavelmente administráveis, sinto muito orgulho da sua bravura. Da sua resiliência e alegria de viver.

Seja feliz meu filho. E Juca lhe manda beijos lá dos céus também.

Com amor,

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa 28/04/2015


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