Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Política

Não nos enganemos mais com o discurso da antipolítica


17/06/2023

O então deputado Jair Bolsonaro na votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016 (Foto: Alan Marques/Folhapress)

 

 

O discurso da antipolítica que a extrema direita vem propagando já há algum tempo é nitidamente reacionário. De forma oportunista, os tecnocratas e os populistas fazem campanhas difamatórias contra adversários, utilizando a retórica do combate à corrupção, com o propósito de desmoralizar e descredibilizar a atividade política. A ideia é identificar uma figura messiânica, apontando-a como capaz de realizar uma “limpeza política”. E as vezes essa estratégia consegue enganar os incautos. O exemplo mais recente foi a eleição de um “outsider” para a Presidência da República em 2018.

Objetivam fazer com que a opinião pública passe a compreender que só alguém “fora do sistema” pode promover as mudanças que se fazem necessárias. O paradoxo discursivo praticado elegeu um carreirista da política, como se fosse um exemplo de exceção nas práticas de corrupção. Geralmente são personalidades doutrinadas para o exercício do autoritarismo, inimigos da democracia. A massa “online” é colocada como se representasse a manifestação da “vontade popular”, sem a compreensão de que a desilusão da política ajuda a corrupção prosperar. Afirmam-se na luta contra os corruptos, praticando a corrupção. Temos o exemplo contemporâneo da Operação Lava Jato.

A mídia tradicional cuida em cumprir o seu papel nesse intento, dando ressonância ao “grito de guerra” contra os progressistas, por eles chamados de “comunistas”. Hostilizam as políticas sociais para garantia dos privilégios das elites dominantes. Encontram um terreno fértil para o atendimento de seus próprios interesses, em detrimento do coletivo. O cinismo moralista é desfraldado como bandeira para conquistar os conservadores míopes.

O discurso antissistema ajuda o surgimento dos aventureiros. Nomes até então desconhecidos saíram das urnas para o Congresso, assembleias, alguns governos estaduais e prefeituras. Eles conquistaram mandatos ao se apresentarem como “salvadores da pátria”, como se fossem as pessoas certas nos momentos certos. Resultam de visões ideológicas ultrapassadas. Mas, felizmente, esse processo de despolitização tende a enfraquecer, quando vemos os que se proclamavam paladinos da justiça envolvidos em esquemas escusos e políticos eleitos democraticamente revelarem-se golpistas, tramando contra a democracia que os permitiu conquistar mandatos.

As polarizações odientas que o radicalismo ideológico estimulou, precisam ser combatidas para que possamos deixar de lado essa guerra cultural e busquemos estabelecer um ambiente de paz que nos ofereça a esperança de que há, sim, possibilidade de construirmos uma nação mais justa, mais solidária e menos desigual socialmente. É importante que construamos pontes entre os divergentes, promovendo o debate político responsável.

A democracia não funciona quando o discurso antipolítica se manifesta desequilibrando as disputas eleitorais. O ataque às instituições compromete o seu exercício, com o risco de que regimes autoritários se instalem. Não caiamos mais na falácia de alguns que se dizem “gestores e não políticos”. Não há gestão pública eficiente se for desconsiderada a dimensão da política com P maiúsculo.


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