Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

Cenas & Poesia


03/02/2015

Foto: autor desconhecido.

Para Débora Gil Pantaleão 

Semana Passada fui falar sobre literatura , poesia, escritos, no Espaço Mundo, no Centro da cidade, por ocasião do lançamento de um e-book – Se eu Tivesse Alma, da minha aluna Débora Gil, junto com a também professora Gláucia Machado, quem fez brilhantemente a apresentação No evento também tivemos exposição – Ilustra Se Eu Tivesse Alma, de outras meninas talentosas: Danielle Costa, Livia Costa, Priscila Lima Vanessa Cardoso e Paola Catherine, esta última também aluna trepidante. Tudo perfumado com jarrinho de flores, e velas. Num espaço charmoso, cheio de jovens, com música da Dj Kilt e performance e leitura os poemas por Murilo Franco. E gente a criar, percorrer, fazer, e botar a boca no trombone. Aplausos para quem faz a cultura acontecer off praia. Ocupa Pavilhão do Chá!

Fui buscar inspiração em três textos: “A Força do Poder Feminino” de Augusto Magalhães, março de 2012, no Jornal Contraponto; “Poesia Paraibana no século XXI – O que vem por aí, de Linaldo Guedes, (2012), e “As filhas de Anayde”, de Vitória Lima. E claro meus baús e pastas sobre Mulheres, Literaturas, Feminismo, Perdidos e Achados!

Quando Débora me convidou para falar, e me deixou livre para isso, mencionou um fato interessante. Que eu tinha sido a primeira professora que havia perguntado em sala de aula se alguém escrevia. E isso tinha arregalado os seus olhos. Nós professores não temos ideia, e temos sim, do poder que exercemos nesse espaço de troca – o da sala de aula. Hoje tenho sim consciência disso e tento fazer um bom uso. Lembrei de filmes que falam do poder de transformação de um livro: Balzac e a Costureirinha Chinesa, Clube de Leitura de Jane Austen, As Horas, só para citar alguns.

Débora foi uma aluna diferenciada e tenho certeza de que soube abocanhar conhecimento de tudo que viveu e estudou. E que bom que também tirou proveito das aulas e misturou tudo para expressar sua própria voz.
Falei também da Crítica feminista, da área de resgate, tão importante para ter dado visibilidade às escritoras esquecidas na ausência das mulheres nas artes em geral e na literatura em particular ao longo dos séculos. Virginia Woolf no seu ensaio “As mulheres e a ficção “, já dizia que, as mulheres sempre escreveram, mas os baús, os ventos, os costumes, a repressão, e o fato da sociedade ser masculina, se encarregaram de fazer esses escritos se perderem no tempo e nessas mesmas gavetas.

Mencionei Maria Firmina Reis e seu romance, Ursula (1859), e falei de Constância Duarte (UFMG); de Luzilá Ferreira (UFPE), Zahidê Muzart (UFSC) e Editora Mulheres, Ana Coutinho e Nadilza Moreira (UFPB) Professoras essas que trabalham na área. E contei que, quando vi a pesquisa de Ana Coutinho (Tese Doutorado – Resgate da Produção literária das escritoras paraibanas de 1888-1935), me surpreendi com alguns dos nomes que ela estudara: Analice Caldas, Adamantina Neves, Eudésia Vieira, Olivina Olivia Carneiro da Cunha, só para citar algumas. Conhecia parte dessas mulheres e nunca soube que escreviam. D Eudésia era vizinha da minha tia/madrinha Angelina Balthar; D. Adamantina, linda com seu coque e seus olhinhos claros, leu minha mão uma vez; e D. Olivina foi professora da minha mãe. Mulheres escritoras esquecidas que só depois de Anayde Beiriz, talvez tiveram seus nomes devidamente contemplados nos estudos acadêmicos. Nomes que não mais se bastavam com o lugar de musa, lugar esse entre o sonho e o devaneio, e sim, escaparam dessa armadilha para alcançar autonomia e voz. Pelo menos na escrita.

Muitos anos se passaram e hoje a Paraíba brilha com artistas das mais diversas áreas: Elba Ramalho, Marcélia Cartaxo, Soia Lira, Zezita Mattos, Marília Carneiro Arnaud, Maria Valéria Resende (Paraibana de coração), Suzy Lopes, Mercedes Cavalcanti, Eleonora Falcone, Eleonora Montenegro,Sonia Van Dijck, Regina Lira, Vitória Lima, Fidélia Cassandra, Violeta Formiga (in memoriam) e Débora Ferraz (uma outra Débora que com seu romance, Enquanto Deus não está olhando, ganhou o Prêmio Sesc, 2014)

Fiz menção também aos 13 nomes de mulheres ganhadoras do Prêmio Nobel de Literatura, que ao longo do século XX, nos brindaram com esse mais alto prêmio da arte da escrita, tendo nesses últimos anos nomes como Nadine Gordimer, Toni Morrison, Wislawa Szymborska, Elfriede Jeline, Doris Lessing, Herta Müller, e por último, a canadense Alice Munro .

E hoje esse mundão de formas de expressão escrita: (blogs, diários, sites, instalações, inserções, ilustrações, quadrinhos, ) e tantos temas outros, incluindo os eróticos, pornôs, vozes adolescentes – Gossip Girls, Girl Power , com seus slogans: Ain´t no wifey (não sou esposinha), ou supreme Bitch, ou ainda Fine Ass Feminist. Falar de sim, do corpo, dos desejos, de temas nunca dantes navegados, indo até às últimas consequências de usar o corpo como ferramenta militante e mostrar os peitos em forma de resistência à essa mesma exploração do corpo feminino, só que antes era tudo sob o olhar/gaze masculino.

Virginia dizia que o grande mistério estava em se saber o que entendemos por feminino, Elizabeth Badinter em seu livro Rumo Equivocado, constata que no Feminismo não houve ganhos, Há controvérsias. E Cassia Eller cantava na Malandragem que, estava cansada das meias três quartos, e que o príncipe virou um chato, e que vivia dando no seu saco…

Débora nos seus versos fala de: poeta caça, de seguidor, de rimas, alma, segredo. O que sou? A palavra não morre (Emily Dickinson?). O poeta que não veio, que foi pimenta, feita de chuva, de silêncio, que veio da melancolia, que acordou o poema com gastura…palavras, temas, conjunções, rimas, dissonâncias, experimentos com sons, com tudo, contudo, te sambo em trapos…, existe em mim uma voz que cala e outra que canta! ( e cantemos Ferreira Gullar. E Shakespeare!)

Aqui rompe, põe-se a caminho

Origina-se

A que caminho?

Débora acordou decidida. A seguir caminhos. Não faz poema como quem faz pão e faminta e necessária, como um dia o fez Violeta Formiga. Outros tempos. Agora faz poesia sem necessidade do pão, mas quem sabe da alma

Começou bem. Com a poesia. Se tem alma? No fazer da poesia com certeza terá caminhos a escolher, a perder, e novamente a escolher. E que siga em busca…

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa, 03 de fevereiro, 2014


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