Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

A “barriga” do jornal A UNIÃO


03/08/2015

Foto: autor desconhecido.

 

A manchete, com que o Jornal A União anunciou o nome do general que substituiria Médici na Presidência da República, provocou uma crise no governo do Estado. Ao invés de Ernesto Geisel, noticiou que o futuro presidente seria seu irmão, Orlando Geisel. A “barriga” (informação errada) cometida repercutiu em todo o país, sendo objeto de gozação pela mídia nacional.

Era de se esperar que o erro causasse aborrecimentos ao governador Ernani Sátyro, que se encontrava em Brasília naquele dia de junho de 1973. O constrangimento provocou uma reação que tentasse minimizar os efeitos de tão desastrada ocorrência. E foi o que fez.

Ao desembarcar em João Pessoa no dia seguinte, convocou à Granja Santana o secretário de divulgação e turismo, jornalista Noaldo Dantas. Acredito que não deve ter sido uma conversa agradável, pelo que se conhecia do temperamento do governador. O certo é que daquela reunião, o secretário saiu com a comunicação de que estava exonerado, assim como o superintendente do Jornal A União, Luiz Augusto Crispim, e Marcone Cabral, o editor chefe.

Segundo o governador, procurando justificar os atos de demissão, os competentes homens da imprensa paraibana foram afastados porque “o nome de um candidato à Presidência da República é fato de tamanha relevância que sobre ele não se pode equivocar um jornalista, ou uma pessoa de normal discernimento”. E acrescentou: “Falhou todo o pessoal responsável pela imprensa oficial. Quem não pecou por ação, pecou por omissão”.

Em nosso Estado, todo mundo sabia que nenhum dos três demitidos seria capaz de um ato intencional nesse contexto. Foram punidos porque o governador entendeu que devia uma satisfação aos chefes da ditadura militar, adotando uma medida severa que abrandasse a ira dos militares que comandavam nosso país.

A sindicância, que fora determinada pelo governador, para apurar responsabilidades, não conseguiu concluir pela indicação de quem teria sido o causador de tanta confusão. Atribui-se a um erro imperdoável ocasionado pela pressa em divulgar um fato importante, sem o cuidado de se certificar da confirmação do verdadeiro nome do militar indicado para a sucessão presidencial.

Noaldo Dantas,no entanto, era um homem tranquilo e não se alterou com a sua surpreendente exoneração do cargo de secretário, completando inclusive oito anos que integrava a equipe de auxiliares do governo do Estado. Ao sair do encontro com o governador, falou para os colegas jornalistas que “saía da mesma maneira que entrou, apenas com mais dívidas e a pé”, dando um toque de ironia ao acontecimento.

Noaldo foi substituído interinamente na secretaria pelo então chefe da Casa Civil Evaldo Gonçalves, até o mês de agosto, quando Otinaldo Lourenço assumiu em definitivo. E para a direção do jornal foi escolhido Luiz Ferreira.

Ernani, na hora da raiva, e movido pela necessidade de demonstrar firmeza na lealdade ao sistema, se viu obrigado a abrir mão da contribuição ao seu governo de três grandes e competentes jornalistas. Mas o episódio não lhe deixou alternativa, lamentavelmente!

• Integra a série de textos “INVENTÁRIO DO TEMPO II”.

 


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