No período da ditadura militar, o Brasil foi pródigo na produção de músicas de protesto. A dupla Ivan Lins e Vitor Martins foi responsável por várias canções que marcaram época, com letras que traduziam mensagens de estímulo à reação contra o regime, e de confiança na reversão do quadro de tensão e medo que o país viveu por mais de duas décadas. Em 1979, o Brasil passou a cantar “Antes que seja tarde” que se colocava como um apelo à felicidade, na esperança de que voltaríamos a viver a democracia, a liberdade.
“Com força e com vontade/A felicidade há de se espalhar/Com toda intensidade/Há de molhar o seco/De enxugar os olhos”. O espírito dominante era de crença em dias melhores, em que pesem as restrições impostas pelos ditadores. Então os autores da música falavam da necessidade da união de força e vontade para a luta. Só assim reconquistaríamos a felicidade. O sonho de ver a alegria se espalhando por todos os lugares de forma intensa. Umedecendo de alegria os olhos secos de sofrimento, como também permitindo o desaparecimento das lágrimas dos que choraram a morte dos seus entes queridos ou vivenciaram a dureza das perseguições, das torturas e injustiças praticadas pelo sistema.
“De iluminar os becos/Antes que seja tarde/Há de assaltar os bares/E retomar as ruas/Evisitar os lares”. A felicidade que se esperava, vinha dando luz aos locais mais obscuros, fazendo desaparecer tudo o que se fazia escondido. Que ela chegue de repente nos bares, onde as pessoas possam comemorar. Invada as ruas e os lares, contagiando a todos num sentimento único de contentamento.
“Antes que seja tarde/Há de rasgar as trevas/E abençoar o dia/E de guardar as pedras”. Urgia tomar atitudes, antes que fosse tarde demais, para que saíssemos da escuridão a que estávamos submetidos. Abençoar um novo dia cheio de fé e expectativa positiva, acreditando num futuro melhor para todo o povo. Recolher as pedras que machucaram tanto os brasileiros.
“Antes que seja tarde/Há de deixar sementes/No mais bendito fruto/Na terra e no ventre”. Não perder tempo na construção de um futuro em que germinassem as sementes ora plantadas. Seja nos frutos a serem colhidos na terra, seja na geração de novos brasileiros, que teriam a responsabilidade de fazer com que a felicidade seja sempre uma conquista nunca mais retirada da nossa vida pela vontade de tiranos de plantão.
“Antes que seja tarde/há de fazer alarde/E libertar os sonhos/Da nossa mocidade”. O mais rapidamente possível era preciso dar esse grito de liberdade, com coragem e destemor, contribuindo assim para que a juventude pudesse tornar realidade os sonhos e projetos acalentados com tanto entusiasmo.
“Antes que seja tarde/Há de mudar os homens/antes que a chama apague/Antes que a fé se acabe/Antes que seja tarde”. Precedia a necessidade de mudar os homens que governavam o Brasil, para que a chama da esperança não fosse se apagando. A fé energizando a luta, antes que fosse tarde demais.
• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.
