“Menina veneno”

Ritchie, cantor e compositor inglês radicado no Brasil, fez sucesso nos anos oitenta com a música “Menina veneno”. Composta, segundo ele próprio, em vinte minutos, num quarto de hotel em parceria com Bernardo Vilhena, tem em sua letra a narrativa de um encontro onírico, uma fantasia, algo que desejava que acontecesse. É de forte apelo sensual, mas há quem veja no seu conteúdo uma mensagem vinculada a práticas satânicas. Prefiro interpretá-la como uma canção romântica com insinuações eróticas.

“Meia noite no meu quarto/Ela vai subir/Ouço passos na estrada/Vejo a porta abrir”. O “eu lírico” vai elaborando o sonho, a partir da espera ansiosa do encontro com a mulher desejada. “Meia noite” é uma hora tida nas estórias e contos como o momento das transformações, principalmente nos relatos de terror. Não é o caso, esse encontro se prenuncia intenso de prazeres. Ouve, com o coração batendo forte, os passos dela em sua direção e enfim a porta se abrindo.

“Um abajur cor de carne/Um lençol azul/Cortinas de seda/O seu corpo nu”. Convenhamos que o cenário construído não é muito adequado para um acontecimento de uma noite de amor. “Abajur cor de carne”? Muito estranho. Bom, mas o dono da fantasia não sou eu, (kkkk). O quarto pronto para receber o “corpo nu” que ele tanto quer.

“Menina veneno/O mundo é pequeno demais pra nós dois/Em toda cama que eu durmo/Só dá você, só dá você, só dá você”. Já tem o codinome que revela toda a peçonha de um animal que pode matar, ou então causar consequências indeléveis, “menina veneno”. Na sua obsessão ela se faz presente todas as noites onde ele esteja em qualquer cama que repouse. O mundo se torna pequeno para os dois.

“Seus olhos verdes no espelho/Brilham para mim/Seu corpo inteiro é um prazer/Do princípio ao sim”. No seu devaneio quer que a mulher tenha os olhos verdes, como se essa cor tivesse um poder maior de sedução, de encantamento. Exercendo um efeito hipnótico sobre ele. No seu corpo o êxtase, o clímax da relação, o gozo pleno, sem fim.

“Sozinho no meu quarto/Eu acordo sem você/Fico falando pras paredes/Até anoitecer”. Ao despertar do sonho, cai na real, se vê solitário no quarto. Procura e não a encontra, e seu diálogo passa a ser com as paredes, até que novamente anoiteça e volte a sonhar.

“Menina veneno/Você tem um jeito/Sereno de ser/E toda a noite no meu quarto/Vem me entorpecer, me entorpecer/Me entorpecer”. O perigo tem a face da doçura, muitas vezes. Ele surge do que aparentemente é sereno, calmo, tranquilo. É assim que a “menina veneno” se apresenta. Todas as noites o efeito do encontro que o faz desfalecer.

“Você vem não sei de onde/Eu sei vem me amar/Eu nem sei qual o seu nome/Mas nem preciso chamar”. Claro que ele não sabe de onde ela vem, nem como ela se chama, porque tudo é produto de uma fantasia, um desejo. Não há necessidade de ser chamada, a sua própria imaginação a traz sem que precise convidá-la.

• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.

 

 

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