O paraibano Luiz Ramalho conseguiu a segunda colocação no Festival da MPB da Rede Globo, em 1980, com a música “Foi Deus quem fez você”, interpretada por Amelinha. A canção estourou nas paradas de sucesso em todo o país, permanecendo em primeiro lugar por vários meses. É uma declaração de amor. Um poema apaixonado de veneração à mulher amada.
“Foi Deus que fez o céu/O rancho das estrelas./Fez também o seresteiro/Para conversar com elas.” O compositor começa admirando e agradecendo a Deus ter criado o céu e as estrelas que inspiram os poetas. O seresteiro tem o dom de cantar a beleza de uma noite estrelada, como se conversasse com o piscar luminoso que ornamenta o infinito na escuridão. É uma sensação de intimidade com o divino, com o mundo desconhecido do universo.
“Fez a lua que prateia/Minha estrada de sorrisos./E a serpente que expulsou/Mais de um milhão do paraíso”. Deus ofereceu o luar para dar claridade aos nossos caminhos, fazendo-nos sorrir de contentamento. Mas igualmente colocou armadilhas para a humanidade, criando a serpente, simbolizando o perigo e a sedução para o risco de comportamentos inadequados. No paraíso essa serpente fez o homem cometer seu primeiro pecado, o que a Igreja Católica chama de “pecado original”, e isso penalizou a todos nós de forma coletiva. Fomos expulsos do paraíso.
“Foi Deus quem fez você;/Foi Deus que fez o amor;/Fez nascer a eternidade/Num momento de carinho”. Mas para o poeta Deus se esmerou quando fez a mulher amada. E para torná-la mais cativante e sedutora fez o amor, responsável pela magia do sublime prazer de estarem enamorados. O “momento de carinho” permite uma impressão de que tudo aquilo é eterno, nunca terá fim.
“Fez até o anonimato/Dos afetos escondidos/E a saudade dos amores/Que já foram destruídos./Foi Deus!”. Amantes ocultos não têm nomes, são anônimos para que não sejam expostos à curiosidade e maledicência dos invejosos. Deus, com todo seu poder, também faz com que perdurem saudades de amores que se foram destruídos pelo tempo e pelos desencontros da vida.
“Foi Deus que fez o vento/Que sopra os teus cabelos;/Foi Deus quem fez o orvalho/Que molha o teu olhar”. E Deus, na imaginação do compositor, faz com que os cabelos da sua amada fiquem mais lindos esvoaçando com o soprar do vento. E o seu olhar mais terno, graças ao orvalho que molha seu rosto, dando ao seu semblante uma aparência de meiguice e enternecimento.
“Foi Deus que fez as noites/E o violão plangente;/Foi Deus que fez a gente/Somente para amar. Só para amar”. Termina o poeta agradecido a Deus pela criação das noites que embalam o canto dos artistas, ao som de um violão que chora por amor. Afinal foi Deus “que fez a gente”, como se fôssemos destinados unicamente para o amor.
• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.