Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

“Tá combinado”


22/07/2014

Foto: autor desconhecido.

Três dos maiores nomes da MPB, Caetano, Ivete e Gil, juntaram-se em 2011 para um show especial, e gravaram ao vivo um álbum onde encontramos a música “Tá combinado”, de autoria do primeiro. Na letra o “eu lírico” se revela vivendo um amor proibido, que começou numa brincadeira, mas que não se surpreenderá se tudo transformar-se numa verdadeira história de amor.

“Então ta combinado, é quase nada/É tudo somente sexo e amizade/Não tem nenhum engano, nem mistério/É tudo só brincadeira e verdade”. O casal sabe que vive de encontros casuais, fortuitos. Não existe, de parte a parte, qualquer cobrança. A relação, ainda que mantida sob a chama da atração sexual e da sedução compartilhada, não pode ainda ser levada a sério. Tudo começou numa brincadeira perigosa, sem que fossem medidas as consequências, determinadas pela sensualidade. Não há engano na realidade vivenciada. Não há nada que possa ser considerado mistério nesse envolvimento, eles se entendem perfeitamente. A realidade com gosto de divertimento.

“Podemos ver o mundo juntos/Sermos dois e sermos muitos/Nos sabermos sós sem estarmos sós/Abrirmos a cabeça/Para que afinal floresça/O mais que humano em nós”. Nesse enlevo querem viver juntos o mundo de prazeres que construíram. Serem um par, mas ao mesmo tempo, se multiplicarem em personagens que permitem tornar o relacionamento cheio de novidades, sem regras predeterminadas, fugindo do tédio e das mesmices do cotidiano. Se sentirem sozinhos, na hora em que estiverem um com o outro, embora sabendo que o universo em que vivem não está ali, existe uma vida lá fora em que outras pessoas se fazem presentes nas suas vidas. O que interessa é se concentrarem nos instantes de entrega total e deixarem que os sentimentos, os desejos, as sensações de êxtase, surjam de forma intensa.

“Então tá tudo dito e é tão bonito/E eu acredito num claro futuro/De música, ternura e aventura/Pro equilibrista em cima do muro”. Ainda que tenham se entendido, mesmo que ambos compreendam a situação fora dos padrões normais que experimentam, apostam que a vida em comum, será de satisfação, entusiasmo e alegria, como quem se delicia ouvindo uma música do seu agrado, se enternece com a troca de carinhos ou se joga numa aventura que produz deleite, realização de fantasias. Têm consciência do risco que correm, na sensação nervosa do equilibrista que faz todo o tipo de malabarismo para não cair.

“Mas e se o amor pra nós chegar/De nós, de algum lugar/Com todo o seu tenebroso esplendor?/Mas e se o amor já está/Se há muito tempo que chegou/E só nos enganou?”. De repente a pergunta que não quer calar: e se forem despertados pelo amor verdadeiro? Se ele chegar com toda a sua força ameaçadora e igualmente cheia de deslumbramento? Ou será que estará adormecido nos corações, sem que se perceba, confundindo os sentimentos e as emoções?

“Então não fale nada, apague a estrada/Que seu caminhar já desenhou/Porque toda razão, toda palavra/Vale nada quando chega o amor”. Quando as evidências apontarem para a chegada do amor real, em toda a sua plenitude, melhor não falar nada. O mais prudente é ignorar os projetos, os sonhos até então acalentados, porque o amor ao se revelar não respeita o racional, nem palavras de conselho ou de advertência. Então tudo muda.

• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.


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