Reginaldo Rossi, com o seu jeito irreverente, conquistou o público brasileiro, em especial o nordestino. As suas canções falam de sentimentos vivenciados por todos nós no dia a dia: paixão, ciúmes, decepções, angústias, desejos, saudade, prazeres, felicidade, conquistas, etc. Tornou-se o “rei do brega” romântico. Em 1987 lançou a música que se colocaria como a mais pedida do seu repertório: “Garçom”. Os bares são cenários de convivência alegre entre amigos, confraternização, comemorações, mas também é o refúgio de muita gente quando está passando por momentos de dores da alma, amarguras, frustrações, desilusões, traições. Nesta canção o “eu lírico” desabafa com o garçom a sua tristeza de ver a mulher amada lhe deixando para se casar com outro.
“Garçom! Aqui!/ Nessa mesa de bar/Você já cansou de escutar/Centenas de casos de amor”. Convida o garçom a ouvir o seu lamento. Entende que aquele que escolheu como seu confidente já testemunhou muitas situações parecidas. Na mesa de um bar as lamúrias se manifestam de uma forma mais emocionante e dolorosa, talvez pelos efeitos etílicos. A bebida faz com que desapareça a vergonha de falar o que se sente e o acanhamento de se mostrar um sofredor, revelando para um estranho o que se passa na sua intimidade. Os garçons são ouvintes pacientes dessas manifestações.
“Garçom!/ No bar todo mundo é igual/Meu caso é mais um, é banal/Mas preste atenção, por favor.” O “eu lírico” insiste em chamar a atenção do garçom para a sua história, mesmo sabendo que nada de extraordinário ou diferente vai falar para ele. Será apenas mais um caso, igual a tantos outros que ele já conhece. No entanto, precisa ser ouvido. Necessita de alguém a quem possa derramar seu pesar. Quer dividir com outra pessoa o seu desgosto. Imagina que isso possa amenizar a sua dor.
“Saiba que o meu grande amor/Hoje vai se casar/Mandou uma carta pra me avisar/Deixou em pedaços o meu coração”. Estava ainda curtindo a desagradável surpresa da informação que recebera há pouco. O seu grande amor, por carta, comunicava que iria se casar. Era como se o mundo houvesse desmoronado. Sentiu seu coração despedaçado e por isso estava ali afogando o seu pranto na bebida, como se a embriaguez pudesse fazê-lo esquecer da notícia que lhe chegara.
“E pra matar a tristeza/Só mesa de bar/Quero tomar todas /Vou me embriagar/Se eu pegar no sono/Me deite no chão”. Decidiu fazer do botequim seu abrigo nesse momento de melancolia. No garçom esperava a solidariedade nessa hora e já adiantava que seu propósito era ficar ali até perder a condição de sobriedade e lucidez. Quando o sono o abatesse, podia colocá-lo deitado no chão, sem problema, porque ali, bebendo ou dormindo, passaria esse seu instante de infortúnio.
“Garçom! Eu sei!/Eu estou enchendo o saco/Mas todo bebum fica chato/Valente, e tem toda a razão”. Tem a consciência de que todo bêbado se torna chato nas suas conversas. Sabe que isso pode irritar as pessoas que estão lhe ouvindo. No entanto, o garçom é um profissional habituado a lidar com esses personagens que frequentam os bares da vida. Sabe administrar os impulsos dos que se julgam valentes e compreender os que se acham donos da verdade. Então, não poderia encontrar local mais apropriado para revelar toda a sua decepção.
“Garçom! Mas eu!/Eu só quero chorar/Eu vou minha conta pagar”. Não quer fazer outra coisa a não ser chorar, sentindo a intensa dor da perda, com a certeza de que a mulher que ama já está com outro de forma definitiva, vai se casar. Mas tranquiliza o garçom, não deixará sua conta sem pagar. Até porque foi nele que encontrou amparo, audição, companhia.
Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.