Geral

Vida Simples


12/07/2011



 
Para Teca, minha irmã, aniversariante da semana, quem já me possibilitou viagens inesquecíveis.

Vendo as colunas da Acrópolis na Grécia literalmente caindo, depois da Irlanda, Portugal e agora Itália, o mundo desabando em dívidas, e nós indivíduos também, fico a pensar de como a vida era simples.

Na minha adolescência vivia a ouvir meus pais falarem a mesma coisa. Minha mãe dizia: “No meu tempo, eu só tinha um vestido no ano, para missa e Natal..A mesa era tão singela – carne de charque com bolinho de farinha!” E eu não me sentia culpada , mas feliz de ver tanta abundância à nossa mesa.

Hoje, me pego repetindo a mesma coisa, e me policio para não cair na chatice de: No meu tempo…tudo de novo.

Mas, no meu tempo…a vida era pobre! Lembro de quando casei, o enxoval tinha um tamanco Dr. Scholl, um Kafka Roxo, pouca roupa de cama, uma mesa de feira, 4 tamboretes, 4 flores de papel crepon de cores vivas, uma estante azul Royal repleta de bonequinhos de Vitalino, cadeiras vermelhas de palhinha da Nêga Fulô, e muitos quadros pelas paredes. E ponto. Nem telefone tinha. Mas almofadas hippies no chão e uma foto de Che Guevara no quarto. Militante não! E cantava caminhando e cantando…e Alegria Alegria! Ponteio!

Fui à Nova York em 1977 por uma semana. Estava há dois meses nos States em New England e na Universidade de Yale. Tempestades de Neve, temperaturas a 25 graus negativos, e nós a passearmos incrédulos diante de natureza tão adversa. Nova York era passeios, Greenwich Village, jovens fumando maconha na rua, Soho, Musicais: Bubling Brown Sugar e Chorus Line; lojas de arte muitas, e perdidos por entre pincéis e papéis especiais, crayons, nanquins, pastéis; e eu, por entre bijoux: brincos e colares. Central Park e um artista fazendo mímicas. Tirei fotos preto no branco, que até hoje ilustram minhas paredes. E de calça jeans e um par de tênis, perambulei pela 5ª, 6ª, e tantas Avenidas enumeradas…Sem coragem de subir no Empire State (ainda não tinham as Torres Gêmeas).

Nesse tempo, não tinha nenhum I Pad alguma coisa; nem cosméticos; nem M.A.C. para eu me perder nos batons e cremes; nem me ligava em perfume nem Dior, nem Dolce Gabbana, nem marca nenhuma. Estava interessada somente em sentir o cheiro da mega metrópoles, ir aos museus (Guggenheim ) e outras exposições; em ouvir e ver a arte pelas ruas e me sentir cidadã do mundo.

Hoje, não posso ir à Nova York. Precisaria de um bilhão de dólares para comprar o meu desejo…e de um ano, para saciar minha fome cultural que vejo nos filmes de Woody Allen, ou simplesmente na viagem dos famosos. Visitar os Outlets…, assistir a todos os musicais; noitar pelos jazz clubs; e dar conta de todos os lugares cults que Pedro Andrade enumera no Manhattan Connection todos os domingos. Sim, e provar também todas as delícias também por ele saboreadas. Mas acima de tudo, vagar à beira do rio Hudson, nas alamedas de New York New York, com cenário em branco e preto, com música de fundo de Gershwin, Night and Day para começar!

Nessa impossibilidade consumista, preferível pequenos prazeres, viagens mínimas e roteiros exóticos e aconchegantes, onde o grande barato não são as compras, mas a paisagem, ou os recantos, ou a História, ou o perfume da gastronomia, e pequenas lojinhas, onde souvenirs fazem a festa.

A vida hoje é caríssima: Camas Kings e louças Queens!; roteiros cinematográficos; todas as tecnologias ao alcance e sempre renovadas pelo último modelo; muitos cremes e shampoos para cada ocasião; maquiagem diversas com brilho e opacidades; perfumes cítricos , amadeirados e florais; telas planas, curvas, côncavas e convexas; aplicativos todos: essa é a questão! E tantas outras coisinhas miúdas para música nenhuma de Roberto Carlos dar conta. E eu não dou conta de tanto consumo. E quando penso que estou me organizando, lá vem outra bomba de liquidação! Paraíba liquida! Shopping Liquida! Arezzo liquida! E já não tenho tantos pés para calçar o que o mercado dita.

E sem querer ser nostálgica nem falar do meu tempo, me pego confusa e cansada de fazer tantas contas; de viver no vermelho; de estar sempre em dia. E olha que estou sempre a jogar merda no ventilador. E não estou em dia com nada; não ando na moda; não tenho aplicativos, e quando estou crente que abafo nos aprendizados digitais, percebo que já virei peça anacrônica ….e minha sobrinha de 8 anos me dá um caldo! Não nasci com chip e chipless serei pelo andar da carruagem.

Quanto à Nova York? Vai ter que esperar, pois meus planos estão mais para os países quebrados: Azulejos de Alfama; comer Moussaka em Athenas; ou vinho Chianti na Toscana, e ainda uma Guiness nas terras de Joyce; ou tomar um cream tea na Cornuália, lembrando de To the Lighthouse e das palavras de Virginia Woolf, ou simplesmente passear em Penarth, ou Temby (Gales), junto com minha irmã Teca, lugares que ainda me possibilitam perambular sem stress e sem necessariamente comprar a última palavra do consumo Louis Vuitton . No caso, o estado de êxtase fica por conta dos estados d´alma, do canto das gaivotas ou simplesmente dos momentos surpresa, que a vida de viajante possibilita.

Adiamos! Pois “Na vida , nada é simples” (fala do filme Fale com Ela, Almodóvar)

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa, 12/07/2011



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