Geral

Eleonora & Lourdes


13/03/2012



 Se alguém ´é´ uma mulher, isso certamente não é tudo o que esse alguém é . (Judith Butler)

Esta semana, estiveram aqui em João Pessoa, a Ministra da Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres (SPM) da Presidência da República, Eleonora Menigucci e a sua vice, Profa Lourdes Bandeira. Vieram lançar linha de crédito para mulheres, para que possam enfrentar as desigualdades de gênero no trabalho.Duas mulheres feministas, poderosas, que sempre estiveram à frente das lutas das mulheres, fosse na saúde ou na Academia e pesquisas sobre Violência contra à Mulher, e que hoje legitimadas e autorizadas representam o que Rose Marie Muraro, chamou de “Nova Ordem Simbólica” nos espaços políticos, não mais centrados no Falo (o poder, o matar ou morrer que é a sua lei), mas uma nova ordem que possa permear desde o inconsciente individual até os sistemas macroeconômicos, mas agora estruturada sobre a vida.

Quem não viu na posse de Dilma, quando a Presidenta se referiu à amiga Eleonora, dos tempos de prisão, quando dividiram a mesma cela, durante os tempos negros da ditadura. Eu mesma fiquei de peito cheio de orgulho.
Conheci essas duas mulheres, primeiro de longe. Ouvia falar de uma, com seus cabelos naturalmente encaracolados sem medo de botar a boca no trombone; e da outra, professora universitária, sempre à frente das discussões acadêmicas ou não, igualmente com a boca nos mesmos trombones… e sempre sobre assuntos que me instigavam.

Eram os anos 80; tempos em que eu era funcionária da Reitoria, um período pessoal de entre-lugar entre recém-separada e solteira novamente, me adaptando à uma condição estranha, e só me interessava por festas, bares, liberdade e descompromisso. Fugia de tudo o que me exigia. E vivia a borboletear! Dores e delícias de rompimentos e buscas de identidade, não me deixavam comprometer com causas, mas vivê-las. O casulo me esperava, para mais tarde re-nascer em outros tempos: Viver sem Tempos Mortos, como já dizia Simone de Beauvoir, quem sabe era o meu desejo. Mas, flertava com o Maria Mulher, e jamais esquecerei algumas conversas nas areias de Baía Formosa, com a poetisa morta Violeta Formiga. Ocasião em que li Rose Marie Muraro, e fui vê-la pessoalmente numa palestra emocionante nos auditórios do CT. O meu sentir feminista se modulava e ganhava corpo físico e subjetivo.

Os anos passaram, e cheguei perto dessas mulheres. Eleonora através do Forum Feminista e do Grupo Lílás, embrião do Cunhã Coletivo Feminista; e Lourdes também nesses mesmos espaços, e nas pesquisas do Núcleo de Documentação e Informação Histórica Regional – NDIHR da UFPB, onde tive a honra de fazer parte de uma de suas pesquisas. E conversa vai conversa vem, quando dei por mim, estava fazendo a disciplina da pós com Eleoonora, sobre Foucault e as forças dos poderes imprisionadores das instituições, sexualidade, poder x conhecimento, e plena de curiosidade, me perdia nas palavras e nas coisas…

E de palavras e coisas, cheguei a comer biscoitos amanteigados, no terraço de Lourdes Bandeira, na Av. Nego. Admirava a transgressão Eleonora e a assertividade gaúcha, com sotaque mais que sullllllll, da Lourdes. E uma vez perguntei à Lourdes a que horas ela fazia aqueles biscoitos deliciosos. E ela banalmente: “sábado à tarde!” E acordava às 5 para ler teses, etc. Era o meu paradigma de eficiência, já que tinha 3 filhos pequenos/pré-adolescentes, para criar, casa, e uma carreira brilhante. Eu, na minha displicência avoada de mulher que só queria as noites e o mundão, me espantava com a disciplina, compromisso, comprometimento, engajamento daqueles seres, que me faziam admirar. Eu etérea, me queria terrena, inspirada por essas guerreiras, que até hoje me fazem dançar de alegria só de vê-las.

Um belo dia, sem me perceber, estava eu, junto com Leo, em Alagoa Grande, falando para as mulheres rurais. Eu, tão urbana, com tão pouco o que dizer para as mulheres do mato, estava lá, impulsionada por Leo que em tudo vibrava, em tudo era entusiasmo e questionamento. Uma aula!

Final dos anos 80/90 foram muitas reuniões com as duas e mais Sandra, Lucinha, Soraia, Gilberta, Estelizabel (hoje candidata à Prefeita), para depois vir a ser formado o Grupo Cunhã. Tardes inesquecíveis de aprendizado e ações pessoais/coletivas afirmativas.

Jamais esquecerei uma certa viagem a Recife junto com Eleonora, que tanto no meu terraço, quanto nos espaços subjetivos privados, sempre com aqueles olhos azuis arregalados, me impulsionava, me respondia e me acariciava de solidariedade e compartilhamento, às minhas dúvidas, caminhos, e escolhas.

Ah! O destino e a vida! Um dia, um acidente. Uma tragédia. Mortes. Perdas & Danos. A irreversibilidade das estradas da vida. Bete Lobo. Penha. E o choro de todas nós. Juntas. Eu estava grávida de 4 meses do meu filho Daniel (hoje com 20 anos), e tinha jantado com Bete na véspera. Com Penha? Sempre nos eventos do PT, das mulheres, no jardim da casa de Edinalva, hoje uma estrela brilhante. E talvez essa consciência, e essa solidariedade feminina, deu força às mulheres e à Lourdes pessoalmente, para que a vida fosse mais importante. E foi. Superação! Vejo-a hoje brilhando na TV, nas pesquisas, na vida, e agora novamente com Eleonora. Uma dupla de mulheres-amigas, se não maravilha, mas de competência, de empoderamento, a nos representar tão fortemente, tão docemente.
Esta semana estivemos juntas. Todas. Maria mulheres. Cunhãs. 8 de Marços. Amigas avulsas. Queridas. Uma mesa gigante. Falas emocionadas. Resgates. Homenagens. Brindes. Abraços feministas. Saudades. E tantas felicidades. Até um par de suspensórios apareceu – um descuido de percalço, e o masculino bendito entre às mulheres!

Ao final, Vitória Lima levou suas fitinhas Fúcsia, com poemas seus sobre as penugens dos jambeiros, para que, com essa cor, desejássemos sucesso à essas mulheres lindas e maravilhosas. E que a Secretaria brilhe e avance, foi o que todas nós, na algazarra da alegria feminina/feminista/cidadãs, brindamos.

Desejo à Eleonora e Lourdes, e tantas outras mulheres que ocupam cargos ou não, que:


“Use seu amor além dos bons instintos para saber quando rosnar, quando atacar, quando aplicar um golpe violento, quando matar, quando recuar, quando ladrar de madrugada. Para viver o mais próximo possível da força espiritual selvagem, a mulher precisa sacudir mais a cabeça, ser mais exuberante, ter mais faro na sua intuição, ter mais vida criativa, enfiar mais a mão na massa, ter mais solidão, ter mais companhia de mulheres, levar uma vida mais natural, ter mais fogo, elaborar mais as palavras e as idéias. Ela precisa de maior reconhecimento por parte das suas irmãs , de mais sementes, mais rizomas, mais revolução na vizinhança… Mais grupos de costura terroristas e mais uivos. Muito mais canto hondo, muito mais canto profundo.
Todas nós podemos afirmar pertencer ao antigo clã das cicatrizes, ostentar orgulhosas as marcas de combate do nosso tempo, escrever nossos segredos nas paredes, não aceitar sentir vergonha, abrir o acesso à saída. …Portanto apareça. Apareça onde quer que esteja. Deixe pegadas fundas porque você pode fazer isso. Tenha coragem e a paciência da mulher na história do urso da meia-lua, que aprende a ver além da ilusão. Não se distraia queimando fósforos e fantasias….Colha os ossos dos valores perdidos e cante para devolvê-los à vida. …As filhas das filhas das suas filhas irão provavelmente lembrar-se de você… Queixe-se ao luar, apure os ouvidos, perambule nos intervalos, faça amor, uive sempre!”

(Trechos de Mulheres que Correm com os Lobos, Clarissa Estés Pinkola)

Salve as Mulheres que Correm com os Lobos! Salve Eleonora e Lourdes

Lista de Chamada: Salve Vitória Lima, Joselita, Neiliane Maia, Ana Maria Farias, Gilberta Soares, Estelizabel, Lúcia Guerra, Iara Matos, outra Lúcia, Soraia, Naka, Irene, Walquiria, Jandira, Zenia, Rosa Godoy, Glória Rabay, e Eu! só para citar algumas das presentes. Faltou? Dos Anjos e Sarita! Ausentes? Edinalva, Violeta Formiga e Tantas outras.

Ana Adelaide Peixoto, João Pessoa 13 de março, 2012



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