Geral

Águas de Valência


31/07/2012

Para Juca, que continue a ter o sucesso que merece.

Foi um rio que passou na minha vida…

A cidade espanhola de Valência, é atravessada pelo rio Turia. Nada de novo se o mesmo não tivesse inundado a cidade nos idos dos anos 50, tendo assim, seu curso desviado e hoje, se revelar um grande parque, seguindo e seguindo, onde ninguém pode se banhar duas vezes, mas andar, à pé, de bike, em estado de correria ou de contemplação. Eu fiquei com o segundo.

Desajuno ou Almuerzo: com alcachofras; pão com tomates maduros fritos; chouriços todos e huevos huevos huevos! Águas de Valência; Horchata (bebida leitosa feita de um tubérculo); Gaspacho (sopa fria com ervas deliciosa); Sangria, mojito, montaditos, frutas secas, queijos, pixton, Paella Valenciana; arroz negro e Cavas; Jamon Jamon – Ibérico, Serrano….Sítios históricos; avenidas largas; igrejas centenárias, Mercado repleto de guloseimas mediterrâneas, tudo em contraste com o Parque das Ciências e das Artes – arrojo, arquitetura, e arte.

Valência, cidade com história milenar (La Lonja – construção gótica e monumento histórico artístico nacional e patrimônio da Humanidade da Unesco); Plaza de Ayuntameiento, El Miguelette, Torre de Serranos), dividindo a cidade entre o sítio futurista, com o tempo passado, tudo em harmonia e respeito. A convivência entre cidade antiga e cidade moderna tem seu charme em proporções estonteantes, o que faz de Valência, uma cidade dos contrastes, e no caso do moderno, a cada vez que passava pelo Oceanário (onde, com forte cheio de sargaço e meio zonza dos tubos, túneis e engenharias, vi peixinhos coloridos, orcas, pinguins e tubarões, passeando por cima da minha cabeça); pelo Museu de Las Ciências Príncipe Felipe, em forma de espinhas; a Casa-Ópera em forma de olho, e de tantas tantas outras formas gigantes, projetadas e representadas pela engenharia lunática e desafiadora do homem, pude sentir no meu olhar de êxtase e assombramento: surpresa, silêncio e reverência.

Experimentei dessa cidade belíssima por ocasião de acompanhar Julio Rafael, superintendente do Sebrae, por ocasião do curso: “Métodos e instrumentos para o planejamento integrado sob a visão do desenvolvimento sustentável”, curso esse que marca o início do diálogo e intercâmbio entre o Sebrae e a Universidade dessa cidade, na pessoa do Dr. Joan Nogueira Tur, Director Del Instituto Interuniversitário de Desarrollo Local, y diretor do curso mencionado, realizado entre 15 e 22 de julho 2012, onde juntos tocarão uma empreitada grandiosa de troca de saber e fazer, no sentido de: Qualificar o Sebrae para uma política de desenvolvimento local.

Oportunidade rara, pois, uma vez também convidada a participar do curso, pude ser turista acidental solitária durante o dia, e nos intervalos, participar das atividades culturais, tendo a alegria de re-encontrar uma amiga de infância das Lourdinas – Betânia Leite Ramalho, hoje Secretária de educação de Natal, e Maria Eulina Carvalho, colega também de infância e hoje da UFPB, pós-doutoranda nessa Universidade.

Ressaltaria o passeio à Gandia, cidade próxima, com praias turísticas à beira das águas cor de anil do Mediterrâneo, e ao acontecimento de encerramento, num edifício restaurado da Universidade antiga de Valência, com direito à homenagens ao trabalho de coordenador do projeto, Julio Rafael, e ao concerto – Coro de Mujeres A Cau d´Orella, que naquele momento, diante da beleza de uma igreja secular, onde os anjos disseram amém por tantos séculos, pudemos desfrutar do som angelical da Harpa de Úrsula Segarra, e da força do canto feminino, sob o comando da Directora Mònica Perales i Massana. Em seguida, Coquetel com caviar, montaditos especiais, iguarias,e cavas e vinhos, fizeram a parte lúdica, no meio à diplomas, discursos, e good-byes. No largo lá fora, o verão europeu fervia com sua brisa fresca dos longos dias (anoitecia às 23 horas), o que deixava o tempo com uma outra dinâmica.

Aliás, o tempo de viagem é outro mistério. O tempo do sonho. O tempo em suspensão. Fuso horário de 5 horas à frente, levamos um tempo para nos adiantarmos, para depois, nos atrasarmos novamente. E como não somos relógios, nem ponteiros, nem sinos (que aliás, badalavam a cada hora….), experimentamos do sono, da siesta, e de um pouco de des-locamento espacial e temporal. Des-orientação essa que, também se dava pelo fato da luz do sol esticar noite adentro. Nós dos trópicos, temos o tempo tão bem delineado, e a duração dos dias , das 6 às 6, faz com que o nosso lusco-fusco nos oriente ao anúncio da noite. Lá, sem essa luz-guia-solar, nos confundia dia-noite-dia, e claro, ficávamos perplexos, des-orientados por tempos e tempos, viajando literalmente no calor das horas.

Mas, o ponto alto de Valência, foi visitar O Parque Nacional de Albufera, uma paisagem emblemática de grande valor econômico e ambiental; posto esse de córregos, riachos, arrozais, entrepostos, lagos, pântanos, e alagados. E num barco grande, lá íamos nós, conduzidos por um Ishmael Valenciano, que tinha no seu cão de guarda, um cachorro muy simpático e inteligente, a missão de latir, rosnar, rodear o barco, e se alvoroçar quando à beira parávamos. O por do sol se impunha no horizonte em tons magenta, e, uma fresca mais fria nos arrepiava. Quando dei por mim, estava no meio de um lago gigante, cuja travessia demoraria uma hora, e o relógio marcava 10 da noite. Eu, com meus pânicos de água, de barco, e de travessia, me enrosquei na echarpe, e finquei o olhar na outra margem do rio, esperando que o conto do mesmo nome e seu autor, me distraíssem com a luz fúcsia da penumbra, sonhando com o que nos esperavam do lado de lá.

Ufa! Quando enfim “estacionamos”, vi um lugarejo campestre e longínquo, com pescadores sentados em volta da praça a jogar baralho, vozes cortando o silêncio da noite, que já alta…nos guiava. El Saler, um restaurante lindo e típico, nos esperava em noite de gala.

E por entre azulejos e simpatias, nos acomodamos, para logo depois começar um desfile de iguarias: bacalhau, mexilhões gigantes e saborosos, azeitonas temperadas, pães deliciosos, anchovas, e enguias ensopadas, que eu claro, passei. Boat is boat, enguia is enguia (Cobra! Do mar é verdade, mas cobra!) Jamais esquecerei do filme O Tambor (1979), adaptação do livro homônimo Guther Grass, onde, numa cena de arrepiar, alguém comia enguias inteiras e vivas….! Quem teve a audácia de se arvorar na delícia…, garantiu que valeu à pena. Deixa estar!

Fomos no primeiro andar do restaurante-casa, para ver seu dono a maestrar três panelas gigantes de Paellas: Uma valenciana legítima (com os sabores do frango e do coelho); outra de frutos do mar, e outra de arroz negro. Tudo em ritual: hora de mexer, de por o açafrão, de pingar, de tirar, de soltar, e de servir. Confesso que mergulhei inadvertidamente nas três. Quando se trata de experimentar coisas e comidas, sou selvagem! E entre um gole de vinho, e uma garfada dos arroz que tinha acabado de ver nas águas, e os cheiros de peixes e pescados variados, brindamos a tudo. Olé!

E ao fim de tantas coisas, sabores, cores e aprendizados, é chegada a hora das despedidas. Todos se foram, e eu, andarilha sempre querendo mais, botei a Plaza de La Reina no bolso, e me danei num trem bala para Madri, onde por 6 dias, me perdi e me achei, completamente solitária, por entre História Madrileña, manifestações políticas contra El gobierno, mais sangrias, mais artes nos museus, mais Paellas, dança Flamenga, e mais tempo suspenso. Assuntos para o próximo texto.

Olé!

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa, 31 de julho, 2012



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