Futebol

Vou dormir sem comida’, diz haitiano de time do Acre rebaixado à Série D

Série C


01/11/2013

Innocent Olibrice, 26 anos, saiu do Haiti em busca de um futuro melhor no futebol. Há dois anos ele mora no Acre e, desde então, tenta se firmar em um dos clubes profissionais do estado. Em 2012, treinou nas equipes do Plácido de Castro, do interior, e no Juventus, da capital. No ano seguinte, Innocent mudou de ares e passou a treinar no Rio Branco, rebaixado para a Série D do Campeonato Brasileiro. A partir daí, o que ele pensava que seria um alameda de flores, transformou-se em um longo e tortuoso caminho de espinhos.

O jogador conta que desde março está com os ligamentos do joelho direito rompidos, lesão que teve durante treinamento do Estrelão, e ressalta que o clube se responsabilizou pelo exame. Porém, após quase oito meses, ainda aguarda a resolução do problema.

– Hoje minha vida depende totalmente do Rio Branco. Eles fizeram o exame e disseram para esperar pela cirurgia. Estou há oito meses esperando e o pessoal queria me dispensar sem tratamento, sem dinheiro, sem nada. Meu contrato não tem data de término, só de entrada. Estou contratado pelo Rio Branco. O presidente (Francisco Leal) sabe a situação que me colocou. Todas as vezes que ligo para conversar com ele, diz que vai falar comigo, mas nunca resolve nada – reclama.

Innocent Olibrice continua morando no alojamento do clube, que fica nas galerias do estádio José de Melo, no centro da cidade. Ele relata algumas dificuldades, já que não possui nenhuma ocupação, afirma que já passou fome no clube e não tem renda fixa. Atualmente tem contado com pequenas contribuições financeiras que são enviadas esporadicamente por seus familiares do Haiti.

– A vida está muito difícil. Algumas vezes fico com fome, vou dormir sem comida. Se não tem nenhum outro atleta no clube para almoçar ou jantar, que não seja eu, a cozinheira não vai e aí fico sem comida. Passei dois dias sem janta na semana passada. Estou há cinco meses sem receber do clube. Sou jogador de futebol, não estou trabalhando em nada agora. Minha renda é zero. Estou esperando o Rio Branco. Todo o dinheiro que recebi ultimamente foi enviado pela minha família – relata.

No alojamento, segundo o haitiano, há duas semanas não há energia elétrica. Ele critica o tratamento que estão lhe dando dentro do clube e destaca que tentaram o seu desligamento, mas a tentativa foi em vão.

– Quando tive a lesão, eles (Rio Branco) queriam reduzir o meu calendário de trabalho, mas não conseguiram. Estou há duas semanas no alojamento sem energia elétrica e sem que seja feita a limpeza do local, a troca das roupas de cama. Procuro o pessoal da administração e eles estão me enrolando. Vou ficar aqui no alojamento até quando resolver essa situação com o Rio Branco. Se não for permanecer aqui (no Rio Branco) quero dar continuidade na minha carreira em outra equipe para poder trabalhar, estudar também – afirma.

Futuro no Acre

Mostrando um documento emitido pela Justiça do Haiti, Innocent Olibrice afirma que espera ter logo seu futuro resolvido, inclusive com relação ao problema com a Justiça brasileira. Ele foi preso no dia 3 de abril deste ano, suspeito de tráfico de pessoas, quando tentava embarcar um jovem de 14 anos, sem documentos, para Macapá, capital do Amapá. Por isso, passou quatro dias preso na penitenciária estadual Dr. Francisco de Oliveira Conde. Atualmente, aguarda a conclusão do inquérito elaborado pela Polícia Federal (PF).

– Estava esperando esse documento, que prova que nunca fui preso no meu país. Não sou pessoa da rua. Não sou cara errado, tenho tudo certinho. Meu passaporte está todo regular. Acho que o clube tem que resolver minhas coisas. Tenho direitos no clube porque sou contratado como jogador profissional, tenho contrato assinado. Se o clube não me quer mais como jogador, tem que resolver as coisas – declara.

Ele ressalta ainda que mesmo não seguindo no time do Rio Branco, pretende continuar no Acre até o fim de sua vida.

– Gostaria de estudar aqui. Tenho meus certificados de que estudava no meu país e quero continuar no Acre. Terminei o primeiro grau e quero seguir em Rio Branco mesmo. É uma cidade onde todos gostam de mim, Deus me colocou aqui, então vou ficar. Não penso em sair. Quero permanecer, casar, construir família – finaliza.
Presidente do Rio Branco: ‘Nunca foi jogador de futebol profissional’

Presidente do Rio Branco: ‘Nunca foi jogador de futebol profissional’

O GloboEsporte.com conversou com o presidente do Rio Branco, Francisco Leal, sobre o assunto. Segundo o dirigente, Innocent Olibrice não tem vínculo empregatício com o clube e ‘nunca foi jogador de futebol profissional’.

– Ele (Innocent) não quis assinar, mas já foi apresentada a rescisão contratual a ele e vamos entrar com uma ação em juízo, que já está com um advogado. Não é mais empregado do Rio Branco. Não tem vínculo nenhum com o clube. Essa matéria conheço três milhões de vezes melhor do que ele. E outra coisa: é bom que fique claro que esse sujeito nunca foi jogador de futebol profissional porque nunca apresentou nenhuma documentação que comprove isso. Várias vezes nós pedimos informações da Federação Haitiana e nunca mandaram nada, ou seja, ele nunca poderia atuar no futebol profissional – afirmou o cartola, que é juiz trabalhista aposentado.

Em relação à contusão do jogador, Francisco Leal explicou que foram realizados os exames necessários e o atleta receberia auxílio-doença pelo INSS, porém não aceitou a proposta.

– Nós não prometemos nada (de cirurgia). Ele foi encaminhado ao INSS, foram feitos todos os exames. O INSS ia colocá-lo com auxílio doença e ele não quis. Por essa razão que o Rio Branco o dispensou. O Rio Branco dá comida e alojamento sem obrigação nenhuma. Embora não tivesse obrigação, o setor jurídico que tirou ele da cadeia quando foi preso. Teve todo o apoio que precisava ter e não merecia a ajuda do Rio Branco.



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