Economia & Negócios

Professor da UFPB fala sobre agências reguladoras e direito do consumidor

DEPT. DE ECONOMIA


04/01/2018

O professor de economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Paulo Amilton, fala sobre as agências reguladoras e o direito do consumidor. O artigo semanal é uma parceria do Departamento de Economia da UFPB com o Grupo WSCOM.

Segundo o especialista, "no Brasil, o consumidor tem a nítida sensação que seus direitos não são protegidos pela atuação das agências".

Confira o artigo na íntegra:

'As agências reguladoras e o direito do consumidor
Prof. Titular Paulo Amilton Maia Leite Filho

Em 14 de setembro de 1901 tomou posse como vigésimo sexto presidente dos Estados Unidos da América (EUA) o senhor Theodore Roosevelt Jr. Eleito vice-presidente na chapa cujo titular era Willian McKinley, teve a posse após a confirmação da morte deste. Exerceu a presidência até 1908. Sua presidência introduziu políticas anti-monopolistas, tanto que ele teve a alcunha de Trust-Buster (destruidor de cartéis). Defendia o ideal de que o governo deveria ser o árbitro entre o capital e o trabalho, garantindo a justiça para ambos os lados e não concedendo favores a nenhum. Ele implementou leis que protegiam os direitos dos consumidores, entre elas a Meat Inspection Act e a Pure Food and Drug Act. Introduziu a cultura da defesa do consumidor tão em voga nos dias atuais nos EUA.

Na esteira dessas leis, as agências reguladoras foram criadas. O objetivo era fazer com que um setor se aproximasse de um resultado considerado aceitável a um determinado marco regulatório previamente estabelecido, mantendo-o nele até posterior deliberação de outro marco regulatório. Neste marco ficava estabelecido os direitos de cada parte, as metas de qualidade dos produtos, padrão sanitário, seu alcance, composição e outras características. No tocante às empresas, delimitava a concorrência e, onde esta não poderia ser estabelecia, a taxa de retorno dos investimentos.

A tradição americana, ao contrário da europeia, sempre foi pela intervenção indireta no mercado. As empresas são, na grande maioria das vezes, privadas que se comprometem a seguir os ditames das agências regulatórias. A Europa inicialmente optou pela intervenção direta com a operação de empresas estatais. Na Grã-Bretanha chegou-se ao cúmulo de ter 90% da economia estatal. O governo de Margareth Thatcher na década de 1990 foi o começo da modificação desta realidade. Com o fortalecimento da União Europeia, as agências regulatórias também foram estabelecidas. Tanto nos EUA como na União Europeia, os consumidores têm a nítida sensação de que estas agências protegem seus direitos.

No Brasil as agências reguladoras foram estabelecidas no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC). Os ministérios faziam os estudos sobre o comportamento ideal de dado setor e submetiam ao legislativo. Este debatia sobre o que seria o ideal e, no final, aprovava o marco regulatório. As agências regulatórias ficavam incumbidas de operacionalizar este marco regulatório. Nos governos petistas essas foram paulatinamente perdendo importância. Seguindo a tradição da esquerda europeia, o PT teve medo de perder poder decisório com a transferência de competências às agências. Várias delas tiveram seus colegiados desfalcados durante anos. Resultado, foram capturadas pelos interesses das empresas que deveriam regular. É muito normal ter seus colegiados compostos por membros que foram empregados das empresas reguladas. Em estando na agência, defendem os interesses das empresas.

Aqui o consumidor tem a nítida sensação que seus direitos não são protegidos pela atuação das agências. Vamos a alguns exemplos. A Agência de Aviação Civil (ANAC) determinou que os passageiros deveriam pagar pelas malas transportadas. Alegou que as passagens diminuiriam de valor. Até o momento isto não aconteceu. A Agência de Saúde Suplementar (ANS) está propondo um novo marco regulatório do setor que claramente é favorável às empresas e contra os interesses dos usuários, principalmente dos usuários mais idosos.

A Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) estabelece que em casos de não pagamento da conta de luz a empresa concessionária pode desligar o serviço na residência inadimplente sem aviso prévio e nem com a presença do proprietário da mesma, mas para religar o serviço exige a presença do proprietário. Alega que a presença é necessária por que o religamento pode causar danos aos equipamentos elétricos instalados na residência, como se o desligamento repentino não tivesse o mesmo perigo. Ou seja, uma regra que é claramente favorável a empresa em detrimento do usuário, pois visa tão somente proteger o caixa da empresa concessionária. Além desses casos, existem uma profusão de outros exemplos que não posso elencar por que o espaço aqui é pequeno.

A justificativa para a atuação das agências em favor das empresas sempre é dar proteção à estas para preservar a saúde financeira das mesmas. Ou seja, aqui o ideal de Theodore Roosevelt não encontrou eco. Neste sentido, o Brasil está 100 anos atrasado na defesa dos direitos dos consumidores.'

'NOTA ANS

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) esclarece que, diferentemente do que foi afirmado pelo professor Paulo Amilton Maia Leite Filho no artigo intitulado ‘As agências reguladoras e o direito do consumidor’, a proposta para um novo marco regulatório dos planos de saúde é uma pauta do legislativo federal e não partiu da Agência. A discussão acontece na Câmara dos Deputados e tem como base o Projeto de Lei 7419/06, em debate em comissão especial.'



Os comentários a seguir são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.