Economia & Negócios

Professor comenta falácia da melhoria da distribuição de renda na era PT

NA ERA PT


10/08/2017

O professor de economia da Universidade Federal da Bahia (UFBa), Wilson Ferreira Menezes, aborda, em seu mais novo artigo no Portal WSCOM, o raciocínio falso de que o governo do Partido dos Trabalhadores teria melhorado a distribuição de renda.

"O crescimento econômico não garante, por si mesmo, uma diminuição das desigualdades distributivas. Não se verifica, portanto, alterações substanciais no perfil distributivo da renda do Brasil na era petista".

Confira o artigo na íntegra:

A FALÁCIA DA MELHORIA DISTRIBUTIVA NA ERA PETISTA

Wilson F. Menezes
Professor da UFBa

Desde os anos 60, a distribuição da renda é um importante tema nas discussões econômicas no Brasil. Após o governo do PT essa preocupação ganhou ainda mais relevo, na medida em que se tratava de um governo que prometia maior justiça social e acabar com a pobreza no país. Essa nova consciência seguia a trajetória internacional quando se constatava os intoleráveis níveis de pobreza presente em grande parte do mundo, daí o incentivo das Nações Unidas, ao lançar em 1996 o projeto Millenium que prometia diminuir pela metade a pobreza mundial até 2015, praticamente apenas através do incentivo ao crescimento econômico. Havia, portanto, uma sintonia do governo petista com a comunidade internacional.

Pensava-se então que o crescimento econômico acompanhado de um aumento da parte da renda destinada à população pobre resolveria o problema da pobreza. Assim, a diminuição da pobreza em um ritmo mais elevado que o crescimento do PIB, naturalmente permitiria que a renda dos pobres crescesse mais rapidamente que a renda do resto da população, fato esse que por si mesmo condicionaria um movimento de diminuição das desigualdades sociais e da pobreza. Esse seria crescimento que teria como beneficiário maior a população pobre.

Por outro lado, estudos econômicos também admitem que, em média, o crescimento econômico passado pode não ser seguido de mudanças significativas na repartição da renda, seja em detrimento ou em favor dos pobres. Isso foi percebido através da relação entre a renda média do primeiro quintil sobre o último, tendo sido constatado que, em muitos países, essa relação, em verdade, não evoluiu no mesmo ritmo do rendimento médio da população como um todo. Essa é uma percepção empírica em que o crescimento econômico pode também ser neutro com respeito à distribuição da renda.

Dessa forma, o crescimento econômicos não garante, por si mesmo, uma diminuição das desigualdades distributivas. Pode ser e pode não ser, cada caso é um caso. Elevação do nível da atividade econômica não necessariamente garante a diminuição do fenômeno da pobreza. Em verdade, o crescimento econômico pode contribuir para diminuir, manter estável ou até mesmo aumentar a pobreza. Não há, portanto, uma associação orgânica entre a política de aceleração do crescimento e uma distribuição mais igualitária da renda, ficando incerto o alcance do objetivo proposto.

Dois casos emblemáticos. A América Latina que, desde os anos 1980, tem apresentado, em média, baixo nível de crescimento econômico, além de uma alta volatilidade do mesmo, de sorte que os indicadores de pobreza não apresentam mudanças significativas. O fraco crescimento econômico se coloca então como grande obstáculo ao alcance de uma melhoria nas condições de vida das populações pobres. Por outro lado, a Ásia tem apresentado elevados e duradouros níveis de crescimento econômicos, mas as desigualdades sociais têm aumentado, mesmo que os índices de pobreza absoluta tenham diminuído. Nos países asiáticos, de um modo geral, o crescimento econômico tem melhorado suas condições de vida de maneira muito diferenciada, com ampliação das diferenças sociais. Dessa sorte, pode-se concluir que o crescimento econômico é uma condição necessária, mas não suficiente para se alcançar um desenvolvimento mais harmonioso e socialmente justo, a ponto de contribuir para a redução da pobreza relativa.

O entendimento da relação entre o crescimento econômico e a redução da pobreza é muito importante, isso porque naturalmente ajuda na orientação das políticas econômicas e sociais, bem como auxilia para uma melhor compreensão do comportamento do mercado de trabalho. Muitos são os métodos estatísticos para analisar essa relação, provavelmente o mais adequado está vinculado ao estudos das séries temporais das variáveis relevantes, são os chamados modelos de cointegração, pertinentes para se observar a existência de uma possível relação de interdependência nas trajetórias temporais do crescimento econômico e das variáveis representativas da pobreza. Analisam-se então os efeitos de longo prazo, sem deixar de considerar os de curto prazo.

Para tanto, o crescimento econômico pode ser visto de forma aproximada por intermédio da taxa de ocupação da economia, enquanto que a pobreza pode perfeitamente ser exteriorizada através de variáveis de rendimentos que medem as desigualdades distributivas, tais como a “Participação dos rendimentos do pobre no rendimento do não pobre”, requerendo portanto uma definição quantitativa do rendimento relativo a pobreza; a “Aversão a desigualdade distributiva”, medida pela relação entre a diferença do rendimento definidor de uma linha de pobreza e o rendimento das pessoas, dividida pelo rendimento da própria linha de pobreza; ou mesmo através da “Proporção dos rendimentos dos 10% mais pobres sobre os rendimentos dos 10% mais ricos”. Informações estatísticas relativas à Região Metropolitana de Salvador apontam alguns resultados interessantes, os quais, muito provavelmente, podem ser expandidos para o país como um todo.

Em 1996, a “Participação da renda do pobre na renda do não pobre” era de 9,6%, em 2002 esse percentual aumentou para 11%, uma pequena melhoria que pode ser atribuída ao governo de FHC. Em 2003, essa relação passou para 12,3%, para 12,5% em 2008. Uma melhora quase que insignificante em relação ao governo anterior, isso porque praticamente pouca coisa se alterou até meados do segundo mandato do PT.

No que diz respeito à “Aversão à desigualdade distributiva”, os resultados se mostram ainda mais adversos. Entre 1996 e 2002, essa aversão passou de 0,41 para 0,45, melhorou portanto; já entre 2003 e 2008, essa aversão passou de 0,44 para 0,35. Inusitado, enquanto no governo FHC a aversão à desigualdade distributiva aumentou, no governo Lula ela diminuiu.

A “Proporção dos rendimentos dos 10% de menor renda sobre os rendimentos dos 10% de maior renda” também apresentou uma elevação entre 1996 (1,5%) e 2002 (2,2%), tendo alcançado 2,3% em 2003. Essa relação caiu para 1,9% em 2004 e voltou a crescer entre 2005 (2,2%) e 2008 (2,9%). Tratam-se de percentuais similares nos dois governos, além do mais, sem dúvida, são percentuais bastante baixos para caracterizar uma mudança estrutural no processo distributivo da renda do país.

Não se verifica, portanto, alterações substanciais no perfil distributivo da renda do Brasil na era petista. O período Lula apresentou pequenas alterações positivas nos valores absolutos desse perfil, muito embora não o suficiente para alterar as condições estruturais e relativas da repartição da renda no país. O tempo se fecha ainda mais a partir do segundo mandato de Dilma, quando a marola virou tsunami. Onde está a melhoria dos níveis de bem estar dos pobres? Certamente o gato pode dar uma luz na obtenção de uma resposta. Apertem os cintos, o dinheiro sumiu. Estamos diante de uma herança politicamente falaciosa e nefasta.



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