Educação

‘O aluno tem de aprender na idade certa’

Resultados


16/12/2013

 Os resultados do Programa de Avaliação Internacional de Estudantes (Pisa) aparecem e são mais discutidos pela mídia do que pelas escolas. Essa é a avaliação que a pesquisadora Lina Kátia Mesquita, da Universidade Federal de Juiz de Fora, faz em entrevista ao iG. Ela coordena o centro responsável pela aplicação da prova da Organização de Cooperação dos Países Desenvolvidos (OCDE) no Brasil.

O teste, que avalia o que sabem os jovens de 15 anos em mais de 60 países, é um dos termômetros para a avaliação da qualidade da educação oferecida a crianças e adolescentes. Ele é realizado a cada três anos e, em 2012, mais uma vez, os resultados mostram que o Brasil está longe de oferecer um ensino próximo ao dos países desenvolvidos avaliados na prova.

No ano passado, o foco foi Matemática (a cada aplicação, o tema principal muda). Entre 2003 e 2012, o país subiu de 334 para 391 pontos na área. No entanto, ainda ocupa a 58ª posição entre os 65 países participantes e está mais de 100 pontos abaixo da média dos países da OCDE (494 pontos).

Lina defende que os avanços da educação brasileira precisam ser reconhecidos. Mas admite que eles estão mais relacionados à inclusão de alunos e redução da defasagem escolar do que ao que é ensinado nas salas de aula. “Avançamos muito, mas ainda temos um longo caminho a percorrer. A queda da defasagem significa que os meninos estão avançando”, afirma.

Para a coordenadora do Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação (CEAd) da UFJF, os desafios começam na inclusão dos professores nas discussões sobre o significado dos desempenhos dos jovens brasileiros (o que não se limita à prova do Pisa). “Eles precisam se apropriar disso. Os gestores têm de levar essa discussão às escolas. Isso precisa ter efeito na escola, são eles que têm de validar esse teste”, comenta.

Confira os principais trechos da entrevista concedida ao iG:

iG: Por que a senhora acredita que a participação do Brasil no Pisa é importante?
Lina Kátia Mesquita: O que acontece com o Pisa é que não importa onde está o estudante – México, China, Brasil – todos terão de demonstrar um conjunto de habilidades e competências para responder aos itens da prova que mostram a inserção desse jovem cidadão no mundo. Diferentemente do nosso teste nacional, a Prova Brasil, o Pisa avalia pela idade do estudante sem se preocupar com a série. Isso significa que, com essa idade escolhida (15 anos), há um conjunto de habilidades básicas e essenciais que qualquer cidadão precisa desenvolver para viver nesse mundo de tecnologia, avanço científico, globalizado.

iG: Mas o conhecimento pode ser medido da mesma maneira em qualquer país? Independentemente da história e características de cada um?
Lina: Acho importante um teste padronizado para todos, porque se começarmos a dizer que o menino de cada região precisa fazer uma prova diferente, vamos contribuir para haver desigualdade social. Precisamos de uma boa prova, que a escola entenda que precisa desenvolver habilidades dos alunos. Claro que existem fatores externos à escola que afetam o desempenho do estudante, como o nível de escolaridade dos pais, especialmente da mãe, o perfil do gestor, a formação dos professores. Mas há algo que precisa se sobrepor a tudo isso: o direito que o aluno tem de aprender na idade certa. Se isso não ocorre, estamos contribuindo para uma injustiça das oportunidades educacionais.

iG: A cada resultado da prova, o governo ressalta como avançamos, mas o país continua no fim do ranking. Podemos dizer, a partir dos resultados, que avançamos?
Lina: Avançamos muito, mas ainda temos um longo caminho a percorrer. Os resultados precisam avançar muito mais. O resultado do Pisa mostra, por exemplo, que avançamos muito na questão da inclusão. Há mais alunos na escola e, se as notas de matemática subiram, eles estão aprendendo. A defasagem idade-série (diferença entre a idade do aluno e a série que deveria cursar) diminuiu nos últimos anos e isso também é importante. São bons indicativos de inclusão, correção de fluxo. Este ano, Matemática era o conhecimento mais exigido nos itens. Mas, se o resultado melhorou nesse conteúdo, significa que também melhorou em leitura, porque os alunos têm de ler para responder Matemática. Talvez o ideal seria trabalhar para mostrarmos, de forma representativa, qual é o perfil do teste.

iG: A senhora quer dizer as escolas trabalharem no estilo do teste?
Lina: Não é se restringir, mas há um movimento que a escola precisa fazer, que é compreender a distância que ela mesma está de conseguir desenvolver essas habilidades dos alunos. Se o aluno de escola particular ou da rede federal tem condições de responder esse teste, por que os outros não? A escola precisa saber como contribuir para melhorar o aprendizado. O que acontece é que a mídia divulga o resultado, discute e essa repercussão é vista na escola. Mas falta um trabalho dos gestores para os resultados do Pisa “chegarem” à escola, serem discutidos e apropriados pelos professores. Esse resultado precisa ter efeito na escola. Esse é desafio. O governo utiliza esses dados, essas comparações com os países da OCDE para monitorar a qualidade da educação, mas isso precisa chegar na ponta. Os professores precisam validar os itens, discuti-los. A escola não analisa a prova pedagogicamente.

iG: Qual deveria ser o ponto de partida?
Lina: A proposta curricular. Deveríamos nos perguntar até que ponto as habilidades contempladas no Pisa são tratadas nos currículos e se elas são importantes. Se não forem, deveríamos saber justificar isso. As diretrizes curriculares nacionais apontam para a mesma coisa, valorização do raciocínio lógico, capacidade de reflexão. Acho que é preciso estabelecer um pacto com os professores e envolvê-los nessa discussão. E nosso maior problema nesse sentido é o ensino médio. Ainda não está claro o que temos de ensiná-los.

 



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