Política

Jersey determina que empresas de Maluf devolvam US$ 28 milhões a SP


21/01/2013

 A Justiça de Jersey, paraíso fiscal europeu, determinou nesta quinta-feira (17) que empresas que a Prefeitura de São Paulo diz pertencerem ao ex-prefeito Paulo Maluf devolvam aos cofres do município US$ 28,3 milhões (quase R$ 58 milhões).

Em novembro, a Justiça de Jersey determinou a devolução de dinheiro desviado de obras públicas em São Paulo durante a gestão Maluf, mas faltava calcular os juros do processo. Segundo os advogados que a Prefeitura de São Paulo contratou em Londres, o titular da conta, Flávio Maluf, é quem terá que devolver o dinheiro. A Prefeitura de São Paulo diz que as empresas pertencem ao ex-prefeito, e a Justiça diz que o dinheiro foi movimentado pela família Maluf.

Nesta sexta-feira, o G1 procurou a assessoria de Maluf, que não se manifestou até a publicação dessa reportagem.

A Secretaria de Negócios Jurídicos da Prefeitura de São Paulo informou que foi notificada na quinta-feira sobre a decisão da Corte de Jersey. "O processo está em fase final e de arbitragem de custos advocatícios, que por parte da Prefeitura de São Paulo podem chegar a R$ 15 milhões dispendidos desde o início da referida disputa judicial", afirma a nota.

Em novembro, Maluf negou envolvimento no desvio de recursos e afirmou que não é réu na decisão. “Primeiro, eu não sou réu. Segundo, eu não tenho conta. Isso é um engano jornalístico. Vocês estão cometendo uma barriga”, afirmou. A assessoria do deputado informou ainda, em nota, que a ação não tem embasamento legal.

A sentença desta quinta-feira calcula o montante total. "Haverá uma ordem a favor dos requerentes de juros compostos sobre o montante principal de US$ 10,500,055.35 a pagar de fevereiro de 1998 até 16 de novembro de 2012 (data em que o julgamento foi proferido), calculado com base em uma taxa mensal de 1% sobre o ‘US Prime Rate’. Isso equivale a um total de juros de US$ 17,844,398.49 e faz uma figura de juízo total de US$ 28,344,453.84."

"A decisão é extremamente importante no combate à corrupção internacional", afirmou nesta sexta-feira (18) o promotor de Justiça Sílvio Antônio Marques, da Promotoria do Patrimônio Público e Social da capital. ‘É um valor substancial. Não existe nenhuma decisão mandando devolver tanto dinheiro assim a um órgão público", complementou.

Segundo o MP, Jersey ainda vai determinar o valor que as empresas terão de devolver em custas processuais e honorários advocatícios. Esse valor está estimado em cerca de US$ 4,5 milhões.

A decisão judicial de novembro diz que os recursos foram transferidos para uma conta em nome de duas empresas, a Durant International Corporation e a Kildare Finance Limited.

Ainda cabe recurso contra a sentença, mas como a ilha está sob jurisdição britânica, a apelação terá que ser feita na Câmara dos Lordes, em Londres. Segundo Marques, será difícil a defesa conseguir reverter a decisão.

O procurador-chefe da Procuradoria Geral de São Paulo, Celso Augusto Coccaro Filho, disse em novembro que o ex-prefeito teria de devolver aos cofres municipais cerca de US$ 22,5 milhões, que seria o equivalente ao montante desviado acrescido de juros compostos. A família de Maluf ainda terá que arcar com as custas do processo, que é de cerca de R$ 5 milhões.

"Esse valor de US$ 10,5 milhões é o valor da época. Nós bloqueamos US$ 22 milhões fazendo a aplicação de juros simples. Como o juiz de Jersey entendeu que houve fraude, aplica-se juros compostos. E, segundo a Corte de Jersey, o valor pode chegar a US$ 32 milhões. O mínimo de US$ 22 milhões já estava bloqueado e está garantido", disse na ocasião.

Coccaro Filho disse que os juros são uma compensação. “Os juros são, no entender da Justiça, uma maneira de compensar quem sofreu a fraude. Eles são aplicados em um caráter de reparar a perda”, afirma o procurador.
Segundo a sentença, o deputado federal Paulo Maluf (PP-SP) participou de uma fraude na remessa de dinheiro público para contas no estrangeiro em 1998. "(…) o conhecimento de Paulo Maluf e Flávio Maluf (filho do ex-prefeito) de que esses pagamentos eram o produto de uma fraude sobre os autores (Prefeitura de São Paulo) é atribuído a cada um dos réus e tais pagamentos foram, por isso, recebidos por Durant e Kildare com o conhecimento das fontes", afirma a decisão.

“Tanto para a procuradoria como para o direito, [ela] é um marco na história da luta contra a corrupção no âmbito internacional. Esse caso é estudado no exterior, porque essa é uma das principais medidas para o controle de remessas indevidas”, diz o procurador.

“Os juros são, no entender da Justiça, uma maneira de compensar quem sofreu a fraude. Eles são aplicados em um caráter de reparar a perda de danos”, afirma o procurador.

Sentença

De acordo com a sentença, a Justiça de Jersey afirma que Maluf participou da fraude contra a Prefeitura na construção da Avenida Jornalista Roberto Marinho, então conhecida como Águas Espraiadas.

A condenação se deu em ação civil proposta pela Municipalidade de São Paulo na Ilha de Jersey, em 2009, com apoio da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital. A parceria foi estabelecida entre a Procuradoria Geral do Município de São Paulo e o Ministério Público em razão do interesse comum na repatriação do dinheiro.

Após a saída de Maluf da prefeitura, o dinheiro desviado foi enviado, entre janeiro e fevereiro de 1998, para contas da família nos Estados Unidos, segundo rastreamento realizado pela Justiça.

A Justiça afirma ainda que Flávio Maluf, que é filho do então prefeito, sabia da natureza fraudulenta dos recursos e realizou movimentações. A sentença diz que ele, sob orientação ou com consentimento do pai, fez 15 depósitos, provavelmente através de um ou mais doleiros, em uma conta sua nos Estados Unidos da qual o deputado também seria beneficiado.

De lá, o dinheiro foi levado para contas de duas empresas no paraíso fiscal.

Etapas da ação em Jersey
O governo municipal afirma que houve desvios relacionados à construção da Avenida Jornalista Roberto Marinho. A obra foi realização da gestão Maluf (1993 a 1996). A construtora responsável teria promovido um superfaturamento da obra e repassado o dinheiro a Paulo Maluf.

A Prefeitura e o Ministério Público adicionaram ao processo diversos documentos como extratos bancários e cópias de cheques tentando mostrar o caminho do dinheiro, passando primeiro por Nova York e indo parar em Jersey.

De acordo com a Prefeitura, a ação teve três etapas. A primeira foi a quebra do sigilo, que serviu para localizar parte das provas. A segunda foi o congelamento do dinheiro que, segundo ele, teve a origem brasileira comprovada. Agora, a Prefeitura obteve decisão que determina a devolução da verba.

Um documento foi decisivo para a decisão da Justiça de Jersey: um relatório da construtora Mendes Júnior mostrando que 20% de todos os pagamentos que a Prefeitura de São Paulo fazia eram transferidos para uma conta em Nova York. Mais tarde, descobriu-se que esta conta pertencia a laranjas, amigos de Paulo e Flávio Maluf. A partir dessa conta, o dinheiro era transferido para Londres, Jersey e Suíça. Um documento assinado por Paulo Maluf transfere esta conta para o filho Flávio.

Confira abaixo parte da decisão da Justiça de Jersey:

"Por essas razões, sem hesitar, nós concluímos que o pedido dos recorrentes sucede.
Especificamente, nós descobrimos: que no final de 1997 e início de 1998, o município foi vítima de uma fraude como foi alegado.

(Ii) que Maluf Paulo era uma parte da fraude, pelo menos na medida em que, no decurso de Janeiro e fevereiro de 1998, ele ou outras pessoas em seu nome receberam ou foram creditados no Brasil com uma série de 15 pagamentos secretos para o valor de (no total) de R$ 13.512.885,34.

(Iii) que Flávio Maluf, sabendo da natureza de tais pagamentos, sob as instruções do
Paulo Maluf ou com a sua concordância, arranjou que os fundos equivalentes a pelo menos 13 dos 15 pagamentos fossem transferidos para fora do Brasil, com sua conversão em dólares americanos no valor de EUA $ 10.500.055,35 nas então atuais taxas de câmbio (provavelmente através de um ou mais doleiros) e para seus pagamentos na conta bancária n. 6100546 conhecido como Chanani com Safra International Bank de Nova York, conta controlada por Flavio Maluf, cujos donos eram ele e/ou Paulo Maluf.

(Iv) que tais pagamentos são rastreáveis para e através da conta Chanani para a canta bancária do primeiro réu, Durant, com o Deutsche Bank em Jersey e daí para o conta bancária do segundo réu, Kildare, com o Deutsche Bank, em Jersey, em um quantidade de EUA $ 10.500.055,35.

(V) que o conhecimento de Paulo Maluf e Flávio Maluf de que esses pagamentos eram o produto de uma fraude sobre os autores é atribuído a cada um dos réus e tais pagamentos foram, por isso, recebido por Durant e Kildare com o conhecimento das fonte.
(Vi) que cada um dos réus é, portanto, susceptível aos queixosos como construtivo
administrador de tais pagamentos no valor de US$ 10.500.055,35.

(Vii) ainda, que o conhecimento de Paulo Maluf e Flávio Maluf de que os réus não tinham direito a esses pagamentos é atribuída a cada um dos réus, e na medida em que os réus permanecem enriquecidos por esses pagamentos é susceptível de os demandantes com base no enriquecimento injusto na soma de US$ 10.500.055,35.

(Viii) ainda, que os autores têm direito exclusivo à soma de US$ 10.500.055,35
dos fundos atualmente existentes em contas bancárias congeladas no Deutsche Bank por Kildare e Durant.

Vamos ouvir outros argumentos quanto à natureza exata da dedução a ser concedida ao autores e termos apropriados da ordem de ser feitos, incluindo a extensão em que eles têm direito a recuperar os juros e o seu quantum.".

Veja abaixo nota divulgada pela assessoria do deputado federal:

"NOTA OFICIAL
1 – A sentença mostra claramente que Paulo Maluf não é réu na Ilha de Jersey.
2 – A sentença mostra claramente, o que temos afirmado à exaustão, que Paulo Maluf não têm conta na Ilha de Jersey.
3 – A sentença mostra claramente que os eventuais recursos citados na ação teriam sido movimentados em janeiro e fevereiro de 1998, quando Paulo Maluf não era mais prefeito de São Paulo, já que seu mandato acabou em dezembro de 1996. Portanto já havia saído da Prefeitura a mais de um ano.
4 – A ação não tem embasamento legal já que a obra não foi feita pela Prefeitura, mas sim pela Emurb, sendo, portanto, a Prefeitura parte ilegítima na questão.
5 – A ação não tem embasamento legal pois qualquer obra realizada em território brasileiro, si feita de forma irregular, o que não é o caso dessa, terá de ser julgada pela Justiça brasileira.
6 – À decisão cabe recurso.
Adilson Laranjeira
Assessor de Imprensa de Paulo Maluf"



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