Justiça

Força-tarefa resgata trabalhadores em condições análogas às de escravidão na Paraíba

Aberta na semana passada e ainda em andamento, Operação Resgate realizou 64 ações em todo País e resgatou adolescentes, homens, mulheres, indígenas, idosos, e até mesmo pessoas com deficiência


28/01/2021

Imagem ilustrativa. Foto: Procuradoria-Geral do Trabalho

Por Cristiane Cavalcante com Estadão



Uma força-tarefa composta composta pela Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho, Subsecretaria de Inspeção do Trabalho, Ministério Público Federal e Defensoria Pública da União regatou cerca de 110 pessoas em situações de trabalho análogas à escravidão no âmbito Operação Resgate, aberta na semana passada.

A ação segue em andamento em 23 das 27 unidades da Federação, entre elas Paraíba, Goiás, Mato Grosso, Paraná, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Tocantins, Pará, Rio Grande do Sul, São Paulo e Distrito Federal.

A maior ação foi em Goiás, onde 24 pessoas foram retiradas de uma plantação de laranja. No mesmo estado,  uma pessoa foi resgatada após trabalhar 15 anos em troca de moradia. Entre os resgatados se destacam  ainda dois adolescentes em Minas Gerais, três indígenas no Mato Grosso do Sul, cinco pessoas que eram exploradas num parque de diversões em Pernambuco, 11 resgatados em um garimpo na fronteira entre a Paraíba e o Rio Grande do Norte e duas pessoas com deficiência que eram exploradas no Rio Grande do Sul.

Ao todo, as verbas rescisórias a serem recebidas para indenizar esses trabalhadores somam cerca de R$ 500 mil, informou a Polícia Federal (PF). Todos terão direito também a três parcelas de seguro desemprego especial.

Cerca de 300 policiais federais, 100 auditores fiscais do trabalho, 29 procuradores do trabalho, 78 agentes de segurança institucional participaram das atividades da operação que a PF classifica como a ‘maior força-tarefa já realizada no País com a finalidade de efetuar o resgate de trabalhadores em condições irregulares’

Além do resgate dos trabalhadores, a ação conjunta ‘tem como objetivo a verificação do cumprimento das regras de proteção ao trabalho, a coleta de provas para garantir a responsabilização criminal daqueles que lucram com a exploração e a reparação dos danos individuais e coletivos causados aos resgatados’, indicou a corporação.

Em coletiva, a força-tarefa sinalizou que nas 64 ações realizadas em todo País foram resgatados adolescentes, homens, mulheres, indígenas, idosos, e até mesmo pessoas com deficiência. As verbas salariais que esses trabalhadores vão receber se aproximam de R$ 500 mil. Além disso, foram identificados 486 trabalhadores sem registro na carteira, e lavrados mais de 360 autos de infração.

Os primeiros detalhes sobre a Resgate foram divulgados nesta quinta, 28, Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo. A data foi instituída em 2009, em homenagem a servidores que foram assassinados em 28 de janeiro de 2004, quando se deslocavam para uma inspeção em fazendas da região de Unaí, em Minas.

Dados oficiais das ações de combate ao trabalho análogo ao de escravo no Brasil estão disponíveis no Radar do Trabalho Escravo da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho. Denúncias sobre situações de tal teor podem ser feitas de forma remota e sigilosa no Sistema Ipê.

 

Caso Madalena

No fim do ano passado, a história de Madalena Gordiano, que passou quase toda uma vida trabalhando em condições semelhantes à escravidão, chocou o Brasil. A mulher, que, aos 8 anos de idade, foi pedir um pedaço de pão e acabou servindo a uma família por 38 anos, nunca recebeu salário nem direitos trabalhistas, vivia reclusa, foi forçada a casar e chegou até a pedir comida e sabonete para vizinhos. O calvário só chegou ao fim em novembro de 2020, quando, após denúncia, ela foi resgata por auditores fiscais do trabalho em um apartamento na cidade de Patos de Minas (MG). Vivia num cômodo, que não tinha sequer janelas.

 

Madalena passou mais de 30 anos vivendo presa em apartamentos de uma mesma família em Patos de Minas, em Minas gerais. (Foto: Reprodução/Tv Globo)

 

Madalena foi resgatada em 2020, pleno século 21. Mas, como ela, muitas pessoas ainda sofrem situações semelhantes àquelas vividas pelos escravos no período colonial. Trabalho forçado, jornada exaustiva, condições degradantes, servidão por dívida são algumas das características do que se chama trabalho escravo moderno. Só nos últimos cinco anos (2016-2020), o Ministério Público do Trabalho (MPT) recebeu mais de 6 mil denúncias relacionadas aos temas trabalho escravo e aliciamento e tráfico de trabalhadores.

De acordo com o vice-coordenador nacional de Combate ao Trabalho Escravo e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Conaete), do MPT, Italvar Medina, só no ano passado, mais de 900 trabalhadores foram resgatados de situações análogas ao trabalho escravo.  “A grande parte das situações ocorreu no meio rural, sobretudo nas atividades de café, carvoarias e plantio e colheita de cebola. Mas também tivemos resgates urbanos em oficinas de costura e trabalho doméstico”.

Segundo Medina, as vítimas do trabalho escravo moderno são pessoas em situação de alta vulnerabilidade social, baixa escolaridade, com poucas oportunidades de emprego e baixa consciência de seus direitos. “Elas são iludidas por promessas de ótimas condições de trabalho e remuneração, muitas vezes levadas a sair do seu estado de origem e quando chegam ao seu destino, percebem que a situação não é como foi prometida”, diz.

 

Conscientização e Denúncias

Para marcar o Dia Nacional de Combate ao Trabalho Escravo, o MPT realiza uma live sobre trabalho escravo e tráfico de pessoas, hoje às 18h, pelo canal TVMPT, no YouTube.

Denúncias de práticas de trabalho análogo à escravidão podem ser realizadas por meio do Disque 100, pelo site do Ministério Público do Trabalho, nas sedes do MPT e pelo aplicativo do MPT Pardal.



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