Economia & Negócios

Em novo artigo, professor Wilson Menezes analisa a Reforma Fiscal

O artigo semanal é resultado de uma parceria entre o Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e o Portal WSCOM


13/09/2019

O professor Wilson Menezes, da UFBA

O professor de economia da Universidade Federal da Bahia (UFBa), Wilson Ferreira Menezes, em novo artigo publicado nesta sexta-feira (13), analisa a Reforma Fiscal. 

 

O artigo semanal é resultado de uma parceria entre o Departamento de Economia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e o Portal WSCOM.

 

Confira:

 

QUE VENHA A REFORMA FISCAL: ELEMENTOS PARA ENTENDER E OPINAR

Wilson F. Menezes

 

A dimensão dos recursos fiscais que sai da economia para as mãos do governo está intrinsicamente relacionada com o tamanho que se quer do Estado. Ademais, a forma de se levantar esses recursos deve influenciar o mínimo possível a dinâmica de funcionamento dos mercados, ou seja, não provocar instabilidades desagradáveis ao processo econômico como um todo. Não se pode, portanto, esquecer o adágio popular: “muito imposto, mata o imposto”, daí a necessidade de se alcançar uma máxima tributação com o menor gemido possível da população. Não é uma tarefa fácil. A dimensão dos recursos fiscais necessários tem a ver com os encargos e tarefas que a sociedade espera de seu governo.

 

Ao longo do tempo, os gastos públicos têm se mostrado crescentes em praticamente todas as economias. Esse crescimento é de tal magnitude que não é incomum os gastos governamentais crescerem mais e mais rapidamente que o produto interno bruto do país. São muitas as motivações para que isso ocorra. Desde a necessidade de financiamento das despesas militares e de segurança pública, passando por muitas atividades que se encontram sob responsabilidade do Estado, necessidade de implementar políticas de desenvolvimento econômico, incentivo à industrialização, educação e saúde, bem como para promover políticas de redistribuição de rendas em prol de grupos sociais expostos às intempereis da vida, sem falar nos gastos vinculados às mudanças na composição etária, uma população envelhecida ou vias de envelhecimento naturalmente demanda muito do governo, o qual fica obrigado a elevar a contribuição tributária dos agentes economicamente ativos.

A arrecadação dos impostos, contudo, tem que ser enquadrada na lei, de maneira a torná-la perfeitamente previsível aos contribuintes. Esse enquadramento requer todo um processo político de discussões e fixação das normas fiscais, tendo em vista responder questões tais como: devem os impostos ser mais diretos ou indiretos? que impostos devem ser implantados em cada uma dessas modalidades? quem paga e quanto se paga em cada um deles? Essas são questões de grande amplitude, para as quais a sociedade tem que ter pelo menos uma noção conceitual do que seja, bem como de sua magnitude.

 

Esse tipo de preocupação nos remete de maneira rápida e direta ao conceito de justiça social. Mas o que é a justiça social? Responder a essa questão requer a definição de uma visão de mundo, de maneira que, em verdade, existem justiças sociais no plural, que se chocam no dia a dia de uma população. Uma visão igualitária aponta a necessidade de diminuição da pobreza; uma visão utilitarista vai defender um mais elevado nível de prazer e bem-estar social para quem produziu a riqueza; uma visão desenvolvimentista tentará promover os investimentos necessários ao crescimento econômico e por aí vai. Qualquer discussão sobre essas proposições naturalmente remete aos princípios fundamentais no campo da teoria da tributação, quais sejam: a neutralidade e a equidade.

 

O primeiro se preocupa com o grau de interferência do estado no campo da economia, procurando deixar, o mais que possa, as decisões alocativas em mãos das pessoas através dos mecanismos de mercado, de maneira que a estrutura tributária modifique o mínimo possível a formação dos preços relativos entre os diferentes bens e serviços socialmente produzidos. Enquanto o segundo princípio busca uma distribuição social da carga tributária, como o próprio nome diz, da maneira a mais equânime possível. Para tanto, se define duas óticas de equidade: a ótica do benefício e a ótica da capacidade de contribuição. A ótica do benefício impõe um maior sacrifício àquele que será mais beneficiado com o gasto público que será financiado com o imposto; enquanto a ótica da capacidade de contribuição (inexistente no Brasil) tem a ver com a possibilidade de arcar com o imposto que garanta o gasto público, fato esse que por si mesmo proporciona uma alteração no processo distributivo da renda. Com essas observações, percebe-se que a questão tributária se torna, passo a passo, um pouco mais complexa.

 

Mas as coisas não param. Os impostos diretos, por exemplo, não interferem sobre os preços relativos, a exemplo do imposto de renda; enquanto os impostos indiretos sim, na medida em que haja diferenciações das alíquotas, bem como por se saber que quem paga é aquele que adquire o bem ou serviço. Esses impostos indiretos costumam alcançar mais prontamente as pessoas que tem rendimentos menos elevados, isso porque dedicam uma maior proporção de seus rendimentos ao atendimento das necessidades imediatas de consumo. A justiça social toma agora uma dimensão de tal porte, que fica praticamente impossível levá-la a termo. Isso que chamam de justiça social não existe caros Senhores.

 

Um grande problema na área tributária brasileira é o quantitativo de impostos, taxas e contribuições, cada um com diversas alíquotas e percentuais. São 93 modalidades. Temos o Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante, a Contribuição para Fomento da Radiodifusão Pública e a Contribuição para a Assistência Social e Educacional aos Atletas Profissionais, dentre tantos outros. Alguém conhece algum desses citados? Quanto ao imposto de consumo, o mais regressivo dentre os impostos, tem-se que os Estados Unidos arrecadam apenas 17% de sua carga tributária nessa modalidade, enquanto o Brasil consegue o feito de 65%, quando a média da OCDE se encontra em torno dos 35%. Além do mais, as alíquotas são muito diferenciadas entre esses dois países, bem como a diversificação de alíquotas entre os diferentes bens e serviços é bastante grande. Por exemplo, sobre o abastecimento de água incide uma tarifa de 45% no Brasil, nos Estados Unidos é zero; gasolina 45% enquanto lá é de 15%; na compra de um simples detergente os americanos pagam 6,5% de imposto, contra 45% em nosso país. Uma comparação entre os preços para os mesmos carros nos Estados Unidos e no Brasil aponta um diferencial que flutua entre 20% e 50% em desfavor do nosso país, isso representa uma diferença substancial que decorre quase que exclusivamente dos impostos. Pagamos carros mais caros com um poder de compra bem menor. Legal!

 

A carga tributária brasileira vem, desde há muito, aumentando de maneira significativa. Nos anos 50, a proporção dos impostos no PIB variou entre os 15% e 18%; de 1964 a 1970, essa proporção passou de 17% para 26%, um aumento bastante razoável. Desde então, essa carga flutuou na casa dos 25% até 1994, quando saltou para 29,8% e não parou de crescer, hoje se encontra por volta de 36%, uma carga tributária similar à média dos países da OCDE e bem mais elevada que a de países como Japão, Coréia, Canadá e Estados Unidos. Somos hoje uma Espanha, um Portugal ou um Reino Unido na carga tributária, mas oferecemos serviços públicos dignos de uma Uganda, Moçambique ou Cuba, basta verificar as condições das nossas escolas e hospitais públicos. Afinal, sabemos arrecadar muito bem, mas em contrapartida retornamos pessimamente à sociedade na forma de serviços públicos. Impostos esses que alimentam uma miríade de gastos públicos, muitos deles sabidamente e visivelmente desnecessários, em relação aos quais os sucessivos governos têm muita dificuldade em cortar, a exemplo dos cabides de emprego, que têm uma função bem definida: contribuir nos processos de reeleição de nossos representantes políticos. Benvinda seja uma reforma fiscal que estimule nossas exportações, dinamize nossa economia e nos auxilie a sair dessa maldita recessão, o nível de emprego agradecerá fortemente. É chegada a hora de escrever e gritar: Força ao ministro Guedes e ao nosso Legislativo! Sim, dependemos desse legislativo. Quante brave persone mio Dio.

 

 



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