Você deixa o troco da padaria para trás? E o do táxi? Por mais que você seja generoso, sua resposta provavelmente é não. Mas o brasileiro, seja por desinformação ou desorganização, já abandonou nos cofres públicos alguns bilhões de reais, entre prêmios da Loteria, restituição do Imposto de Renda, abono salarial e créditos da Nota Fiscal Paulista e Carioca.

Segundo levantamento do iG, entre 2010 e 2012, foram esquecidos pelo menos R$ 4 bilhões (R$ 3.999.670.000, para ser mais exato). Com essa soma, seria possível comprar uma série de itens de luxo como, por exemplo, quase três ilhas como a Pineapple Island, localizada em Lanai, estimada em R$ 1,3 bilhão. Também seria possível levar para casa 400 Lamborghini Veneno de R$ 10 milhões.

Quem gosta de moda poderia arrematar de uma só vez 950 bolsas de um dos modelos mais caros da Hermès – uma Birkin Handbag versão joia, feita com ouro rosa ou branco e cravejada com 2.712 diamantes de 90 quilates, de R$ 4,18 milhões cada uma. Não gostou? Que tal 571 coleiras para cachorro da Amour Amour, cada uma por R$ 7 milhões, ou quase a mesma quantidade de sapatos da Harry Winston, cravejados de rubi, de R$ 6,6 milhões cada par. Quem sabe 72 mil sobremesas de chocolate com ouro Frozen Haute, R$ 55 mil cada uma, ou mais de 181 mil Diamond Martini, o drink que vem com um diamante dentro da taça e custa R$ 22 mil.

Nos anos de 2010, 2011 e 2012, a Caixa Econômica Federal ofertou aos brasileiros R$ 10 bilhões em prêmios nas suas dez modalidades de loterias. Independente da quantia total paga aos ganhadores – certamente com muitos zeros – é de se esperar que os sortudos não tenham demorado muito para buscar seus prêmios, certo? Errado. Nesses três anos, R$ 522 milhões referentes a prêmios das loterias federais retornaram aos cofres públicos porque ninguém foi buscar o que lhe era de direito.

Segundo a Caixa, os prêmios das loterias prescrevem 90 dias após a divulgação do resultado do concurso em questão. Ao final desses três meses, os valores são então repassados ao Tesouro Nacional para aplicação no Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES).

A loteria é apenas um dos exemplos levantados pelo iG de prêmios, benefícios e restituições que o brasileiro tem direito ou ganha e que, pelos mais variados motivos, que vão do esquecimento ao desconhecimento, deixa para trás.

Responsável por pagar o Abono Salarial, a Caixa Econômica Federal também devolveu R$ 1,156 milhões aos cofres públicos entre 2010 e 2012, montante equivalente ao total não sacado mais de 2 milhões de trabalhadores que tinham direito ao benefício nos exercícios de 2010/2011, 2011/2012 e 2012/2013.

Segundo a entidade, com a prescrição, o dinheiro é direcionado ao Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat). O valor é de um salário mínimo e o trabalhador tem até, aproximadamente, o início do próximo exercício – cerca de um ano – para sacar o benefício.

Tem direito de receber o Abono Salarial todos os profissionais que tiveram seus dados listados na Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), cadastro no PIS/PASEP há pelo menos cinco anos; ter trabalhado com carteira assinada ou ter sido nomeado efetivamente em cargo público durante, pelo menos, 30 dias no ano-base por empregadores contribuintes do PIS/PASEP (empregadores cadastrados no CNPJ); e ter recebido em média até dois salários mínimos de remuneração mensal durante o período trabalhado.

Imposto de Renda também é abandonado

Todo ano, a Receita Federal recebe cerca de 20 milhões de declarações de Imposto de Renda pessoa física. Deste montante, segundo dados da entidade, apenas 0,5% do total de restituições pagas não são resgatadas pelos contribuintes. Parece pouco, mas não é: dos anos de 2010, 2011 e 2012, a Receita Federal ainda possui em seus cofres restituições de quase 150 mil pessoas que não sacaram sua parte dos R$ 73,6 milhões disponíveis.

O contribuinte que não recebeu a restituição tem um prazo de cinco anos para solicitar, o que, segundo a Receita Federal, deve reduzir bastante os valores atualmente disponíveis. Ainda de acordo com informações do Fisco as restituições não resgatadas no prazo de um ano ficam à disposição dos beneficiários nas unidades da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), e são pagas mediante Ordem Bancária do Sistema de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) para crédito em conta bancária no Brasil.

O pagamento de restituição do IR Pessoa Física não resgatada na rede bancária no prazo de um ano deverá ser requerido por meio do formulário eletrônico “Pedido de Pagamento de Restituição”, disponível em três locais: na página da Receita, no Centro Virtual de Atendimento ao Contribuinte (e-CAC), e nos centros de atendimento espalhados pelo País.

Nota Fiscal Paulista já cancelou milhões em créditos

Um dos mais antigos programas de reembolso parcial de tributo, a Nota Fiscal Paulista devolve 30% do ICMS efetivamente recolhido pelo estabelecimento a seus consumidores. Seu objetivo é incentivar os contribuintes para que adquiram mercadorias com documento fiscal.

Em funcionamento desde 2008, o Nota Fiscal Paulista já distribuiu mais de R$ 9 bilhões em crédito e mais de R$ 1 bilhão em prêmios. Somente nos anos de 2010, 2011 e 2012, foram R$ 4,7 bilhões. Destes, R$ 2,2 bilhões permanecem nos cofres públicos paulistas.

Segundo a Secretaria de Fazenda do Estado, os consumidores têm até cinco anos para resgatar seus créditos no programa, a contar da data da liberação dos valores (que ocorre em abril e outubro de cada ano). Só em 2013, foram cancelados R$ 130 milhões em créditos liberados desde o início do programa, que voltaram a compor o tesouro do Estado de São Paulo.

Os consumidores que informarem o seu CPF ou CNPJ no momento da compra poderão escolher como receber os créditos e ainda concorrerão a prêmios em dinheiro. Para participar não precisa necessariamente residir em São Paulo, mesmo pessoas de fora que compram produtos de empresas inscritas em São Paulo podem retirar o benefício, basta informarem o seu CPF ou CNPJ no momento da negociação. Compras feitas pela internet também valem.

Nota Carioca tem créditos deixados para trás

Programa similar à Nota Fiscal Paulista, mas de caráter municipal, a Nota Carioca gera créditos ao cidadão que que equivalem a 10% do valor do ISS. Segundo informações da Secretaria da Fazenda da cidade do Rio de Janeiro, a Nota Carioca é um programa de benefícios que oferece aos consumidores que fornecem o CPF na hora da compra a possibilidade de abater em até 100% o valor total do IPTU ou resgatar os créditos em dinheiro (modalidade disponível desde março deste ano), por meio do depósito em conta corrente, e ainda participar de sorteios.

Nos dois anos de existência do projeto, criado em 2011, já foram estocados créditos equivalentes a R$ 11,07 milhões em 2011, e a R$ 37 milhões em 2012, o que totaliza um montante de R$ 48,07 milhões em créditos deixados para trás ou esquecidos pelos cidadãos cariocas.

De acordo com a Secretaria, os créditos permanecem ativos no sistema até o mês de setembro do segundo ano seguinte ao que foram gerados. Diferentemente do que acontece em outros programas, os créditos não utilizados pelos contribuintes não retornam aos cofres públicos, já que, de acordo com a assessoria do município, a Nota Carioca é "um programa de benefícios para o qual se estabelece uma provisão", uma espécie de previsão de gasto que só é feito se solicitado.