Cultura

Dida Fialho analisa Arrigo Barnabé homenageando a vanguarda de Itamar Assunção


12/04/2024

O músico e compositor Arrigo Barnabé (Foto: Divulgação)

Portal WSCOM

ARRIGO BARNABÉ

∆RR!B∆!

Quantas cabeças tem Arrigo Barnabé?

Acho que é um bicho de sete cabeças.

Um artista crocodilo, que se veste de fantasias, para sair salvo do pântano da mediocridade.

Firmou-se para um público seleto, interpretando sua arte genuína, acelerando o nosso coração.

Um artista verdadeiro, tem uma couraça profissional, que protege seu talento, e lhe assegura, suporte emocional,  para correr a maratona de altos e baixos e cuidar da carreira.

Iguais aos cactos, que vivem com pouca água, os artistas autorais sobrevivem à aridez do deserto independente da moda mercadológica.

Sempre na resiliência, artistas são observados pelos seus fãs, e como referências tentam preencher o vazio do público oferecendo-lhe um projeto acabado que não seja apenas óbvio ter contexto para se livrar do óbito da inspiração.

A vanguarda paulistana não morre, está viva.

Renasce junto ao lodo da cidade que segura à peteca da inovação, desde a primeira Semana de Arte Moderna onde impulsionou o conhecimento de nossa Cultura, e  estabeleceu no país sua própria cara, mostrada e refletida no espelho, nosso complexo, vira lata.

Nascido em Londrina, no Paraná, Arrigo Barnabé, sobrevive brilhantemente sem necessidade de lantejoulas.

Conseguiu fundir o erudito com o rock e o popular.

Dentro desta mistura eletrônica, produz sua vibração sônica, atonal e atemporal.

No início, em um passado bem distante, o Teatro Lira Paulistano, era o espaço de muitas trupes e segmentos, um diferencial explosivo diante de uma plateia plural e alucinada.

Quantas Áfricas, couberam no corpo e na memória de Itamar Assunção?

Sua densidade negra escorria para todos os lados quando cantava seus orixás, na força singular de sua ancestralidade.

Sua “pegada”, como afirma Arrigo Barnabé, não é solar como a de Jorge Ben Jor.

Itamar Assunção personifica as coisas doídas da ingratidão de um sistema cego e  padronizado, que mata todo santo dia, negros nas periferias.

É a carne mais barata do mercado?

Quantas feridas abertas dentro e fora, Itamar Assunção teve de suportar?

Sua arte virou escola pra muitos que achavam que Sampa era o túmulo do Samba.

Logo São Paulo, que pariu Rita Lee e os Mutantes.

Acolheu o baiano tropicalista, Tom Zé, dando-lhe, régua e compasso, para poder  transformar a irrequieta arquitetura musical, trazendo para a Paulicéia desvairada, de cara “amarrada”, seu tempo cinzento original e frio.

Arrigo Barnabé, criador notável, nunca teve rótulo midiático.

Seu novo espetáculo cria junto com Trisca, e “banda inteira” fazem justiça com as próprias mãos e bocas, homenageando o rebelde Itamar Assunção, pedra fundamental que abriu um novo ciclo após a “Bossa Nova”.

Arrigo, nunca teve pressa.

Sempre passou sua originalidade por onde passa, sem nunca ter tomado café da manhã com Ana Maria Braga, onde ali, em mesa farta , alimenta apenas a fome midiática do sucesso descartável, banal, e fútil, visando apenas o consumo dos produtos patrocinados.

Quantos olhos e ouvidos sadios, ainda restam neste país cego e surdo?

Quantos artistas, do nível de um Arrigo Barnabé, terão projeção igualitária?

O poder visceral que tem a música de Arrigo Barnabé, é impactante.

Sua musicalidade é um meteoro destruidor de caretices, fascistas, cruéis defensores do conservadorismo circulante entre nós, passando pelas margens podres dos rios poluídos.

Neste momento decadente, que estamos vivendo no país, nos encontramos com um nó na garganta e o peito nu, entalado.

Paradoxalmente, temos uma Cultura rica e imensa, para descobrir neste continente tropical.

 

Dida Fialho é cantor, compositor, ator e instrumentista. (Foto: Reprodução)


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