Política

Couto fará debate permanente sobre repressão a protestos

COMISSÃO NA CÂMARA


20/09/2016

A Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados realizou no último dia 14 uma audiência pública para debater a criminalização e repressão aos movimentos sociais.

Além de trazer uma oportunidade de abrir os microfones para vítimas de violência policial denunciarem crimes que sofreram durante manifestações, a audiência resultou em uma série de providências e encaminhamentos que a CDHM tomará a partir de agora.

Uma delas foi resultado de uma proposta do deputado Luiz Couto (PT-PB) para que a oitiva de manifestantes e pessoas ameaçadas em protestos seja uma ação permanente da CDHM.

"Estamos vivendo um momento em que acontecem ao ar livre torturas típicas da ditadura. A tortura e a violência estão nas ruas. As polícias foram treinadas durante a ditadura para espancar e atualmente há um monitoramento contra os movimentos sociais. É um processo que não podemos aceitar e por isso considero que essa discussão tem que se dar de modo permanente", disse Couto.

Os relatos apresentados na audiência foram fartos em narrar uma série de crimes perpetrados por agentes públicos atentando contra direitos humanos fundamentais. Foi o caso, por exemplo, do advogado Mauro Rogério Silva, que ao tentar auxiliar manifestantes detidos sem razão em uma manifestação contra o governo de Michel Temer em Caxias do Sul (RS) no dia 31 de agosto, foi detido, espancado e torturado.

“Fui dialogar com os policiais e, ao apresentar minha carteira de advogado da OAB, contei seis segundos para ser jogado contra a parede e algemado. Algumas pessoas gravaram um vídeo do ocorrido, mas ele não mostra os horrores que foram praticados contra mim. Na delegacia, sofri ações de tortura, pra causar dor, sofrimento e humilhação. Usaram comigo uma técnica de tortura que eles chamam de “pacotinho”, uma espécie de pau de arara moderno”, relata.

Mesmo após sua liberação da delegacia, Mauro conta que sua vida nunca mais foi a mesma. Ele está sofrendo ameaças de morte e tanto ele como seus filhos tiveram suas vidas devassadas, com informações pessoais deles circulando em grupos de policiais em aplicativos de mensagens.

A história do também advogado Renato de Almeida Freitas é semelhante nos contornos das agressões. Abordado por estar escutando rap em uma rua de Curitiba (PR), Renato foi vítima de racismo e agredido física e psicologicamente antes de ser colocado em um camburão. “Diziam que um ‘negrinho’ como eu jamais poderia ser advogado e me bateram de muitas formas. Minha sorte é que dentro do camburão consegui pegar meu celular que estava escondido e postei em uma rede social que estava sendo preso sem motivo e levado a uma delegacia. Quando eles descobriram, apanhei ainda mais, incluindo pisões na face e nas mãos”, narrou.

A médica Maria Alessio, por sua vez, teve que ser conduzida a uma delegacia em Brasília (DF), no dia 31 de agosto, por buzinar em apoio à manifestação que apoiava a presidenta Dilma Rousseff, afastada no mesmo dia pelo Senado. “Sofri todo tipo de intimidação, me cercaram com viaturas policiais e tiravam fotos de mim e do meu carro. Depois me conduziram até a delegacia em uma espécie de ‘escolta’ pelo simples fato de eu manifestar apoio a uma manifestação”, conta.

No entanto, não é apenas na face da repressão que as forças de segurança violam os direitos humanos, ressaltou o jornalista Fausto Salvadori Filho, autor de reportagem que denunciou a infiltração do oficial do Exército William Pina Botelho em movimentos sociais, descoberto após sua atuação na prisão indevida de 26 pessoas em uma manifestação contra o governo Temer em São Paulo. “Descobrimos que a atuação deste infiltrado vinha desde 2015, quando participou de reuniões de diversos movimentos sociais e entidades ligadas à esquerda”, afirmou. “No caso de São Paulo, a Secretaria de Segurança Pública se recusou a comentar o episódio e as Forças Armadas jamais admitirão que fazem uso de expedientes desse tipo, mas é uma prática recorrente desde antes do governo atual assumir, o que pode representar uma atuação independente destes grupos”.

Com base nos relatos da audiência, o presidente da CDHM, deputado Padre João, informou que a comissão tomará as seguintes providências:
1. Articulação com as redes de direitos humanos:

a) para a retomada do Fórum de Direitos Humanos pela Democracia, como espaço de monitoramento da situação das violações de direitos humanos;

b) para o fortalecimento da Campanha Mais Direitos, Mais Democracia;

c) para formalização de denúncia internacional das violações de direitos humanos ocorridas no contexto do golpe que tem vitimado a democracia brasileira, tanto do ponto de vista do retrocesso nas políticas públicas que asseguram direitos, quanto do ponto de vista do uso ilegítimo do aparato repressivo estatal;

d) para engajar mais fortemente as Comissões de Direitos Humanos das Assembleias Legislativas e das Câmaras Municipais no processo de monitoramento das violações de direitos.

2. Vamos pedir providências investigativas, para aplicação das sanções penais e administrativas cabíveis por conta do uso indevido do aparato policial, aos seguintes órgãos:

a) Ministérios Públicos do Rio Grande do Sul, de São Paulo, do Paraná e do Distrito Federal, que exercem o controle externo da atividade policial;

b) Ouvidorias e Corregedorias de Polícia desses estados;

c) Secretários de Segurança Pública do Rio Grande do Sul, de São Paulo, do Paraná e do Distrito Federal, e à Prefeitura de Curitiba, que exercem controle hierárquico

3. Solicitaremos providência à Procuradoria Geral da República a fim de responsabilizar os agentes que promoveram o uso inconstitucional de forças militares e do aparato de inteligência, considerando que o uso das Forças Armadas é exclusivo para defesa externa, e para garantia da lei e da ordem interna e a pedido do Presidente da República, exclusivamente

4. Buscar a aprovação de requerimentos de convocação dos ministros da Justiça, do Gabinete de Segurança Institucional e da Defesa para prestação de esclarecimentos, pois os deputados da base governista

5. Solicitar manifestação da Ordem dos Advogados do Brasil sobre sua atuação na defesa das prerrogativas de advogados

6. A Comissão de Direitos Humanos e Minorias fica aberta para recebimento das denúncias, e os deputados membros podem, em nome da comissão, atuar de modo a socorrer e mediar pelo resguardo dos direitos humanos. 



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