Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Cultura

Walter Galvão


10/07/2021

Para Jória e Clarice

Passamos  a semana consternados com a partida silenciosa e sofrida do amigo Walter. Desde fevereiro que acompanhávamos esse estado de doença, agonia e partida. E eu ainda mandei receitinhas de comidinhas para o pós operatório da vesícula, quando ainda pensava que fosse tudo mais simples. Não era. Ainda pude ouvi-lo em áudio, falando da amada e me agradecendo. Imagina Walter! Nem sabiam ainda o que estaria por vir. De lá para cá, só apreensão.

Quando enfim, veio a notícia, um baque. A morte é sempre um mistério de incompreensão e perplexidade. Fiquei emocionada de ler tantas mensagens lindas. Textos de amor e despedida de um sem número de amigos, jornalistas, artistas. Todas as belezas de amor e admiração tais como: “um homem de ação cultural; ser plural; livre pensador; mestre; inspiração; aberto ao diálogo; militante do pensamento”.  Por experiência própria, ler todo esse carinho, conforta. E desespera. Por absorver ali, a concretude da realidade. Aconteceu de verdade! Kubitscheck, Silvio Osias, Felipe Gesteira, Damião Ramos, Gonzaga Rodrigues, Walter Santos, Linaldo Guedes, Alexandre Macedo, Carlos Aranha e  muitos outros das redações ou dos terraços de casa, falaram amorosamente de Walter. Todos em uníssono a falar do homem gentil, culto, elegante, político, ético, multi media, erudito, talentoso, comprometido, capaz, intelectual, poeta, escritor, ensaísta, desportista e amante dos gatos. Junto à Jória. Mas nada me emocionou mais que os textos de Kubitscheck, o de Silvio Osias, e a sexta musical (programa semanal de Silvio), pois este último evocou também as minhas próprias trilhas sonoras.

Conheci Walter há décadas. Mas não lembrava dele crooner. Passou o filme para imaginá-lo cantando naqueles tempos dos conjuntos de rock ou similares. Conheci-o da vida. Jovem. E depois, acompanhei transversalmente, o seu amor/paixão pela sua companheira amada, Jória Guerreiro, amiga da vida toda da minha irmã Claude. E que, depois, chegou perto de mim também, como a maioria das amigas das minhas irmãs. Depois, vi Clarice (filha) nascer, e de como gostei da escolha desse nome. Achei que era por conta da outra Clarice, a Lispector. E todos os corações selvagens e águas vivas, para quem chegava a esse mundo. E a cada vez que encontrava Walter, muito me encantava, a sua voz de veludo azul, de valsa alegre, quando mencionava o nome de “Clarice”. Era puro derretimento. Ternura. Amor.

Já com a vida andando, vim a saber que éramos parentes. Um primo distante. Gostei disso. Mas não fui tão próxima de Walter. Digo de encontrar, conversar, frequentar. Mas onde estivéssemos, sempre chegaríamos para abraços e papos. Era sua leitora nos jornais. E ficava perplexa com o seu conhecimento plural.

Recentemente, recebi as suas duas últimas publicações. Com autógrafo impregnado. Já sabia que “não queria durar, mas viver”, e como parecia que nem a duração e nem a vida lhe acariciavam, se apressou em por o seu ponto final, ele mesmo.

Walter foi a primeira pessoa que publicou uma crônica minha. Por ironia, um texto que escrevi quando da morte do meu pai, Romero Peixoto, em 1993. Fui lá na sede do Jornal O Norte, com meu papel na mão – “Romero, meu pai” – e ele publicou para minha alegria. A partir daí, sempre me recebia, nos meus trajetos literários, ou não; e me dizia: “Ana, textos mais curtos, não tenho todo esse espaço!”. Eu perdida ainda nas linhas tortuosas do meu pensamento;  tão prolixa, e tão verde, achava que a página era minha. Mas a delicadeza e o carinho com que me orientava, me estimulavam. E quando lancei meus dois livros em 2016, fui lá na União com o editor Juca Pontes, levar as suas cópias de presente. A ponta do novelo reencontrando uma outra ponta.

Jória? Sei que vai ser muito difícil continuar a vida sem o seu companheiro e o seu amor. Um buraco vulcânico! Um vazio inimaginável. Ficar viúva deveria ser proibido. Mas, a certeza de ter vivido um grande amor, isso  é tudo o que se leva dessa vida. E os seus gatos. Mamãe – Coragem ! Rayovac e Mini. Dizem que os gatos pertencem à vida sutil. E a vida é soberana. E junto com Clarice e D. Eliane, a força das mulheres Guerreiras. E a legião dos amigos. Farás parte do Clube de Rosa Montero e a sua ridícula ideia de nunca mais te ver!

Walter, te agradeço pelo carinho de sempre. Siga na luz.

Com respeito e admiração. E saudades!

PS- (vou me ausentar deste espaço por um tempo, mas volto já)

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa, 10 de Julho, 2021


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