Política
Um herói pouco conhecido
08/06/2025

Neste espaço, na última quinta-feira, fiz menção a um episódio que ficou conhecido como o “caso Para-Sar”, ocorrido em junho de 1968. Nele foi revelado um herói pouco conhecido pelos brasileiros. O capitão Sérgio Ribeiro Miranda de Carvalho, alcunhado como Sérgio Macaco – apelido que recebera ao tempo em que foi campeão estadual de basquete, jogando pelo Grajaú- teve a coragem de denunciar, durante a ditadura, um plano da extrema direita militar do Brasil para explodir o Gasômetro do Rio de Janeiro, o que provocaria milhares de mortos. A operação recebera o nome de “bandeira falsa” e visava produzir o expurgo da oposição.
O brigadeiro João Paulo Burnier, egresso da Escola das Américas, instituto subordinado ao Departamento de Defesa dos Estados Unidos, tinha a incumbência de produzir a “contra insurgência comunista” e fornecer treinamento de técnicas de tortura aos militares latino-americanos. Era um radical da extrema-direita nas Forças Armadas brasileiras.
Em 12 de junho de 1968, o brigadeiro Burnier convocou o paraquedista Sérgio Macaco para uma reunião. Na oportunidade afirmou que o Para-Sar deveria exercer uma missão que salvaria o Brasil do comunismo. Seu plano previa uma série de atentados terroristas, com o propósito de desenvolver uma violenta campanha para eliminar os opositores do regime, pois a ideia era atribuir à esquerda a realização desses atos criminosos, na convicção de que a catástrofe causaria uma comoção popular com os cidadãos exigindo a caçada aos comunistas. O alvo principal desses atentados seria o Gasômetro São Cristóvão, um complexo de três reservatórios de gás, que abastecia toda cidade do Rio de Janeiro. Além disso, estava programado o assassinato de 40 líderes políticos e militares críticos ao regime, dentre eles JK, Jânio Quadros, Carlos Lacerda, Dom Hélder Câmara, Vladimir Palmeira e Mário Covas, cujos corpos seriam atirados ao mar.
No final da reunião, Burnier perguntou aos presentes se estavam de acordo com o plano. Apenas o capitão Sérgio Macaco afirmou que não, pois considerava a proposta “imoral e inadmissível para um militar de carreira”. Recebendo ordem de se calar, reagiu dizendo: “não me calo. E enquanto eu estiver vivo isso não acontecerá”.
No dia seguinte, Sérgio, juntamente com seu amigo Délio Jardim de Matos, foi ao encontro do brigadeiro Eduardo Gomes, ex-comandante da Aeronáutica, a quem comunicou o plano terrorista concebido. O brigadeiro Itamar Rocha, ao tomar conhecimento, decidiu abrir sindicância para apurar a denúncia, motivo pelo qual foi exonerado. O ministro da Aeronáutica, Márcio de Sousa Melo, resolveu proteger Burnier, condenando o capitão Sérgio a 25 dias de prisão por insubordinação. Com a edição do AI-5 ele foi cassado e compulsoriamente reformado, sem direito a receber o soldo. Por outro lado, Burnier foi promovido a Comandante da 3ª. Zona Aérea.
Esse herói, pouco conhecido em nossa história, recusou solicitar benefício da Lei da Anistia, em 1979, pois não admitia receber “perdão” por um crime que não havia cometido. Vítima de câncer no estômago, Sérgio Macaco morreu em 5 de fevereiro de 1994 sem ter sua patente restabelecida ou receber a promoção a que tinha direito, pois o ministro da Aeronáutica, Lélio Viana Lobo e o presidente Itamar Franco, recusaram cumprir a decisão do STF que o promovera a brigadeiro. Somente em 1997, a família de Sérgio Carvalho foi indenizada pelo governo com o valor relativo às vantagens e soldos que ele deixou de receber entre os anos de 1969 e 1994.
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