Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

The Crown


22/02/2017

Foto: autor desconhecido.

The Crown

The Crown é uma série de televisão anglo-americana criada e escrita por Peter Morgan para a Netflix. A série é uma história biográfica sobre a família real do Reino Unido. Foi vencedora do Globo de Ouro de melhor série dramática e também o Globo de Ouro de melhor atriz em série dramática para Claire Foy, no papel de Elizabeth II. A primeira temporada, que estreou em 4 de novembro de 2016, está disponível com 10 episódios. Peter Morgan, que escreveu o filme A Rainha, de 2006 escreve o roteiro com o diretor Stephen Daldry, de As Horas.

A história passeia pela vida da Rainha Elizabeth II, desde o tempo do seu pai, o Rei George VI, (imortalizado no Cinema por Colin Firth no filme, O discurso do rei), sua morte, a coroa que cai de repente na cabeça da filha mais velha, aos 24 anos?!, sua imaturidade, ingenuidade, not-ready para um fardo/peso/orgulho/reinado. Seu casamento, sua paixão por Philip, por cavalos e seu crescimento como mulher/pessoa/rainha.
A série é deslumbrante. Na reconstituição, na escolha dos atores, em especial para John Lithgow, no papel de Winston Churchill, e os seus mais de 50 tons de anos à frente da política Britânica. Tive oportunidade de visitar sua casa e jardins, e, assistindo à série, me transportei no tempo e espaço. E na beleza dos jardins Ingleses.

A monarquia Britânica sempre despertou fascínio no mundo. A nossa porção contos de fada é tomada de beijo pelo príncipe da Bela Adormecida, e entramos no conto da Cinderela com carruagens e tudo. Vivi esse reinado nas minhas fantasias, sempre lendo e acompanhando as notícias dos bastidores, os escândalos, a Princesa Diana, sua morte, seus filhos, William, casamentos, príncipes, etc. Ou nas visitas às redondezas do Palácio de Buckinham, Parque Saint James, e adjacências.

Na Série, gostei de conhecer a personalidade da Rainha, forte e bela, mas do que seus olhos cor de esmeralda. Enfrentou às fragatas, observou atenta às fanfarrices débeis do marido, acariciou seus cavalos, enfrentou sua mãe, avó, os ministros, o próprio Churchill, o glamour e competição da sua irmã Margareth, e todos os percalços que lhe apareciam por trás das inúmeras portas e corredores seculares. E se incomodou em não ter tido uma “proper education”. Cobra da mãe o por quê? E esta lhe responde que não precisava aprender nada mais, mas como se comportar e silenciar. Que nem eloquente precisava ser! Claro que ela interdiz, alegando que não quer ficar à sós com os estadistas e não saber falar de nada. Contrata um Tutor e pesquisa sobre o Presidente americano, Eisenhower, e política externa, Império, Colônias, Poder, e outras coisas que não fosse somente as crinas e rabos.

O humor Britânico é mostrado com requintes de ironia. Como na cena do cruzamento do cavalo preferido da Rainha com uma égua, nem muito atirada, nem muito recatada (ou do lar?!). A cena é toda intermediada entre a raiva e ciúme que o Príncipe Philip está do treinador de cavalos (antigo pretendente da Rainha), e uma linguagem nas entrelinhas entre, o sexo dos monarcas, e o das éguas, nos faz, literalmente, rinchar de rir!

Mas uma das minhas cenas preferidas foram as do Churchill sendo retratado pelo pintor – Graham Sutherland (interpretado pelo ator, Stephen Dillane, que também fez o magistral Mr. Leonard Woolf em As Horas). Aliás várias pitadas desse meu filme particular: Os Stephens- Daldry e Dillane; e indiretamente o ator que faz o dono do castelo na Escócia, para onde a Rainha Mãe vai descansar, é o mesmo que faz Richard Dalloway, marido de Mrs. Dalloway, no filme do mesmo nome.

No pintar o retrato de Churchill para a posteridade, inimaginável o diálogo que se estabelece entre o que seja um retrato?, aparências, verdade x ficção, o que mostrar ou não, o que fica na memória ou não, as cores, as pinceladas, os tons na palheta, as mãos, o charuto, as névoas da fumaça e da personalidade de alguém tão poderoso e que também pintava e entendia das nuances dos rascunhos e das telas em branco. Os dois ficam amigos, confidenciam perdas (das filhas: Sutherland perdeu um bebê de 2 meses, Churchill a sua Marigold, com poucos anos). E logo Sutherland, com seu silêncio perspicaz, descobre o segredo do Ministro. Havia pintado o lago de sua casa mais de vinte vezes. E todas as cartelas das cores estavam lá. Churchill se surpreende com a sutileza do comentário e confessa que o lago foi construído para Marigold. Toda a sua saudade, dor, e melancolia pela perda da menina enfim, retratada na descrição de um “Pond”. Que águas sombrias seriam essas? Cada um esconde o que pode, onde consegue. Mas o nosso inconsciente fala sozinho como ventríloquo, e a ele não podemos driblar.

Ao final, quadro pronto para a celebração dos 80 anos de Churchill, este não gosta do quadro. Está decadente, patético e feio, esbraveja. O real? Tudo o que não queria. E Sutherland então lhe diz bravamente: Mas isso tudo é o Senhor! Inclusive essa decadência e feiura. Nenhum pedido de renúncia pela oposição ou até mesmo da Rainha foi convincente para de fato Churchill o fazê-lo, mas ver-se retratado como um “Dorian Gray”, sem alma vendida , foi demais para homem tão poderoso. E Churchill renuncia ao se deparar com o que diz o poema de Cecília Meireles: Retrato- “Eu não tinha este rosto de hoje, assim calmo, assim triste, assim magro, nem estes olhos tão vazios…” Aonde está o meu rosto? Ou tantos outros poemas que falam do rosto perdido nosso de cada um.
Como não relacionar também com um conto do também escritor Inglês, D. H. Lawrence – “The Horse Dealer´s Daughter”, uma pequena amostra da arte desse que sabia tanto falar das relações amorosas, da decadência dessas mesmas relações, da oposição do instinto x intelecto, do não vivido. Nesse conto também temos um certo lago de água parada, símbolo da morte, onde a protagonista tenta suicídio, mas que logo é salva para enfim viver um grand finale de entrega e paixão, para finalmente acontecer a epifania, elemento tão recorrente nos contos modernos.

Em The Crown, o espectador também se extasia com a exuberância e beleza da paisagem do countryside Britânico, dos cliffs e cores monocromáticas da costa Escocesa, seus castelos, e toda a pujança da décor dos palácios de reis e rainhas da segunda metade do Século XX. A continuação de The Crown já vem por aí, para, assim como outra série magnífica – Dowton Abbey – traçar não somente a monarquia Britânica, mas também o seu declínio, e suas transformações políticas e sociais que ocorreram no mundo e o surgimento de novos tempos.

Do lado de cá, ficamos sonhando. Não com rainhas mais. Mas com toda essa magia que essas estórias continuam nos assombrando.

Ana Adelaide Peixoto. João Pessoa 20 de fevereiro- 2017
 


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