Ramalho Leite

Jornalista, escritor e historiador.

Geral

TESTEMUNHAS DA POBREZA (2)


25/01/2019

Foto: autor desconhecido.

( Anotações em torno do livro de Zélia Almeida, continuação)

E por aí segue a história da ascensão da riqueza e da dor da pobreza no brejo. A saga da Usina Santa Maria, desde sua montagem é contada com detalhes. Hoje, suas terras estão encobertas com o verde das bananeiras, com muitos pés e poucos cachos. Antes, nos engenhos, a agave suprira a deficiência da cana. O café ficou para a história. As florestas cederam à pressão do machado. Resta ainda um clima úmido e frio que atraem moradores e visitantes.

José Faustino, abandonou o eito pelas ruelas da cidade e encontrou alegria nas carnes rijas de Maria Mansidão. Como vigia das matas, tinha que manter o patrimônio dos patrões. “O prazer não pode ser eterno. A vida vem, a vida vai. Bem ou mal se vive. Na dor e no prazer.Com pouco ou muito. A miséria é triste”. A difícil sobrevivência levou cedo o trabalhador. Era difícil encher a barriga de comida. Encheu a “barriga d´água” e morreu disso. José Machado, encheu a sua de lombriga. A miséria é mesmo triste.

Horácio vendia bananas. O pequeno comercio dava para o seu consumo. Dois filhos, mas nasceram invertidos. Enquanto Ciro adorava brincar de bonecas, Cira dominava os bichos com jeito de homem. Só tinha uma solução. Ir embora para São Paulo. E foram. Lá cada um assumiu seu destino e ficaram arquivados para sempre os maldosos comentários dos vizinhos. Longe, os filhos ganham bem. Muito mais que o salário mínimo…Encontraram o seu prazer. “Dor, basta esta, que ficou”.

Para Zelia Almeida, “incomoda contar e analisar à luz da Teoria da Dor e do Prazer a dinâmica das vidas e como são afetadas, pessoas e comunidades”.Severina, Maria, José, Tiago, não importa o nome, são sombras de homens e mulheres que a pobreza deixou viver, na dor e sem direito a qualquer resquício de prazer. O desmatamento, a mudança do clima e incerteza de inverno, mudou o brejo. O sertanejo já nasce sabendo viver com a seca. O brejeiro tem que aprender. Secam os mananciais, morrem as plantações e, na terra de Canaã começa a faltar agua nas torneiras que passam a ser controladas por um raciona mento indesejado. Outro caminho deve ser procurado para desenvolver a região. Temos história, temos paisagens belíssimas, temos cultura e um clima europeu onde moureja um povo acolhedor.

Um novo norte se acende e esse caminho aproveita a estrutura econômica existente. A produção da cachaça nos engenhos que restam se transformam em pontos de visitação turística. A oferta de leitos de hospedagem se expande. Em Areia e Bananeiras surgem empreendimentos destinados à construção de moradias de lazer. Os condomínios fechados atraem investidores interessados em estabelecer uma segunda residência. Essa nova indústria, sem chaminés, atrai novos braços qualificados e implementa a geração de renda. Nem tudo está perdido. Calaram as sirenes das usinas, mas os alambiques continua m a destilar o melhor produto da cana. A Dor da Pobreza e  Resíduos de Prazer no Brejo da Paraíba pretende mostrar, através da vida das testemunhas aqui arroladas, a riqueza de uma região que, perdidas as suas fontes de produção, gerou a pobreza, extrema em alguns casos e, aliviada, apenas, por programas sociais que têm conseguido manter o pão na mesa do trabalhador. A economista Zelia Almeida consegue dotar de beleza, a vida daqueles que sofrem “a dor de não ter, a dor de não possuir”. E nessa agonia infernal, ainda encontram momentos de alegria e prazer.


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