Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

SIM! A MULHER PODE


02/11/2010

Foto: autor desconhecido.

 Eu gostaria muito que os pais e as mães das meninas pudessem olhar hoje nos olhos delas e dizer: sim, a mulher pode", afirmou Dilma, que chega ao Palácio do Planalto com mais de 55 milhões de votos.

Ainda celebrando a festança de ontem, estou aqui no computador, quando já tinha uma crônica pronta, mas não posso deixar de comemorar a primeira presidente eleita no Brasil, Dilma Rousseff. Confesso que não acho Dilma das mais simpáticas, e discordei tanto de algumas das suas posturas, principalmente a formulação daquele documento para fazer as pazes com os evangélicos, depois de ter sofrido de tanto bombardeio, vendo a hora arriscar sua candidatura, pelos horrores da difamação, assim como também aconteceu nas eleições locais. Ontem, tive dois motivos para comemorar na praia, junto com toda uma população em festa, aqui e lá.

Muito me emocionei, quando Dilma Rousseff, em seu primeiro pronunciamento como presidente eleita do Brasil, realizado neste domingo (31) em Brasília, a petista prometeu "honrar as mulheres brasileiras" para que um fato como sua eleição " se torne um evento natural" e se amplie para o restante da sociedade. Depois de vencer a disputa pelo Palácio do Planalto com mais de 55 milhões de votos, a ex-ministra-chefe da Casa Civil parafraseou o slogan "Yes, we can" do presidente norte-americano Barack Obama., mencionou o fato de ser mulher, e de que agora um pai poderá dizer para sua filha: Uma mulher pode! Lembrei com tristeza de um vizinho aqui de casa no Bessa, um homem simples, do interior, e que tinha um curral e entedia de bois, digo de vacas…. Um dia disse feliz que, sua nora estava “prenha”. Quando achei que já tinha dado tempo do bebê nascer, perguntei-lhe um dia, quando passava aqui em frente de casa enquanto eu aguava o jardim (sim, já tive tempo para isso): “E aí Sr. João, e o neto, já nasceu?” e ele tristíssimo: “Perdemos a cria”. Eu assustada, fui lhe abraçar, desejar pêsames. Quando de sobressalto, ele se antecipou: “É uma fêmea!”. Eu, engoli seco, e senti um soco no estômago. E quase tomei e dei um banho de mangueira para ver se acordávamos de uma vez. Contei essa estória quando do Encontro Feminista das Mulheres da China, final da década de 90, pois não é que agora, ouvindo Dilma, gostaria de reafirmar para Sr. João que já morreu há anos: Uma mulher pode, Sr. João. Yes, we can!

Outro dia, ouvindo Miriam Goldberg, antropóloga com muitos livros publicados que envolve o universo das mulheres, e que acaba de lançar um livro resultado da sua pesquisa sobre fidelidade, e já lançou um outro sobre intimidade, ressaltava o fato de que o que as mulheres mais querem na vida é intimidade e os homens compreensão, alertando assim para o fosso mais profundo entre os dois sexos. Enquanto nós mulheres queremos escuta, os homens , além de não estarem dispostos a escutares, ainda querem que tenhamos muiiiiiiiiiiiiita compreensão para os seus atos, posturas, e faltas. Mind the Gap! Goldberg também afirmou que, nas suas pesquisas, já se consolidou uma postura de realizações das mulheres frente ao mundo objetivo: trabalho, estudo, etc. Mas que, no plano subjetivo, as mulheres ainda estariam em estado de miséria; distância essa pertinente para que se continuem estudando sobre a subjetividade das mulheres, e dessas forças ocultas, não ditas e tão poderosas.

Fico aqui matutando como a nossa presidente teria acordado hoje, com um misto de cansaço, excitação e susto talvez, e como andará essa mulher poderosa, capaz de derrubar um candidato tão forte e competente como o Serra. Uma mulher recém saída de uma cura de um câncer; uma não unanimidade dentro do PT, quando muitos a olhavam com desconfiança; uma mulher acusada de ser guerrilheira(?) e mentirosa, quando na verdade emocionou o país ao responder na CPI, ao então Agripino Maia, quando a acusava de mentir, e ela com o dedo em riste, retrucou com o nó na garganta: em tortura ninguém diz a verdade senador, pois é a vida dos outros e a sua própria que está em jogo. Desde aquele momento passei a ver essa mulher de origem búlgara, imagem pesada, e que não agrada a todos/todas, de forma diferente. Ali vi uma guerreira empoderada e preparada para enfrentar os homens. Sim, porque presidir este país gigante, tem-se que primeiro enfrentar os sexos. A campanha presidencial que não me deixa mentir. Acusada de estar dentro do armário, de ser cínica, fake, cínica, covarde, e de tantas outras questões mais que nunca preconceituosas, mostrou ontem nas urnas que está pronta para assumir o cargo de primeira presidente do Brasil.

Virginia Woolf em seu livro Um Teto Todo Seu, discutia a valoração dos percursos/trajetórias/trabalho feminino x masculino, dizia que: “Gosto das mulheres. Gosto de sua informalidade. Gosto de sua inteireza. Gosto de seu anonimato…Nunca fizeram uma descoberta, sacudiram o Império….Geramos e instruímos e lavamos. Sem nossos trabalhos os mares não seriam navegados, e as terras seriam um deserto.” Os tempos mudaram, um século já se passou desde os tempos de Mrs. Dalloway, e hoje, Dilma Rousseff gerou, instruiu, lavou e agora, poderá navegar por lugares nunca dantes navegado e , transformar nossas terras ainda áridas, em belos jardins, jardins esses buscados antes por nossas mães e avós, para me referir e reverenciar, ao belíssimo texto da escritora americana Alice Walker (A Cor Púrpura), “In Search of Our Mother´s Garden”.

Coincidentemente, Walker, por ocasião da eleição de Barak Obama, também escreveu-lhe uma carta onde, dentre outras coisas e sabiamente lhe dizia: “A primary responponsibility that you do have, however, is to cultivate happiness in your own life”. (Uma principal responsabilidade que o Senhor terá no entanto, será cultivar à felicidade na sua própria vida). Gostei dessa sugestão uma vez que, os homens públicos tem a mania de se esquecerem da sua vida íntima (com exceção de Sarkozy, pois vi um documentário sobre Carla Bruni, que me pareceu bem feliz). E conclui citando Dalai Lama quando confrontado com o povo chinês e deixa seu recado: “ Because, finally, it is the soul that must be preserved, if one is to remain a credible leader. All else might be lost; but when the soul dies, the connection to earth, to peoples, to animals, to Rivers, to mountain ranges, purple and majestic, also dies. And Your smile, with which we watch you do gracious battle with unjust characterizations, distortions and lies, is that expression of healthy self-worth, spirit and soul, that, kept happy and free and relaxed, can find an answering smile in all of us, lighting our way, and brightening the world”. ( Porque, no final, é a alma que deve ser preservada, se alguém quer se firmar como um líder, em quem possamos acreditar. Todo o resto pode se perder, mas quando a alma morre, a conexão com a terra, com as pessoas, com os animais, os rios, as cadeias de montanhas roxas e majestosas, também morre. E somente o seu sorriso, através do qual tivemos a observar sua graciosa batalha, com caracterizações injustas, distorcidas e mentiras, será aquela expressão saudável de merecimento, espírito e alma, que lhe manteve feliz, livre e relaxado, poderá encontrar uma resposta sorridente em todas nós, iluminar seu caminho e abrilhantar o mundo. (tradução livre)

Boa Sorte Dilma, que você consiga concretizar que Sim! A mulher pode! , e se puder lembrar também dessas palavras de uma sábia mulher/escritora, que entende também de jardins e sorrisos, vá em frente! Como também com o aval de todas as Santas e de todas as Doidas! Pois das duas todas temos um pouco.

(E hoje, dia de quem já se foi, Flores para los Muertos!
E na vida, Flores para Beta Jardelino, minha cunhada, que faz anos e anda comemorando desde domingo.)

Ana Adelaide Peixoto, João Pessoa, 1 de novembro de 2010


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