Ana Adelaide

Professora doutora pela UFPB.

Geral

Os Meus Meninos


20/01/2015

Foto: autor desconhecido.

 
Filhos… Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?

(Poema Enjoadinho – Vinicius de Morais)

Para Lucas e Daniel

Tenho dois filhos. Homens. Difícil foi escolher os nomes. Adoro nomes! O primeiro ia se chamar Fábio. Quando nasceu, não achei que parecia. Mudei para Lucas, que na época não era moda, e eu achava um nome muito sério, e hoje ele é a cara de Lucas. O segundo, oito anos depois, eu queria Bento, Tomáz ou Raoni. Mas o pai, que tinha Maio de 68 na cabeça e é proibido proibir, só concordou com Daniel (Cohn-bendit?!). Os dois ficaram sem nome algumas horas na maternidade. Esperando a identidade chegar….para o abraço primal. Eu que queria tanto Júlia, Aurora, Pilar, Miranda, Rosa, Nina, Dandara, Esperança ou Violeta….me vi rodeada de masculino por todos os lados. Hoje concordo com a natureza; Sou mãe de homens! E não me perguntem o por quê? Aliás eu sei…

Eles cresceram. E ao contrário das outras mães, eu ficava achando que já era a hora de saírem de casa. Até hoje ouço amigas a dizerem que gostam dos filhos em casa. Ou namorando, pois se aquietam. Penso o contrário. Gosto de vê-los sozinhos para descobrirem como e quem são. Namorar é preciso. Conhecer-se , mais ainda. Acho que os 20 é a data boa para se pegar a estrada. Mas os meus são cangurus….e não saíram. Ainda. O pai dizia que a culpa era minha , que os enchia de mimo e proteção. E é verdade! Comidinha, roupinha, casaquinho! Tudo mico!! Quando eram pequenos, mas hoje, tudo afeto. Reconheço que essa geração está mais difícil de sair mesmo. Mercado de trabalho, padrão de exigências, acomodação, e a necessidade-zero de ter espaço todo seu.

E não ficaram em casa em vão. Com as despedidas antecipadas da vida, que maravilha ter os filhos agarrados a mim! Mas ano passado, Daniel foi voar para o mundo. E fiquei aqui no Bessa aprendendo mais a compartilhar o dia a dia com Lucas, que dorme com as galinhas e gosta de acordar cedo. É quieto, bom de garfo, e de observação. E não tem medo de barata! Soube ser presente, me ajudou/a nas horas frias de solidão, se dispunha a resolver as pendências domésticas, e ficava ali, em silêncio (como seu costume) – A tua presença! Ele próprio também aproveitava das delícias de estar na sua casa e no seu conforto, mesmo que a ausência fosse presença. Paradoxos da natureza de cada um. E teve de aguentar os medos da mãe. Não lido bem com esportes radicais. Só na tela da TV….e ele gosta de se aventurar nas trilhas espinhosas das motos intempestivas.

Por esses dias chegou Daniel, de volta lá da Espanha e da Inglaterra. Uma festa! Muitas saudades, mas sou daquelas que quero mais é que eles se mandem e sejam felizes. E Daniel foi. E desbravou a mochila. As incertezas. O frio. O escurecer às 3 da tarde em terras Britânicas. O horário certeiro dos transportes. Festivais de música aos montes. Berlin e o último dia do ano. Amsterdam e suas bikes. O frio cortante de 14 graus negativos de Praga. Cozinhar frango assado com spaghetti tododiatodo….saudades do sofá de casa, do feijão doméstico. Deliciou-se com Alhambra, com sangria, com as várias nações e a dança Flamenga, e claro London London, onde repetia as calçadas da mãe. E eu daqui dizia: já foi comer no Borough Market?? Uma dose de gin nos pubs? E ele já tinha se empanturrado de Jamon Serrado ou Chilli com Carne. E last but not least…as guloseimas da Tia Teca que, em Cardiff lhe apresentou as belezas do countryside e dos penhascos de Southerndown, a majestade de Oxford, o conforto de uma casa com Bay Windows, e uma Pavlov de respeito.

O que mais lhe atraiu nessa experiência? Não se lembrar de automóvel! De ter transporte público para tudo a toda hora; e a música e todos os seus ídolos nos festivais de música eletrônica que foi: Bélgica, Manchester, e os lugares bárbaros e sonoros na Europa , França e Bahia. Tudo barato ao estudante! Tudo accessível! Tudo gigante e enlouquecedor. Músicas na floresta, na cidade, nos armazéns re-vitalizados de Leeds, nos parques, ou alhures. Aqui tudo é tão precário e tão exorbitantemente caro! Reclama.

Ai perguntei das meninas. O que mais lhe chamou à atenção. Eu, toda interessada já nos detalhes, nos amores, coisa de mãe! Daniel foi capaz de observar o mesmo, o que eu um dia, já havia me encantado. A liberdade das mulheres. O poder das meninas. O namoro que não é a prioridade delas. O des-compromisso do amor, que é sim importante quando se tem 20 anos de idade. Moram juntos os casais nas republicas, mas como sabem fazer a diferença entre amor e liberdade! Amizade e sexo. Estudo e vagabundagem! Nós aqui, quando namoramos ainda meninas, no segundo dia já tem almoço para conhecer a família, e assim se estabelece uma teia tão sorrateira e ardilosa para ambos os sexos. Fica difícil conciliar liberdade sexual com identidade e privacidade no cotidiano. Ele adorou de ver as meninas amigas, prima, curtindo tudo, namorando nas horas, indo e vindo, e o namoro lá, no seu devido lugar. E nada de tolhimento, de seriedade, de intromissão de família. É hora de largar da barra da saia de casa, de ganhar os mundos, e se preparar para à vida. Achei interessante nossas conversas, que décadas depois de mim, convergiam em opiniões e sentimentos parecidos.

Lucas, o que ficou, atento a sua nova fase de trabalho e de amor, segue outros horários. Dorme cedo, trilha cedo, e fez uma fonte no nosso jardim. São outros caminhos. No seu gosto pelo íntimo, pelo seu lugar no mundo, também faz descobertas todo dia. E eu, como mãe de meninos, só aprendo desses homens e a eles lhes tenho um olhar cúmplice; eu que tanto sei das mulheres, que amo tanto o feminino, e que sempre fui tão dura com os homens, hoje, nos meus filhos descubro suas fragilidades, seus limites e suas capacidades igualmente amorosas de deixarem a vida se levar. Viu Juca?

Bem vindo ao mundo dos homens e dos meus meninos!

Que bom tê-los em casa! Só não sei até quando….

Ana Adelaide Peixoto – João Pessoa, 19 de janeiro, 2015


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