Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

Os ” assustados”


26/05/2015

Foto: autor desconhecido.

 

Vejo minha filha Vanessa e minha enteada Nicole, de vez em quando pedindo autorização para irem a festinhas realizadas nas casas de amigas ou colegas de colégio. Elas chamam essas reuniões de “social”, nós da década de sessenta chamávamos de “assustados”.

No bairro de Jaguaribe, onde morávamos, tomávamos conhecimento de onde seria realizado o “assustado” do fim de semana na missa noturna do sábado, na Igreja do Rosário. Era o “point” da juventude daquele bairro, onde a “turma” se encontrava e começava a paquerar.

Essas reuniões dançantes ganharam o nome de “assustados” porque, na maioria das vezes, o dono da casa só tomava conhecimento de que seria o anfitrião quase na hora do evento. Não se exigia o ‘come-se e bebe-se’. Isso era providenciado pelos organizadores. Bastava que fosse liberado um toca discos ou uma radiola, para animar a brincadeira e a sua garagem ou terraço.

A bebida consumida era batida artesanal, um coquetel apelidado de “leite de onça” e o “cuba libre” (rum com coca cola). Como não existia esse clima de violência atual, essas festinhas eram tranquilas, dificilmente acontecia alguma briga. E quando ocorria era por conta de ciúmes entre namorados, não por causa do uso de drogas ou coisa semelhante. Havia um clima de familiaridade que deixava despreocupado o casal que permitia fazer da sua residência o ambiente dessas animadas noites dançantes.

Também não iam até a madrugada. No máximo se encerravam a meia noite. Duravam, portanto, em média, três horas de animação. Os que não gostavam de dançar aproveitavam para iniciarem uma paquera com alguma garota, que tivesse despertado o seu interesse. Lógico que ficava muito mais fácil começar um namoro na oportunidade em que dançavam. As músicas românticas ensejavam dançar de rostos colados, mas sempre sob a vigilância presente dos adultos, pais das meninas que frequentavam os “assustados”. Mas o “iê iê iê”, gênero musical da jovem guarda, já estimulava também entrar no ritmo dançando sozinho, não necessariamente formando um par.

Ao contrário do que acontece hoje, era muito comum que os pais acompanhassem seus filhos, ou principalmente suas filhas, nessas noitadas dançantes. Era assim a vida social suburbana de Jaguaribe nas décadas de sessenta e setenta. Mas posso garantir que éramos muito felizes nessa vivência.

• Integra a série de textos “INVENTÁRIO DO TEMPO II”.

 


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