Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Sociedade

“Onde está a honestidade?”


02/10/2023

 

 

Noel Rosa ainda não tinha 23 anos de idade quando compôs “Onde está a honestidade?”, em 1933. Perto de completar os seus cem anos de existência este samba permanece com sua letra de uma atualidade impressionante, quando fala dos enriquecimentos de origens duvidosas, de pessoas que ganharam muito dinheiro na base da corrupção. Numa ironia de muita inteligência, ele satiriza o conceito de honestidade que muitos procuram passar para a sociedade.

“Você tem palacete reluzente/Tem joias e criados à vontade/Sem ter nenhuma herança ou patente/Só anda de automóvel na cidade”. Era o cenário da época, onde os novos ricos ostentavam suas fortunas e excentricidades patrimoniais. Nada diferente do que se observa hoje. O que ainda vemos são servidores públicos, políticos, empresários, assumirem repentinamente um padrão de riqueza difícil de ser justificado. E de vez em quando escândalos estourando, novos ricos sendo denunciados na prática de corrupção e desonestidade, milionários se complicando para explicar seus ganhos fabulosos em tão pouco tempo.

“E o povo já pergunta com maldade:/Onde está a honestidade?/Onde está a honestidade?”. Mas o povo tem uma capacidade aguçada de perceber as coisas. Compreende que tudo é fruto da ilicitude na condução dos negócios ou locupletação com o dinheiro público. Vendo tudo isso, surge a interrogação popular que não pode ficar calada: onde está a honestidade tão apregoada por essas pessoas? Onde estão os princípios de moralidade e decência, que devem presidir o comportamento dos cidadãos? Cadê a dignidade, a honradez e a probidade, que muitos proclamam possuír?

“O seu dinheiro nasce de repente/E embora não se saiba se é verdade/Você acha nas ruas diariamente/Anéis, dinheiro e felicidade”. Noel continua fazendo a cobrança da proveniência dessa riqueza tão ostensivamente exibida. E com sarcasmo pergunta se todo esse luxo resulta de “anéis, dinheiro e joias achados na rua”. O dinheiro ganho com muita facilidade traz no mínimo um indício de suspeição de que algo estranho esteja acontecendo.

“Vassoura dos salões da sociedade/Que varre o que encontrar em sua frente/Promove festivais de caridade/Em nome de qualquer defunto ausente…”. A desfaçatez com que esses frequentadores da alta sociedade se mascaram de beneficentes, caridosos, preocupados com a sorte dos desamparados, é de causar nojo. Fazem da filantropia um meio também de aumentar suas riquezas, promovendo eventos que parecem humanitários, mas na verdade são formas de disfarçar as falcatruas, os delitos cometidos. Tudo em favor próprio, nunca dos que divulgam serem os beneficiários.


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