Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

“O xote das meninas”


03/12/2013

Foto: autor desconhecido.

Luiz Gonzaga em parceria com Zé Dantas lançou, em 1953, a música que se tornou um dos maiores sucessos do seu repertório: “O xote das meninas”, onde fala da transição feminina, na fase entre a infância e a adolescência. As transformações de corpo e da forma de agir e pensar da garota ao se sentir mulher.

“Mandacaru quando fulora na seca/É o sinal que a chuva chega no sertão”. O mandacaru é uma planta que resiste às intempéries da seca e sobrevive mesmo com a falta de água. Mas, segundo a sabedoria do sertanejo nordestino quando ele “fulora”, dá flores, indica que pode chover. Isso quer dizer que é sinal de que a terra vai ficar fértil, em condições de produzir, para alegria do homem do campo.

“Toda a menina que enjoa da boneca/É sinal que o amor/ Já chegou no coração”. De igual modo, a mulher sente a sinalização de que se tornou fértil quando seu corpo recebe as mudanças que a faz compreender que deixou de ser criança. Perde o encanto pelos brinquedos infantis, “a boneca”, e passa a sentir a força da sensualidade, entregando-se aos delírios do romantismo. É quando o amor começa a dominar seu coração.

“Meia comprida/ Não quer mais sapato baixo/Vestido bem cintado/Não quer mais vestir timão…”. As mutações no corpo exigem também mudanças no vestuário. As roupas tornam-se necessárias que se adeqúem às novas silhuetas do seu aspecto físico. O salto alto torna-se símbolo de uso da jovem mulher que quer se exibir com chame, elegância e graça. A vaidade é atributo indispensável para quem se inicia na experiência do namoro, da paquera, da conquista amorosa.

“Ela só quer/Só pensa em namorar”. A vida passa a ser de sonhos, fantasias, escolha do “príncipe encantado”. Os desejos manifestam-se naturalmente e isso induz à vontade de namorar. As paixões acontecem em decorrência desse sentimento ansioso de compartilhar emoções no encontro amoroso de um casal. O pensamento volta-se prioritariamente para viver a magia irresistível da capacidade de sedução.

“De manhã cedo já tá pintada/Só vive suspirando/Sonhando acordada”. A maquiagem como artifício para se tornar mais atraente. Os devaneios da juventude provocando suspiros cheios de paixão. É como se estivesse vivendo num mundo fora do real, todo ele baseado na intensa ansiedade de ser feliz no amor.

“O pai leva ao dotô/A filha adoentada/Não come, nem estuda/ Não dorme, não quer nada”. Entregue por completo à imaginação da descoberta do amor, não se motiva a fazer outra coisa, a não ser pensar no romance que está vivendo, ou tentando viver. Surpreso e apreensivo com a mudança de comportamento da filha, que já não é mais criança, o pai a leva ao médico suspeitando que ela estaria acometida de alguma doença e precisando de tratamento.

“Mas o dotô nem examina/Chamando o pai do lado/Lhe diz logo em surdina/Que o mal é da idade/E que prá tal menina/Não tem um só remédio/Em toda medicina”. Experiente, o médico percebe logo a causa dessa alteração na forma de se portar da moça e alerta o pai de que não é motivo de preocupação porque é consequência da natureza humana feminina, “mal da idade”. A verdade é que os pais demoram a perceber que a filha já não é mais criança e resistem, por algum tempo, a aceitá-la como mulher, pronta para viver os prazeres do amor.

• Integra a série de crônicas ”PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.

 


O Portal WSCOM não se responsabiliza pelo conteúdo opinativo publicado pelos seus colunistas e blogueiros.
Os comentários a seguir são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião deste site.