Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Política

O “Fico” de Zé Américo


15/08/2020

Publicado no jornal A UNIÃO, edição de hoje

A notícia caiu com efeito de uma bomba no Estado. No dia cinco de maio de 1978 o Ministro José Américo de Almeida, em entrevista concedida a um jornal do sul do país, manifestava seu desejo de deixar a Paraíba, anunciando que estaria no propósito de vender sua mansão na praia do Cabo Branco e fixar residência em Petrópolis, no Rio de Janeiro. A decisão teria sido tomada em razão de algumas declarações de aliados políticos de Milton Cabral e Antônio Mariz, preteridos na escolha para o governo estadual. Acusavam o Ministro de ter trabalhado em favor da indicação de Tarcisio Burity, queimando os dois outros nomes.

Assim se expressou José Américo ao declarar sua mágoa com a acusação que lhe faziam: “Nessa altura da vida, preciso, acima de tudo, de paz de espírito. Por isto abandonei a política que é, por seu estilo, trepidante. O pior dos desgostos emocionais é a indignação. E nada nos fere mais que a injustiça. Tenho feito tudo para alhear-me da vida partidária, que não tem nada a oferecer-me, por que não aceito. Esperava levar aqui uma vida tranquila, lendo e escrevendo. Infelizmente, porém, por mais que vivesse retirado da política, sem nenhuma ambição, lançam-me a culpa de atos que sou incapaz de praticar. Na idade extrema em que estou, preciso resguardar-me de emoções e a pior delas é a indignação”.

Como era de se esperar, a proclamação de desgosto feita por ele publicamente, causou preocupação em todos os paraibanos que o consideravam uma referência política e intelectual do nosso povo. Foram imediatas as reações no sentido de dissuadi-lo dessa intenção. Parlamentares de todos os partidos formularam apelos para que o Ministro reconsiderasse a decisão tomada, num impulso emocional de desencanto com a política praticada em nossa terra.

Na Assembleia Legislativa, seu presidente, deputado Nominando Diniz, liderou movimento nesse sentido, afirmando: “José Américo, que é nosso orgulho, não pode deixar a terra que o viu nascer e que a serviu com amor e devotamento. O meu apelo traduz os anseios de toda a Paraíba”. O deputado Manoel Gaudêncio, um dos mais destacados aliados de Antônio Mariz, declarou: “Em consequência de um mal entendido, não se pode pensar em José Américo deixando a Paraíba”. Seguiram-se manifestações de apoio ao pedido para que o Ministro desistisse dessa ideia de abandonar nosso Estado por vários parlamentares, entre os quais, Antônio Montenegro, Soares Madruga, Francisco Soares, Frei Marcelino, Rui Gouveia e Edme Tavares.

O presidente da Academia Paraibana de Letras, Aurélio de Albuquerque, organizou uma comitiva de acadêmicos que se direcionou à residência de José Américo, na tentativa de demovê-lo dessa vontade. O grupo era formado pelo Ministro João Lyra Filho, desembargador Mário Moacir Porto, escritor Juarez da Gama Batista, poeta Celso Novaes, professor Afonso Pereira, Lauro Xavier e Eugênio de Carvalho. Ao final do encontro o presidente teria perguntado: “Ministro, o senhor não pode dar uma declaração assim como o “Fico”? Ao que ele respondeu: “Fico não, ficaram-me”.

Enfim parecia que José Américo havia se sensibilizado com o apelo dos paraibanos e decidira permanecer morando no Cabo Branco, no local onde hoje funciona a Fundação que leva seu nome. E foi o que efetivamente aconteceu.

Rui Leitão


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