Rui Leitão

Jornalista e escritor.

Geral

O desmantelamento de um aparelho comunista


06/07/2015

Foto: autor desconhecido.

 

A repressão da ditadura levou a militância de esquerda mais radical à clandestinidade. Em nome da causa essas pessoas, em sua maioria estudantes, pertencentes a grupos organizados de atuação política contra o governo, chegaram a cometer ações criminosas por motivações políticas. Partiram para assaltos a bancos e sequestro de autoridades.

O serviço de inteligência das Forças Armadas vivia a todo tempo procurando desbaratar essas organizações, que eles chamavam de “aparelhos comunistas”. O grupo mais atuante pertencia ao PCBR – Partido Comunista Brasileiro Revolucionário, uma dissidência do PCB.

Na segunda quinzena de novembro de 1969, os jornais da Capital publicaram fotos de dezenove militantes, que faziam parte de um desses “aparelhos”, que a polícia noticiava haver desmantelado. Fiquei surpreso ao ver entre os “subversivos” apontados pelo governo, um ex-colega do Liceu, Marcos Guilherme Miranda. Nunca imaginei que aquele companheiro de bancos escolares pudesse estar envolvido em tais movimentos. Era um rapaz calmo, tímido, mas muito inteligente. Não tive mais notícias dele. Suspeito de que faça parte da relação dos inúmeros brasileiros que foram assassinados nos porões da ditadura.

Figuravam ainda na lista outros nomes conhecidos da política estudantil: Rômulo Araújo, Eraldo Fernandes, Eduardo Ferreira, Eric Rosas, Emilson Ribeiro, Eduardo Jorge (filho do reitor da UFPB e militar do Exército, Guilhardo Martins, e que recentemente disputou o cargo de Presidente da República pelo PV). Tiveram suas prisões preventivas decretadas pela Auditoria da Sétima Região Militar. Alguns foram capturados e outros foragiram.

O “aparelho” desbaratado funcionava em Tambaú, na Avenida Olinda, 400. Lá foram encontrados, conforme relato militar, armamentos de uso exclusivo das Forças Armadas e vários equipamentos furtados. Pesava contra eles, além de várias ações criminosas, o assalto à Companhia de Cigarros Souza Cruz, no Centro Histórico, ocorrido em maio, no qual teriam roubado cerca de cinqüenta e seis milhões de cruzeiros.

Segundo o depoimento de Eraldo Fernandes, hoje médico, à Comissão da Verdade na Paraíba, eles não teriam sido os responsáveis por esse assalto e atribuiu essa execução aos camaradas de Pernambuco, ainda que tivesse admitido o planejamento de tal ação.

O fato, como era de se esperar, provocou grande repercussão, principalmente por envolver pessoas conhecidas da sociedade, embora não se revelasse algo que causasse espanto, porque se sabia da movimentação das organizações clandestinas no sentido de empreenderem resistência e oposição ao governo militar. Era então apenas mais um episódio do confronto “esquerdo x direita”, em que os ditadores procuravam anunciar com destaque e ao mesmo tempo objetivando dar a impressão de que estavam ganhando essa luta e criando mais medo aos que insistiam em combater o regime.

• Integra a série de textos “INVENTÁRIO DO TEMPO II”.


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