Anne Nunes

Jornalista e Gestora de Redes Sociais.

Política

Não são apenas números


17/03/2021

A Paraíba alcançou nesta terça-feira (16) uma das marcas mais tristes da sua história: mais de 5 mil mortes em decorrência da covid-19. São exatamente 5.036 óbitos desde o início da pandemia. Mas não são apenas números. São histórias, vivências, sonhos, planejamentos, afetos, saudades e tanta dor que não cabe em nenhum noticiário. São inúmeras realidades – tão distintas umas das outras – que números não são capazes de traduzir.

Há um ano, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a existência da pandemia, que se espalhava rapidamente por diversos países. Inicialmente achávamos que ela duraria o período da quarentena, e que logo retornaríamos às nossas rotinas familiares, trabalhistas e de lazer. Acho que nenhum de nós imaginou o quanto esse vírus mudaria para sempre as nossas vidas. O quanto ele impactaria nos nossos hábitos diários. Lembro que nem em nosso pior pesadelo previmos um recorde cotidiano de óbitos.

Acordamos, ligamos o jornal, e encontramos morte. No almoço, um pouco mais de morte. No jantar, acompanhamos incrédulos os números crescentes e avassaladores de mortes. Não há distinção de idade, sexo, cor ou posição social. Isso pouco importa. Do mais rico ao mais pobre, falta ar. Falta vaga. Falta vacina. Mas sobra empenho das equipes médicas que estão incansavelmente trabalhando há mais de 12 meses. Sobra união dos familiares e amigos que se apegam à fé nesse momento onde tudo parece desabar. Sobra saudade – muita saudade – de todos aqueles que enterram parte da sua história, sem a chance de uma despedida. E a cada dia, o coronavírus leva um dos nossos. Leva um amigo, um familiar, um conhecido, um professor, um vizinho, um famoso, um anônimo, um desconhecido. A covid não nos diferencia.

Mas tem uma coisa que também falta, e que, aliás, está faltando há muito tempo. E essa palavrinha tão simples, mas tão difícil de ser encontrada e exercitada, se chama compaixão. É exatamente isso que falta aos governantes. Não todos, obviamente, mas me refiro diretamente ao nosso presidente, que desde sempre negou a gravidade da pandemia e desacreditou da ciência e da medicina. Escolheu adotar, diferente de todo o resto do mundo, protocolos farmacêuticos curativos e não comprovados como a sua arma contra a covid. E o resultado da sua ineficiência e incapacidade está cada dia mais evidente.

Mas infelizmente, Bolsonaro reverbera o que muita gente acredita. Prova disso foram as manifestações deste último domingo (14), que reuniu números expressivos de seguidores e apoiadores do governo. E havia de tudo. Intervenção militar, fechamento do Supremo e do Congresso, fora Lula e PT, amor pela cloroquina, mas, sobretudo, um grito contra as medidas restritivas adotadas por prefeitos e governadores de todo o Brasil, na tentativa de frear o avanço da pandemia do coronavírus nas últimas semanas. E claramente, mais uma vez, a insanidade estava disfarçada de patriotismo. Cenas angustiantes de uma parcela da população que, certamente, vive uma realidade paralela. Uma parcela que não enxerga milhares de vidas ceifadas todos os dias, o colapso nos hospitais tão avisado pelas autoridades, a falta de vacinas e também de humanidade. Estão envoltos do seu próprio egocentrismo e individualismo.

Não tem sido fácil acordar todos os dias e tentar vislumbrar uma perspectiva positiva. Mas o que realmente espero e desejo é que esse momento tão triste da nossa história, da nossa Paraíba e da nossa gente, nos traga, em um futuro imediato, mais dignidade, amor e respeito à vida. Nós não precisamos combater a ciência. Nós precisamos combater o vírus. Nós precisamos tocar a vida com responsabilidade e empatia, e não tocar o país para o buraco. Não são apenas números. São lutas, rostos, olhares, sorrisos e lembranças que se vão. Os próximos dias nublados ficarão na história do nosso estado ensolarado. Estamos todos enlutados.


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