Geral
“Infinito particular”
21/01/2014
Foto: autor desconhecido.
Para compreender uma música não basta apenas ouvi-la, tem que escutá-la com atenção, perceber suas mensagens, muitas delas subliminares, noutras tão explícitas que na melodia entendemos como algo que se diz comumente e por isso não damos a importância devida. As letras das canções de Marisa Monte são assim, bem construídas. Em “Infinito particular”, lançada em 2006, ela proclama a autoafirmação da mulher que se declara ao homem que deseja, e o convida a aceitá-la como verdadeiramente é, de forma transparente, com suas características próprias.
“Eis o melhor e o pior de mim/O meu termômetro, o meu quilate/Vem, cara, me retrate/Não é impossível”. O “eu lírico”, na voz feminina mostra-se autêntico, apresentando virtudes e defeitos. O “termômetro” é a forma de se exprimir emocionalmente, seus impulsos de ataque e de defesa. O “quilate” é o peso do seu valor como pessoa e como mulher. E parte para o desafio, “vem, cara, me retrate”, chamando o pretenso companheiro à conhecê-la por inteira, em todos os detalhes, “retratar”. E diz que isso não é tarefa difícil de ser executada.
“Eu não sou difícil de ler/Faça sua parte/Eu sou daqui, eu não sou de Marte/Vem, cara, me repara”. Sua espontaneidade facilita a leitura do seu ser. Depende só dele desvendá-la, determinar-se a descobrir sua individualidade. Afinal de contas não é um extraterrestre, alguém que fuja dos padrões normais da humanidade. E volta a desafiar: “vem, cara, me repara”, provocando-o a percebê-la, enxergá-la melhor.
“Não vê, tá na cara/Sou porta-bandeira de mim/Só não se perca ao entrar/No meu infinito particular”. O “eu lírico” se mantém provocadora, ostentando sua maneira particular de ser, “porta bandeira de si mesma”, como se quisesse dizer que dispensava apresentação, ela é exatamente o que ele vê, inteiramente exposta. No entanto, adverte que ao encontrá-la, efetivamente, e conhecê-la na sua essência plena saiba como conviver com essa conquista. O íntimo de cada indivíduo é um “infinito particular” e penetrar nele exige entrega completa e duradoura.
“Em alguns instantes,/Sou pequenina e também gigante/Vem, cara, se declara/O mundo é portátil/Pra quem não tem nada a esconder”. Por temperamento ela se diz ora pequenina, ora gigante, conforme as circunstâncias. Insiste no desafio para que ele enfim se declare, se decida. O mundo ao nosso redor se adapta facilmente à realidade, “é portátil”, desde que ela seja deslindada.
“Olha minha cara/É só mistério, não tem segredo/Vem cá, não tenha medo”. Repete o convite à examiná-la, “olha minha cara”, para que saiba que em si existem vários mistérios, informações ocultas, mas que nada impede que possam ser revelados, não precisa ter medo.
“A água é potável/Daqui você pode beber/Só não se perca ao entrar/No meu infinito particular”. A água que ela oferece é gostosa de beber, basta que seja capaz de apreciá-la, consciente do que vai encontrar na sua singularidade, sem risco de se perder.
• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”.
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