Alberto Arcela

Publicitário e jornalista

Cultura

Hora de bater panela – Por Alberto Arcela


03/12/2023

A caminho da padaria Eldorado de Manaíra, onde tomo diariamente o café da manhã com um grupo de amigos, fui surpreendido um dia desses com a ligação de um amigo que há muito não via e com o convite para uma rápida reunião de negócios.

Em pauta, uma oportunidade única de tocar um projeto capaz de sensibilizar até o mais duro dos mortais, ao misturar a arte da vida com a sombra da morte. Um prato cheio para quem flerta, como eu, com o sobrenatural e que acabou de escrever um conto de amor cujo cenário é o cemitério Senhor da Boa Sentença onde estão enterrados meus pais e meu irmão.

Pois bem, através desse amigo fiquei sabendo da existência de um grupo em João Pessoa que luta para construir uma casa para abrigar pessoas terminais, e cujas famílias não querem ou não podem cuidar deles a contento.
O tipo da coisa, que em meio a desfalques em hospitais e outros descalabros, soa como música aos meus ouvidos, e me faz acreditar nas pessoas anônimas que só prestam contas a Deus. E é aí onde entra também a arte, porque nesse grupo de espíritos de luz, pontifica o talento de um velho amigo que o tempo separou, mas de quem guardo ótimas recordações. O poeta popular e repentista Oliveira de Panelas, o último trovador de sua geração.

Em linhas gerais, a proposta do grupo é que, a exemplo do eu fiz com meu amigo e irmão Gonzaga Rodrigues, escreva, produza e dirija um documentário com o menestrel do Cristo, destinando parte da verba para essa casa dos espíritos, idealizada para assistir quem não tem onde cair morto. Com certeza, assunto para o vídeo é o que não vai faltar. Para início de conversa, Oliveira Francisco de Melo é também um compositor de mão cheia e autor de pérolas do nosso cancioneiro, a exemplo de Amor Cósmico e da clássica Esses Discos Voadores me Preocupam Demais gravada por Zé Ramalho e pela amiga, por um tempo,Teca Calazans, da dupla Teca e Ricardo.

Por outro lado, esse projeto audiovisual daria continuidade ao Velho e o Rio, idealizado para homenagear em vida artistas e pensadores, plenos em sua lucidez, e relevantes para o momento em que vivemos. E tem também a questão do cobertor dado por Deus para cada frio, como dizem os versos de Adoniran na memorável Saudosa Maloca, uma canção que fala do abandono na sua maior essência.

Até mesmo porque o foco é a construção da casa dos espíritos nos momentos finais da sua jornada na terra. A casa que vai acolher pessoas de todos os sexos, de todas as cores e de todos os gêneros. E onde todos possam, quando chegar a hora, morrer em paz.

Pensei nisso ao sair da padaria e confesso que senti uma paz intensa e um profundo respeito pela solidariedade, também um sentimento cósmico como o amor de Oliveira. Quase como se você tivesse de pagar com ela o dom da vida. E quanto ao filme em si, com certeza vai ficar no ponto. Temperado com admiração e servido para quem quiser sentar à mesa com muito amor para dar. Até mesmo porque nunca deixei de me preocupar com os discos voadores, e também porque sei que panela velha é que faz comida boa.

Vamos à luta.


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