Geral
“Grito de alerta”
24/05/2014
Foto: autor desconhecido.
Uma confidência de Agnaldo Timóteo deu inspiração a Gonzaguinha para compor “Grito de alerta”, gravada na voz de Maria Bethânia, em 1979. O “eu lírico” canta as dores de um amor conturbado, cheio de brigas e desencontros, vivido por Agnaldo.
“Primeiro você me azucrina, me entorta a cabeça/Me bota na boca um gosto amargo de fel”. O personagem que canta a música fala que a pessoa com quem vive uma história de amor, gosta de provocar desavenças, discussões, desentendimentos. São ocorrências que machucam, fazem a cabeça ficar desnorteada, dando um gosto amargo no relacionamento. O que deveria ser um momento de alegria torna-se um instante de infelicidade, de sofrimento.
“Depois vem chorando desculpas, assim meio pedindo/Querendo ganhar um bocado de mel”. Sempre que acontecem esses estúpidos embates de discórdia, vem logo depois implorando perdão, suplicando o retorno à paz. Esquece que palavras e gestos deixam marcas e mágoas. Não vê o quanto fica difícil retribuir as desatenções com carinho, demonstrações de afeto. O mel desejado perde a doçura.
“Não vê que então eu me rasgo/Engasgo, engulo, reflito, estendo a mão/E assim nossa vida é um rio secando/As pedras cortando, e eu vou perguntando: até quando?”. Embora amargurado, triste, decepcionado, ele diz que consegue superar as contrariedades em nome do amor. E sempre permite a reconciliação. No entanto, esse enredo é como um rio secando, aos poucos vai perdendo a motivação, o sentimento vai minguando. E fica se questionando quanto tempo vai suportar tudo isso.
“São tantas coisinhas miúdas, roendo, comendo/Arrasando aos poucos com o nosso ideal/São frases perdidas no mundo de gritos e gestos/Num jogo de culpa que faz tanto mal”. Os pequenos detalhes dessas discrepâncias, que se repetem a cada dia, vão destruindo os sonhos, as fantasias. No cotidiano tornam-se frequentes os xingamentos, as atitudes que desagradam reciprocamente, ambos jogando a culpa no outro por tudo o que acontece de ruim. Lógico que são situações que não fazem bem a nenhum dos dois.
“Não quero a razão, pois eu sei/O quanto estou errada, o quanto já fiz destruir/Só sinto no ar o momento em que o copo está cheio/E que já não dá mais pra engolir”. Rejeita afirmar-se como quem esteja com a razão nos conflitos, até porque sabe que também deu causa a aborrecimentos que concorrem para destruir esse sentimento. Sente que o envolvimento amoroso está por um fio. Não dá mais para aceitar determinadas circunstâncias que vêm dilacerando seu coração.
“Veja bem, nosso caso é uma porta entreaberta/Eu busquei a palavra mais certa/Vê se entende o meu grito de alerta”. Procura chamar a atenção para o risco iminente de ruptura do relacionamento. Tenta fazer compreender que seu canto é um grito de alerta. Afinal de contas às portas não estão fechadas, ficaram entreabertas, permitindo entendimentos, retorno à convivência de harmonia.
“Veja bem, é o amor agitando o meu coração/Há um lado carente dizendo que sim/E essa vida da gente gritando que não”. O amor coloca o “eu lírico” no dilema de saber qual a melhor decisão. Por um lado a carência rogando a entrega aos prazeres que a sua companhia proporciona. Em contraposição, o racional, resultante das experiências de brigas repetidas, sugere o afastamento em definitivo.
• Integra a série de crônicas “PENSANDO ATRAVÉS DA MÚSICA”
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